Luís Buchinho: “A moda, se não for irrepreensível tecnicamente, não tem lugar no mundo”

Em vinte e cinco anos de carreira e vinte coleções apresentadas em Paris, são estes os números do criador português Luís Buchinho. Segunda-feira (3 de outubro), pelas 17.30 em Paris, o designer apresentou as suas proposta para a primavera/verão 2017. A sala YOYO do Palais de Tokyo vestiu-se de um jogo de luzes hipnotizante que as modelos enfrentaram com o passo firme e rápido. A coleção manteve-se fiel à linha criativa de Luís Buchinho, não faltando por isso as peças desconstruídas, as texturas ricas, as assimetrias e os padrões gráficos. Detalhes que o designer nos explicou melhor depois do desfile, quando a sala já se encontrava vazia.

Qual foi a inspiração para esta coleção?
A coleção partiu de um conjunto de imagens que eu colecionei. São fotografias a preto e branco que serviam como catálogo para vendas de máquinas indústrias de tipografia, onde se mostram as máquinas e os componentes: as rodas de entrada, os parafusos, as correntes, os circuitos elétricos. Achei sempre que ia pegar naquilo e chegou a altura. Fez um bom follow up do que foi a minha coleção de inverno, que também tinha muito a ver com mecanismos mas em versão puzzle. Esta inspiração fez uma versão de verão de um um tema que podia ser um pouco duro e que eu quis suavizar com uma temática desportiva, um desportivo sexy, um desportivo muito adaptado às curvas da mulher, mas com uma certa preocupação em ter peças que fossem fáceis de transportar. Hoje em dia, as pessoas viajam muito. Por isso os tecidos são um pouco inspirados no sportswear, são sintéticos e já têm um tratamento para ficar amarrotados, são muito leves e multifacetados no seu uso.

Os padrões também refletem esta inspiração?
Sim, a inspiração serviu toda a parte gráfica da coleção de uma maneira um pouco abstrata, mas se virmos os padrões de perto eles têm correntes, têm rodas dentadas, têm grelhas, está tudo lá mas de uma maneira muito subliminar. Eu não gosto que os temas sejam muito óbvios e que se percebam logo, quero que as pessoas percebam logo é se gostam da coleção ou não, isso é que é importante.

E foram desenhados pelo Luís?
Foram desenhados pelo João Melo Costa e pela Thelma Pott, que trabalharam os dois comigo a nível gráfico para a criação destes padrões.

Como é que surge esta parceria entre designers com os seus próprios projetos?
São pessoas que já colaboraram comigo, são da minha confiança máximo, são pessoas cujo trabalho eu valido. E sei que têm ferramentas que vão muito ao encontro do que é a minha imagem e que posso transmitir uma ideia e ter um excelente resultado.

Acha que o caminho da moda portuguesa pode passar por este tipo de parcerias, em vez de ser são individualista, porque somos bons mas muito poucos?
Sim, mas nós não deixamos de ser individualistas ao fazer coisas destas, acho que é essencial para um designer estar sempre rodeado de jovens designers para perceber melhor as correntes do momento, para sair um pouco da sua zona de conforto e para poder ter visões frescas sobre o que é o seu trabalho.

É por isso que gosta de dar aulas?
Sim.

E qual é a grande lição que quer transmitir aos seus alunos?
É o discurso da individualidade. Se quiserem ser criadores têm de ter uma linguagem completamente autêntica e que vem do coração. Todo o meu projeto com eles é trabalhado dessa forma.

Como é que isso se trabalha?
Trabalhasse expondo-os um pouco, obrigando-os a exporem-se e obrigando-os a terem um grande juízo critico sobre aquilo que criam. Eu depois sou uma espécie de mediador técnico, eu não julgo conceitos, não os obrigo a ir por caminhos específicos. O caminho eles é que têm de o encontrar. Eu depois apenas julgo a forma como eles o concretizam tecnicamente, porque seja qual for o caminho as peças têm de estar irrepreensíveis. Acho que a moda hoje em dia, com esta concorrência toda, se não não for irrepreensível tecnicamente não tem lugar no mundo.

Nesta coleção, à semelhança de outras, não faltam as desigualdades, mistura de materiais e plissados, inclusivamente alguns coordenados plissados fazem lembrar coleções suas antigas, foi buscar alguns designs que já tinha?
Não os designs não e a forma de plissar também é diferente. Mas são técnicas que eu já domino e que fazem parte da assinatura da marca e eu gosto de voltar sempre a pegar nelas e dar-lhes um ar fresco e novo. Quero que acrescentem sempre alguma novidade à coleção seguinte. Geralmente não são feitas sempre da mesma maneira, mas esta mistura de materiais e grafismos é algo que me tem acompanhado desde sempre.

O Luís já apresenta em Paris há bastante tempo, nota um crescimento da marca devido a estas apresentações?
Sim, mesmo a nível de público, a sala está cheia, temos muito mais espectadores e visibilidade.

E em termos de vendas isso reflete-se?
Reflete-se porque é uma semana de moda que é muito validada e é um cartão de visita excelente para conquistar novos clientes.

Para além do desfile tem ainda os Showrooms, qual é a diferença entre os dois?
O desfile tem a imagem mais global e mais diversificada, é a assinatura da ideia da estação. O showroom tem as peças mais arrumadas, com uma apresentação mais comercial, é uma avaliação peça a peça.

O que é que funciona melhor para a marca?
São as duas coisas em conjunto. Não podem existir uma sem a outra.