A Guerra dos Tronos: a reviravolta de uma série que começou quase como um filme porno

Mulheres nuas, cavalos e anões. Faltavam apenas as cabeças a rolar com uma frequência estonteante para que a frase tantas vezes usada para descrever o imaginário da pornografia feita para homens descrevesse na perfeição primeira temporada da série ‘A Guerra dos Tronos’. E por isso, dificilmente (nunca na vida!), suporíamos que a série que mostra Theon Greyjoy como um tarado no seio dos insuspeitos Stark – ele adora sexo, adora prostitutas (enfim, gosta delas porque as pode tratar mal) e faz imensa publicidade ao tamanho do pénis – chegaria à temporada sete como um hino à liderança feminina.

Não, não vamos dizer que ‘A Guerra dos Tronos’ agora é uma série feminista (muito menos nos dias que correm) mas quantas cenas de violação vimos nesta série, quantos seios descobertos, quantas mulheres submissas? Zero. Ok, vimos Gilly, mulher de Sam a ser chata e a ir sempre com ele sem se opor a nada, mas quantas mulheres decidiram tornar-se donas do seu reino? Vamos contar:

  1. Cersei, Rainha dos Sete Reinos matou toda a gente que lhe fazia frente em King’s Landing na temporada 6 e governa com mão de ferro

  2. Daenerys, que lidera a revolução de todos os povos do sul desde a temporada 5;

  3. Yara Greyjoy, rainha deposta das Iron Islands é a capitã dos insurrectos e, embora esteja até ao episódio 7 desta temporada como refém do próprio tio, ninguém acredita que o seu caminho fique por aqui

  4. A avozinha Olenna Tyrell é a última da sua casa, morre no episódio 6 não sem antes pregar mais uma estaca no coração de Cersei ao confessar que foi a própria Ollena a envenenar Jeoffrey, o filho da rainha

  5. Ellaria Sand matou todos os legítimos herdeiros casa Martel e assume a sua liderança, torna-se a aliada da Mãe dos Dragões e está presa nas catacumbas de Cersei a assistir à morte lenta da própria filha, mas será que ela vai mesmos morrer?

  6. Sansa Stark, ainda há quem acredite na sua inocência? Também desde o lado dos Lobos, Jon Snow parece estar em mais lençóis, com cada vez mais senhores a querem a irmã mais velha a liderar

Quanto às vidas pessoais, a sétima temporada de ‘A Guerra dos Tronos’ está cheia de exemplos de personagens femininas que tomam o seu destino nas mãos. Sem ser Gilly que se perde em leituras de diários escatológicos (onde está a selvagem que fez frente ao pai tirano de Sam à sua mesa?), vemos Missandei que, depois de ter uma meritosa carreira chegando a conselheira da Khaleisi, decide (finalmente!!!) concretizar os seus desejos sexuais com o seu amor de há várias temporadas, Grey Worm – que por sinal andava há demasiados episódios a avisar toda a gente que era castrado. Ainda bem que puderam chegar juntos à conclusão que mesmo assim, sem órgãos sexuais externos, se consegue fazer uma mulher feliz. Um ponto para a diminuição dos preconceitos sexuais!

Missandei, tão querida, a contar a Daenerys que passou a noite com o líder dos Imaculados.

E, claro, Cersei que numa reviravolta inesperada, quando parece desprezar Jamie em troca de uma aliança com Euron Greyjoy e a sua armada, leva-o para o quarto e deixa-se ver pela criada, afirmando que não tem nada a esconder. Não vamos fazer aqui juízos de valor sobre o incesto, até porque a coerência interna desta ficção permite que a situação não seja assim tão imoral (foi referido várias vezes que os antigos reis casavam irmãos entre si e já toda a gente percebeu que Snow e Daenerys estão prestes a fazer o mesmo, certo?). Também não vamos sequer falar da possibilidade da rainha má só se reconciliar sexualmente com o irmão para poder controlar o exército. O que interessa, neste ponto, é que Cersei dormiu com quem quis e assumiu-o, livremente.

Zero papéis tradicionais de género na temporada 7

Que papel resta aos homens nesta temporada, deixar-se dominar? Nem por isso. É curioso constatar que à medida que estas mulheres dão um passo em frente para a guerra ou para uma intervenção corajosa na trama, muitos homens ganham mais densidade psicológica. Lembra-se do Jamie Lannister da primeira temporada? Era retratado com um príncipe frívolo, cruel, traidor e imoral. E agora que retrato temos dele? Um homem fiel, com provas dadas de honra e bondade (foi ele, por exemplo, que decidiu que Olenna Tyrel morreria sem dor).

