“Podemos não conhecer bem aqueles que são mais próximos de nós”

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Fotografia de Polly Whitehouse

Lucie Whitehouse tem 42 anos e já escreveu thrillers de sucesso como A casa à meia-noite e A cama que eu fiz. O último é Antes de te conhecer, o primeiro livro da autora britânica disponível em língua portuguesa. Conta a história de Hannah, uma mulher independente que larga um emprego estável em Nova Iorque para ir viver com o homem que ama, Mark Reilly, para o Reino Unido. Mas desengane-se se pensa que este livro é mais um cliché romântico.

Antes de se apaixonar por Mark, Hannah não acreditava no casamento. Em casa tinha o exemplo do matrimónio falhado dos pais e uma mãe amargurada, mas o amor levou-a a mudar de ideias. Durante o primeiro ano de casamento tudo corre bem: vive feliz numa casa elegante em Londres, com um marido que parece adorá-la e a ajuda a lidar com a dificuldade em encontrar um novo emprego. Tudo muda quando Mark não regressa de uma viagem de negócios aos EUA e, enquanto procura pelo paradeiro do marido, Hannah descobre várias mentiras perigosas.

O principal objetivo da escritora com esta obra é chamar a atenção das pessoas para o facto de nem sempre conhecermos bem quem nos rodeia, até mesmo aqueles que são mais próximos de nós.


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Antes de te conhecer tem feito tanto sucesso em todo o mundo que é comparado ao livro A Rapariga no Comboio, de Paula Hawkins, que apaixonou os portugueses em 2016. Em conversa com o Delas.pt, Lucie Whitehouse revela que encara esta comparação de forma bastante positiva e considera que estamos a viver uma época de ouro para os livros que contam histórias de crime e suspense.

O que podem os leitores encontrar neste Antes de te conhecer?

Espero que os leitores encontrem uma história emocionante e pensem que podemos não conhecer bem aqueles que são mais próximos de nós.

Então o objetivo é chamar a atenção dos leitores para o facto de nem sempre conhecermos realmente as pessoas com quem partilhamos a vida, por mais próximas que sejam?

Sim, essa ideia interessa-me mesmo. É impossível, claro, saber tudo sobre outra pessoa, mas quando se tratam de relacionamentos amorosos estamos mais propensos a ser arrebatados pela emoção em vez de ponderarmos as nossas decisões. A questão foi particularmente relevante para mim, quando escrevi este livro tinha-me casado recentemente. O meu marido é norte-americano, eu sou britânica, e por causa dos vistos e outras questões legais tivemos um romance um pouco repentino. Continuamos o processo de nos conhecermos um ao outro depois de nos casarmos.

O livro tem sido muito comparado com A Rapariga no Comboio, que foi um sucesso de vendas em todo o mundo. O que significa esta comparação para si?

É muito bom porque a comparação leva os leitores ao meu livro e a apreciá-lo. O que os dois livros têm em comum, à parte do género, é que ambos são histórias firmemente construídas e com finais inesperados.

O segredo para um bom thriller é uma história repleta de reviravoltas e suspense?

O segredo é segredo. Se disser mais posso arruiná-lo.

Já escreveu quatro thrillers de sucesso. Como mantém os leitores agarrados aos seus livros do início ao fim?

Não sei ao certo, honestamente nunca pensei conscientemente sobre como manter as pessoas agarradas. Tento escrever o tipo de livros que eu iria gostar de ler, com uma atmosfera palpável e suspense, desenvolvimentos emocionantes que podem estar enraizados nas experiências de vida de muitas pessoas. Tento colocar algo honesto sobre a minha experiência de vida para que os outros se possam identificar.

Não há uma receita pré-definida para um livro ser um êxito…

Não sei se já existe uma “receita”, os livros realmente bem-sucedidos são aqueles que não se parecem muito com os outros que foram escritos anteriormente. Estamos numa época de ouro para a escrita de crime e suspense. Há muito apetite para momentos emocionantes, grandes reviravoltas e retratos psicológicos de caráter obscuro. A escrita espirituosa cai sempre bem também.

O que foi mais difícil no processo de escrita?

A verdade neste livro está constantemente a mudar. Controlar quem estava a dizer o quê – e quem sabia o quê – num determinado momento às vezes foi um desafio.

