Homossexualidade e violência doméstica? Sim, conheça as diferenças

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[Fotografia: Shutterstock]

Jovens e pessoas transsexuais são, de acordo com alguns dados indicativos, as populações LGBT –Lésbicas, Gays,. Bissexuais, Travestis e Transexuais – que parecem demonstrar maior vulnerabilidade em matéria de violência doméstica. Isto numa realidade que tende a ser tão transversal e semelhante à da violência registada em casais heterossexuais.

Fala-se, assim, de estimativas. Os dados concretos praticamente não existem e assim será, pelo menos enquanto as queixas apresentadas não vierem especificadas consoante a natureza da relação. Um pedido que ganha força no manual agora apresentado. Mas já lá vamos.


Confira os dados da violência doméstica aqui


Para combater o drama da violência doméstica em casais homossexuais, bissexuais e transgénero, bem como o silêncio que gira em torno dele, está a ser lançado esta tarde, 1 de março, um guia “Violência Doméstica: Boas Práticas no Apoio a Vítimas LGBT”, de iniciativa da Comissão Para a Cidadania e Igualdade de Género.

O documento aponta para algumas alterações que devem começar por ter lugar para que este drama não permaneça ainda mais silencioso do que o que tem sido em casais heterossexuais.


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“Para além da escassez de serviços e recursos sobre a violência doméstica dentro da comunidade LGBT, há um significativo desconhecimento das próprias pessoas LGB sobre os recursos disponibilizados a associações”, nota o guia, que pede mais formação e informação por parte dos profissionais que fazem o acompanhamento destas comunidades.

O manual pede “a desagregação sistemática dos dados referentes à violência em casais de sexo diferentes ou do mesmo sexo” em caso de “participações policiais”, para que “esta realidade apareça representada de modo adequado no relatório anual de Segurança Interna”, combatendo, assim, a invisibilidade.

De acordo com o guia pensado para profissionais de estruturas de apoio, “as vítimas LGB de violência doméstica estão sujeitas a um duplo estigma: ao insulto que recai sobre a sua identidade e orientação sexual […] e aos estímulos de vida associados”, lê-se no documento. Uma situação descrita como “duplo armário”, expressão cunhada pela investigadora Ana Cristina Santos, do Centro de Estudos Sociais, da Universidade de Coimbra, e que – refere – “constitui uma armadilha em que, frequentemente, se enredam as vítimas LGB de violência conjugal, remetendo-as para um silêncio difícil de romper”.


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Para lá da dupla estigmatização, há também, a dobrar, a invisibilidade e o isolamento.

O guia refere, mesmo e por várias vezes, que “até recentemente, a violência conjugal em casais do mesmo sexo permaneceu desconhecida, invisível, ou mesmo tabu”.

O caminho para a vivência em solidão é, depois, curto.

Violência entre mulheres e a “discriminação tripla”

Primeiro, são mulheres, depois são lésbicas ou bissexuais e, por fim, são vítimas de violência doméstica. Os casais homossexuais femininos acabam por estar mergulhados numa “discriminação tripla”, diz o guia agora apresentado.

Lembra que “à invisibilidade que incide sobre as mulheres lésbicas e bissexuais, acresce o silêncio social em torno de mulheres agressoras”.

Mais, este documento vinca que “o isolamento de casais de mulheres pode ser maior do que o de casais de homens”, o que sucede porque há uma rede de apoio maior a uma homossexualidade mais conhecida: a masculina.

O estigma dos homens que são vítimas

Há mais violência conjugal entre homens “quando há assimetrias de poder na relação”, resultantes de diferenças sócio-económicas, aponta o documento.

Mas a par desta evidência sublinhada pela investigação existente na matéria, há “o estigma” com o qual os homens vivem: “as expectativas sociais em torno da masculinidade tendem a ser incompatíveis com experiências de vitimação masculinas”, sobretudo no que diz respeito à intimidade.

Ainda assim, diz o documento, “o estigma e a ‘vergonha’ de ser agredido por uma mulher tendem a ser maiores do que o estigma de ser batido por outro homem”.

O transgénero e a violência generalizada

O isolamento e a invisibilidade são ainda mais marcados neste tipo de casais, sobre os quais há muitos poucos estudos disponíveis. A isto, acrescentam-se as “desigualdades estruturais” a que estas pessoas “estão expostas” e que decorrem de situações como o acesso ao emprego, à saúde, à, entre outras, segurança social, vinca o guia.

Há também, vinca o manual, o “maior risco de [as pessoas trans] sofrer violência e abuso por parte de familiares, situações que configuram, em muitos casos, crimes de violência doméstica”, aponta.

Casos crescem nos jovens casais LGBT

São indicativos, mas preocupantes, os dados que apontam para uma maior prevalência de situações de violência em jovens casais LGBT quando comparados por heteressoxeuais.

“A experiência do insulto, invisibilidade e isolamento pode, assim, ser um dos fatores explicativos de uma possível maior incidência de violência em relações de intimidade entre jovens” destas comunidades, aponta o guia.

Acresce a isto o facto de os jovens considerarem, que os serviços de apoio disponíveis “não serão os mais adequados”. Por isso, são necessárias “estratégias de intervenção e prevenção dirigidas a jovens”, bem como a aplicação de políticas educativas nas escolas, “alargando o conceito de violência conjugal, independentemente da orientação sexual”, seguindo uma recomendação deixada pela investigadora Ana Cristina Santos.

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