Como é que fica Snow ao lado da Khaleisi? Forte, na mesma, frontal, na mesma, e honesto como sempre. Ao reconhecer a superioridade da Daenerys (ok, também se apaixonou por ela) decide dobrar o joelho mal possa, tornar-se seu aliado, seu vassalo, perante aquela que o salvou com um dragão e que tem o melhor exército do mundo dos vivos.

Há ainda uma personagem masculina, Tormund, que faz as nossas delícias, não tanto por ter muitas camadas de sentimentos mas, porque adora uma mulher inesperada: Brienne de Thar. Só no sexto episódio desta temporada (e ela aparece desde a 2ª) é que esta mulher conseguiu não responder “I’m no Lady!” e aceitar o “My Lady” como um elogio, é uma mulher que confunde a identidade de género típica – é a única Cavaleira mulher, é muito forte, bruta e nada delicada.

São estas características que fazem com que Tormund, um homem livre que vivia até há pouco a norte da muralha, diga no episódio 6º: “Tenho uma beldade à minha espera em Winterfell, se eu conseguir voltar. Cabelo amarelo, olhos azuis, é a mulher mais alta que alguma vez vi.” E remata depois: “Quero voltar e fazer grandes monstrinhos com ela“. Ela nem sequer faz tenções de lhe dar troco, não se vê nesse papel.

Tormund apaixona-se por Brienne de Thar assim que a vê, porque ela é a mulher mais alta que já viu

Cenas dos próximos episódios

Quando forem 3 da manhã de segunda-feira, em Portugal continental, meio mundo vai estar agarrado ao ecrã para descobrir o que vai acontecer neste último episódio. Nos canais distribuídos por cabo neste país, só às 22h30 vai ser possível ver o que acontece no último episódio da penúltima temporada.

O que sabemos é que Cersei, com Jamie a seu lado, recebe Jon Snow e o seu séquito de apoiantes no castelo da família Bolton anteriormente usado para torturas em massa e não em Porto Real como seria de esperar. Imaginamos que Daenerys se junte a estes e que chegue de dragão para impressionar a rainha dos Sete Reinos. Sabemos que os exércitos farão demonstrações de força: os Imaculados e os Dothraki exibir-se-ão frente a Jamie Lannister. Sabemos que Sansa Stark está sozinha nas muralhas de Winterfeld e neva, neva muito.

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Além do trailler, pouco mais tem sido divulgado acerca deste último episódio, mas a série tratou de dar indícios. No episódio 6º, Snow chama Dany a Daenerys e esta pede-lhe que não o faça porque quem a chamava assim eram os irmãos com quem não tinha boa relação. Até agora tudo indicava que a Targaryen fosse tia de Snow (a mãe de Jon tinha sido aprisionada, segundo a versão do norte, e casada conforme Sam descobre nos anais dos meisters com Rhaegar Targaryen, o irmão mais velho da Mãe dos Dragões). Este Dany abre a possibilidade a que Lyanna Stark tenha não só fugido de Baretheon pelo filho como pelo rei Louco ou que tenha sido violada por ele?

Enquanto estão todos os reis e bispos deste xadrez político reunidos no tabuleiro em que se transforma o castelo dos Lannister, o que é que está Sansa a fazer sozinha em Winterfell? A segurar os senhores do norte à causa de Snow ou a chamá-los à sua? Esta dúvida persiste. Mas há outra possibilidade: ser ela a heroína deste episódio e, portanto, da série que se segue, ao segurar a linha de defesa contra os White Walkers depois da muralha cair nas mãos dos inimigos. Sansa já deu provas de ser uma excelente estratega militar ao chamar os Cavaleiros do Vale (e o escorregadio Mendinho) para vencerem o exército de Ramsay Bolton e nem sequer recolher os louros dessa vitória. Se for este o caso, provavelmente Arya Stark porá as divergências com a irmã de parte e será uma general do campo de batalha.

E, claro, tudo isto supondo que em Casterly Rock as coisas correm bem de feição aos vivos. O Reino dos Mortos vem a aí, the Winter is comming é uma profecia já realizada neste último episódio (repare-se como todas as personagens estão bem encasacadas para o encontro com Cersei numa latitude austral) e na próxima série veremos lutas entre dragões vivos, gigantes, anões, cavaleiros, homens livres, todos contra os zombies de olhos azuis.

Em todos os desfechos possíveis desta sétima temporada, é impossível acreditar que a ameaça exterior apazigue definitivamente as divisões nos sete reinos e nas famílias dos nobres, até porque isso tornaria esta série numa grande maçada. A gestão dos conflitos domésticos com a guerra exógena vai ser uma das questões mais interessantes de assistir na oitava série, mas isso só vamos saber lá para o fim de 2018, quando se prevê que a última temporada série de apenas 6 episódios vá para o ar. Mas uma coisa é certa, as mulheres vão ter, outra vez, um papel preponderante.