Mulheres e Hollywood: entre o drama, o horror e a tragédia

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[Fotografia: Shutterstock.com]

Os discursos pela igualdade de género, de oportunidades e de salário na indústria do cinema norte-americana têm aumentado e subido de tom. Afinal, Hollywood está longe de ser a terra dos sonhos para o sexo feminino. Entre 2007 e 2016, apenas 35 mulheres num total de 612 realizadores dirigiram filmes, o que estipula um rácio de 17 homens por cada realizadora. Na lista, contam-se nomes como Angelina Jolie, Anne Fletcher, Betty Thomas, Brenda Chapman e, entre outras, Catherine Hardwick ou Elizabeth Banks.

Esta é uma das conclusões do estudo realizado pela universidade californiana USC Annenberg, ao abrigo da iniciativa Media, Diversity and Social Change, e que analisou 100 filmes por cada ano, entre 2007 e 2016.

Elas realizam mais dramas e comédias

As célebres costas das cadeiras carregam poucos vezes nomes de mulheres. E os piores anos foram 2013 e 2014, em que apenas 1,9% dos assentos, dispostos em cena, estavam atribuídos ao sexo feminino. Por contraposição, os melhores anos foram 2008, com 8%, e 2015, com 7,5%. No ano passado o valor baixou para pouco mais de metade: 4,2%.

Dispondo dos dados por género cinematográfico, as mulheres dirigiram mais dramas (40,9%, equivalendo a 18 películas) e comédia, com 13 filmes a representar 29,6%. Horror, ação e trhiller estiveram entre os tipos de filmes menos realizados por elas. Nos homens, a escolha é muito mais transversal. O mesmo sucede na tipificação por idades, em que eles filmam ao longo de um período maior de vida, desde os 20 aos 80 anos. Já elas, estão mais circunscritas: entre os 30 e os 60, havendo um claro predomínio aos 40 e aos 50 anos, com 22 e 8 diretoras, respetivamente.

A co-autora do estudo, a professora Stacy Smith concluiu que a pesquisa “revela uma completa exclusão e uma invisibilidade epidémica [do sexo feminino] atrás das câmaras”, mostrando “consistentemente que realização é predominantemente masculina”.

Professora da universidade californiana USC Annenberg [Fotografia: USC Annenberg.com]
Professora da universidade californiana USC Annenberg [Fotografia: USC Annenberg.com]
E acrescenta: “Quando a lente está assim distorcida, fica evidente que existe um plano inclinado da sociedade para o público e que coloca em evidência a falta de mulheres e das comunidades”.

Disney, Lionsgate e 20th Century Fox no fundo da tabela

O estudo faz ainda a distinção tendo em conta as sete maiores produtoras e distribuidoras. A Paramout Pictures, a Lionsgate e a Disney estão entre as que contratam menos histórias a mulheres, com as duas primeiras empresas a terem distribuído, cada uma, três filmes. No reino das histórias de encantar, a Disney entregou cinco películas – em 101 – a diretoras. A Warner Bros Pictures dá nas vistas pela razão contrária, mas ainda assim numa desproporção assinalável: 10 histórias em 174 foram contadas por elas.

Negros e asiáticos em minoria

Os realizadores negros continuam a estar em minoria e, se olharmos para a realidade feminina, contam-se apenas três: Ava DuVernay, Gina Prince-Bythewood and Sanaa Hamri.

“Quando se tem uma visão transversal, apercebemo-nos que, mediante todas as oportunidades de realização, existem apenas sete mulheres negras, das quais três são afro-americanas”, referiu a autora do estudo.

A Disney volta a falhar aqui como a produtora e a distribuidora que menos realizadores negros integrou na lista de 101 entradas. Por oposição, a Lionsgate foi quem mais deu emprego aos afro-americanos (16 em 86 filmes).

Olhando para a comunidade asiática, a Universal Pictures foi quem deu mais oportunidades, contabilizando dez películas em 152. Lionsgate volta a ser, neste prisma, a distribuidora que menos filmes adjudica a asiáticos, tendo, numa década, contratado apenas um, num universo de 86 histórias. É também a produtora – sublinhe-se – que menos películas soma. A recordista, com 174 filmes, é a Warner Bros. Pictures.

Das produtoras ao público: o que fazer para mudar!

Smith crê que no dia em que o talento se impuser como principal critério de escolha, talvez os números mudem:

“Quando as pessoas forem avaliadas pelas suas ideias, pelas suas histórias e pelas escolhas, então aí veremos estes números a mudar.”

O relatório agora divulgado aponta ainda algumas soluções para contrariar esta realidade e que passam por levar os responsáveis dos estúdios, os produtores e agentes a alargarem as oportunidades às mulheres e às comunidades minoritárias.

É importante, diz a investigação, promover a separação entre a personagem principal da história e o género ou raça do realizador. Estes também saem daqui com uma tarefa: apoiar e encaminhar estagiários de diferentes proveniências. As recomendações aos atores passam por promover a inclusão contratual. Quanto aos quadros financeiros e filantrópicos, também eles devem apostar em histórias que provenham de autores de áreas sociais mais diversificadas. Por fim, o público – com o seu gosto e o seu dinheiro – pode também fazer a sua parte, escolhendo e exigindo ver películas, seja no cinema, seja em casa, que sejam realizadas pelas minorias.

Óscares seguem tendência semelhante

Com a 89ª cerimónia da entrega de prémios de cinema, marcada para 26 de fevereiro, um outro estudo, realizado pelo Women’s Media Center (WMC), indica que as mulheres representam apenas 20% das categorias atrás das câmaras.

Apesar dos esforços feitos no ano passado no sentido de incluir novos membros convidados – incluindo mais mulheres e mais elementos oriundos de minorias étnicas -, o número de mulheres indicadas a Óscares caiu 2% face a 2016.


Natalie Portman, Jennifer Lawrence e Patricia Arquette tem denunciado as disparidades de Hollywood


Se não, vejamos: não há uma realizadora nomeada e há apenas uma autora. Contudo, é importante ressalvar que há nove mulheres nomeadas como produtoras na categoria de Melhor Filme, a maior até agora.

“O nosso estudo aponta que, nos papéis cruciais atrás das câmaras, 80% dos nomeados são homens, o que representa quatro em cada cinco. Tal significa que as perspetivas e as vozes masculinas são largamente determinantes do que vemos no ecrã”, afirma Julie Burton.
Julie Burton, presidente do Women's Media Center [Fotografia: Twitter]
Julie Burton, presidente do Women’s Media Center [Fotografia: Twitter]

Para a presidente do WMC, “sse as mulheres não conseguem chegar lá, não são reconhecidas e premiadas pela sua excelência e impacto”.

Uma das medidas, referiu ainda Burton, passa por, “citando o que Michelle Obama (ex-primeira dama dos Estados Unidos da América)” disse em junho do ano passado na Unitad States of Women, “pedimos aos executivos das produtoras e às agências que não se importam de celebrar acordos que excluem mulheres para que ‘sejam melhores’. As perspetivas, a experiência e as vozes de mais de metade da população merecem sentar-se à mesma mesa”.