O que significa o guarda-roupa de Melania Trump

Em 1961, Jackie Kennedy vestiu-se de azul celeste, chapéu e luvas para a cerimónia de tomada de posse de J. F. Kennedy como Presidente dos EUA. Em 2017 a história repetiu-se, mas sem o chapéu. Melania Trump envergou um vestido justo, uma das suas marcas de estilo, com um bolero de gola subida desenhados pelo designer americano Ralph Lauren e, tal como Jackie, calçou umas luvas de pele a condizer.

Uma semelhança que não é estranha quando nos deparamos com o artigo de dia 1 de dezembro de 1999 do New York Times, em que Melania – na altura ainda Knauss – diz que se um dia fosse primeira-dama seria “muito tradicional. Como Betty Ford ou Jackie Kennedy”.

Esta imagem coincide com as escolhas de roupa durante toda a campanha, em que apostou em tons lisos e modelos muito elegantes e muito seguros. Melania não arrisca no estilo da mesma forma que não arroja no comportamento, tudo nela é formal, contido, até o sorriso, uma forma de estar bem diferente da antecessora Michelle Obama que conquistou os americanos e o mundo pela sua espontaneidade, a sua forma de falar com as mãos e o seu sorriso fácil. Características que também a tornaram num ícone de estilo: nunca foi a roupa que a vestiu, era ela que envergava a dava vida à roupa. Michelle Obama, pela sua forma confiante e humana de viver, transformava tudo o que vestia num sinónimo de força e empoderamento feminino.


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Melania é diferente, é a encarnação da controvérsia: nasceu na Eslovénia mas hoje é casada com um homem que não vê com bons olhos a imigração, tornou-se modelo com apenas 16 anos, pousou nua por diversas vezes, tornou-se a terceira mulher de Donald Trump, 24 anos mais velho e diversas vezes acusado de tratar as mulheres como troféus. No entanto – ou por isso mesmo – alimenta (pelo menos durante a campanha) uma imagem tradicional – nunca ofuscando o marido, mantendo-se formal e discreta, até na forma de vestir, durante todo o tempo eleitoral – ainda que se faça valer do seu corpo atlético, para usar modelos justos e rachas que realçam as suas formas femininas de uma forma bem mais sensual que tradicional. Este é um dos pontos em que o estilo de Melania se pode tornar interessante e fazer com que muitas mulheres se identifiquem com ela, jogando com a multidimensionalidade feminina e o equilíbrio que muitas mulheres procuram entre o papel tradicional da mulher e o seu lado mais ousado.

Ainda assim, para que este jogo resulte, ainda falta a Melania a confiança para se destacar, tendo as suas escolhas sido até hoje apenas elegantes e sofisticadas, resta saber se será também apenas isso vamos poder reconhecer à Primeira Dama dos Estados Unidos.

O que escolhemos para vestir é sempre revelador de uma mensagem, sobretudo quando se trata de cerimónias de Estado e as escolhas da ex-modelo não são exceção. A grande mensagem chega com o vestido azul a lembrar Jackie Kennedy: pode revelar o regresso de uma Primeira Dama menos interventiva, cujo papel principal é apoiar o marido ser uma mulher e mãe exemplar mas discreta, e não ser a parceira do Presidente no seu mandato (como foi Michelle para Barack).


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A ligação de Melania Trump com a indústria da moda, ao contrário do que seria de esperar para quem trabalhou tanto tempo como modelo, tem sido bastante conturbada. Foram vários os designer que vieram publicamente dizer que não a queriam vestir, por não concordarem com os ideais políticos de Donald Trump. Sophie Theallet, uma das designers preferidas de Michelle Obama, foi das primeiras a tomar esta decisão e a ela seguiram-se nomes como Tom Ford, Marc Jacobs, Derek Lam, Phillipe Lim e outros. Pelo que, ao contrário do que normalmente acontece, Melania se viu obrigada a comprar a maioria dos seus fatos em lojas, sem falar diretamente com os designers e sem modelos feito especificamente para ela.

Melania

Situação que tem vindo a mudar desde o resultado das presidenciais, com alguns designers a afirmarem que é sempre uma honra vestir a primeira-dama independentemente das suas convicções políticas. Um desses casos é Ralph Lauren que se diz apartidário e que vestiu durante a campanha Melania e Hillary Clinton, ambas de branco, a cor do feminismo.

Para a noite anterior à tomada de posse a mulher de Trump escolheu um vestido de gala justo e brilhante da designer libanesa Reem Acra, imigrante nos Estados Unidos há mais de trinta anos. Tudo poderia ter sido um acaso, não fosse o discurso de campanha do marido ter sido marcado pela intolerância para com os imigrantes. Assim este simples vestido de baile tornou-se num esforço diplomático gigantesco, ainda que sublime.

No dia anterior (19 de janeiro) o casal presidencial participou numa cerimónia de homenagem aos militares americanos. Para a ocasião, a designer escolhida foi Norisol Ferrari, americana com ascendência Colombiana e Venezuelana, e que no seu site diz criar roupa para empoderar as mulheres e revela ideais de igualdade para todos independentemente da sua etnia, género, religião, política e cor de pele. Mais uma escolha curiosa e que reforça a ideia de que Melania poderá usar a moda como uma arma diplomática face às políticas protecionistas do marido.

Um caminho que pode ser muito interessante e revelador da influência da moda, basta que a nova primeira-dama o continue a seguir e lhe junte um pouco de personalidade.