Comédia sobre Igualdade de Género sobe ao Teatro da Trindade

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Ensaio de imprensa da peça "Vanessa vai à Luta", de Luísa Costa Gomes [Fotografia: António Cotrim/Lusa]

Vanessa Vai à Luta, da autoria de Luísa Costa Gomes, é uma comédia sobre igualdade de género que quer pôr crianças e adultos a pensar e que estreia esta quinta-feira, 19 de janeiro, Teatro da Trindade, em Lisboa. A encenação é de António Pires e conta com a interpretação de Carolina Campela (Vanessa), João Veloso (Rodrigo), Cátia Nunes (Mãe), Hugo Mestre Amaro (Pai) e Julie Sergeant (Fada Marina).

A história trata de uma menina que queria como prenda de anos uma metralhadora, mas a mãe leva-a à loja a ver os brinquedos das meninas, como bonecas, espanadores, aspiradores ou vestidos cor-de-rosa, o que dá origem ao início da luta de Vanessa para ter aquilo que quer e, no processo, perceber porque é que as pessoas pensam assim e se tem mesmo de ser assim.

O texto original, escrito há 20 anos, “trata a questão de género no sentido mais clássico do termo, dos papéis e dos estatutos atribuídos às mulheres tradicionalmente, e é a história de uma menina que não quer esse papel e quer ter uma metralhadora como o irmão”, explicou Luísa Costa Gomes à Lusa.

Para a autora, há “toda uma pressão explícita e implícita para que isso não aconteça”.

Luísa Costa Gomes [Fotografia: Arquivo Global Imagens]
Luísa Costa Gomes [Fotografia: Arquivo Global Imagens]

A escritora reconhece que “as coisas mudaram muito”, mas confessa-se horrorizada por perceber que, nos dias de hoje, ainda há aspiradores, baldes e esfregonas à venda nos supermercados para se oferecer às raparigas como presente.


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“A realidade avançou num sentido incompreensível, mas a verdade é que há qualquer coisa na perpetuação desses papéis e desses modelos que é praticamente inelutável e é isso que torna a coisa tão interessante e tão enigmática ao mesmo tempo: as raparigas são muito espertas, no sentido em que percebem que há vantagem competitiva em serem bonitas, porque podem manipular melhor”, afirma.

É uma moral que se estabelece à volta de toda essa inferioridade, considera, lamentando que em “três quartos do mundo” as mulheres continuem a manter os papéis tradicionais.

Apesar da evolução que já se verificou em algumas sociedades e culturas, Luísa Costa Gomes deixa uma crítica que é também um alerta:

Observar, “cada vez mais e de uma forma um pouco horrífica, essa sociedade tradicional a ter uma voz política e a ter um peso e uma força de retrocesso muito pesada”.

A escolha deste texto pelo encenador António Pires prende-se com a forma como está escrito, mas principalmente também com o tema que trata.

“Eu li o texto da Luísa há muito tempo, há mais de dez anos e sempre tive vontade de fazer isto, para já por causa do texto, porque acho um texto muito bem escrito e com muito humor e até muito corrosivo – a forma como os personagens jogam e trocam os argumentos é muito divertido — e depois pelos temas, por causa da igualdade de género, por causa até das relações homem/mulher na infância e a maneira como nós, através dos brinquedos, influenciamos a forma como as pessoas depois vivem a sua vida e os seus relacionamentos”, contou à Lusa.


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Este espetáculo, que é uma coprodução com o Teatro do Bairro, é acompanhado por uma oficina a cargo da associação Welcome People & Arts, que vai trabalhar estes temas com as crianças de escolas com problemas sociais que vão ver a peça. É uma encenação “para pôr as pessoas a pensar”, explica António Pires

“Este texto toca muito nos adultos, mas também nas crianças, que percebem muito bem o que está ali a ser visto e levanta questões, não dá soluções nenhumas, faz uma função que o teatro deve ter, e essa função não se vê às vezes no teatro infantil, que é pôr as pessoas a pensar”, salienta o encenador.

Outra razão que levou António Pires a escolher este texto – como outros que tem levado a palco da mesma autora – é essa característica de Luísa Costa Gomes de ser “muito inteligente na forma como põe as personagens a falar, têm sempre muito humor e são muito cáusticos”.

“Como a escrita tem muita qualidade e é muito pensada, tem muitas camadas, e quando se começa a ler com calma, é quase como se fosse um jogo e o bom do teatro é isso”, considerou, sublinhando: “Na Luísa o que eu gosto mais é de ir descobrindo o que lá está, porque nunca é o que parece”.

A peça vai estar em cena de 19 a 22 de janeiro, de quinta-feira a domingo, e de 11 de fevereiro a 1 de abril aos sábados. Sempre no Teatro da Trindade.