Tem por hábito mostrar os livros a alguém antes de terminá-los?

Quando comecei a trabalhar no meu primeiro romance pertencia a um grupo de escritores excelente. Partilhávamos o nosso trabalho, recebíamos um feedback honesto e isso foi extremamente útil. Aprendi muito. Também costumo mostrar os primeiros capítulos ao meu agente e editor e falo sobre a trama com o meu marido, que é argumentista. Quando a nossa filha está na cama discutimos muitas vezes as nossas histórias na cozinha.

Onde se inspirou?

A ideia inicial para Antes de te conhecer veio de uma concentração de polícias que vi no final de uma bela rua de Londres. As autoridades estavam à procura de testemunhas para o sequestro de um homem que tinha sido retirado e levado da cama a meio da noite. Pensei que o homem provavelmente tivesse sido sequestrado, já sabia o que poderia estar a causar aquilo… Então pus-me a imaginar como seria se fosse eu a mulher daquele homem e não soubesse onde ele estava. Na história do livro não há nenhum rapto, mas a ideia de um novo marido com um segredo foi a semente para o livro.

Que autores tem como referência?

Entre os escritores que admiro estão Graham Greene, Joseph Conrad e Dickens. Os meus autores de crime favoritos são Jo Nesbo, Tana French e – especialmente – Denise Mina.

Londres é o grande palco de toda a história. O que a levou a escolher esta cidade?

Escolhi escrever sobre Londres porque é uma cidade que conheço e amo e porque ela encaixou-se bem com esta história. Quando vi a cena da polícia que me inspirou vivia num antigo apartamento alugado nas proximidades. A aventura do livro decorre em Parsons Green, uma zona cara da cidade. Fiquei realmente espantada com as manifestações de riqueza que vi e pela atitude de muitas pessoas. Queria explorar isso. Mas Londres, como todas as grandes cidades, é um lugar de contrastes dramáticos e é isso que faz dela perfeita também.

O livro acaba por ser um retrato da cidade…

De certa forma é um retrato da cidade. Gosto realmente de escrever sobre lugares, tentar capturar a forma como eles nos olham, sentem e, de certa forma, ‘Antes de te conhecer’ é uma carta de amor para Londres porque foi o primeiro livro que escrevi depois de emigrar para Nova Iorque.

Quando Mark desaparece aparecem duas versões de Hannah: a mulher moderna com uma carreira bem-sucedida e a mulher tradicional, que espera pelo seu marido que está em parte incerta. É possível para uma mulher atual combinar essas duas facetas?

Não só é possível como é inevitável. Hoje em dia, graças a Deus, muitas mulheres têm carreiras bem-sucedidas, mas ser profissionalmente bem sucedido não mata a nossa parte humana, a parte que ama, que se importa e se preocupa. Isso provoca a tensão e a vida neste livro.

Então é fácil cruzarmo-nos com mulheres como Hannah no nosso dia-a-dia…

Muitas pessoas vão reconhecer a Hannah. Ela é independente e está determinada a não repetir os erros que ela considera que levaram os seus pais ao divórcio. Está feliz, depois de anos de relacionamentos sem sucesso, por ter encontrado alguém com quem construir uma vida, mas ao mesmo tempo sente-se vulnerável por isso. Se você ama alguém tem sempre algo a perder.

É sobre este tipo de pessoas, comuns e com quem nos cruzamos diariamente, que mais gosta de escrever?

Gosto de escrever sobre pessoas que estão numa encruzilhada, especialmente quando isso significa que o seu modus operandi ou crenças antigas estão sob ataque.

Quem é que vai gostar mais deste livro? Homens ou mulheres?

Acho que as mulheres provavelmente vão identificar-se mais com o livro porque tem uma protagonista feminina, mas também é adorável receber o feedback dos leitores masculinos que apreciaram a trama.

Para si é mais importante ter sucesso nos EUA do que na Europa?

Dado o tamanho dos mercados, um best-seller americano significa mais em termos financeiros mas para mim, como britânica, o Reino Unido é mais importante. Sou uma europeia orgulhosa.

Ficha técnica do livro:

Antes de te conhecer

Antes de te conhecer, Lucie Whitehouse. Bertrand Editora, 16,90 euros