Quatro erros que estamos a cometer com os filhos

São quatro as emoções primárias que, mal geridas e mal encaminhadas no início da vida, vão influenciar e mesmo condicionar o percurso de uma vida inteira. Tal não quer, porém, dizer que devemos suportar tudo isto enquanto formos vivos.

Há soluções que podem chegar através do exemplo e até por tratamentos que passam por confrontar os pacientes com o medo, a raiva, a alegria e a tristeza. Quatro pontos cardeais que a psicóloga e treinadora de emoções Cristina Valente defende que devem ser olhados com atenção e dirigidos com cautelas.

A psicóloga e especialista em treino DL Cristina Valente [Fotografia: Gustavo Bom/Global Imagens]

Do exemplo de Cristiano Ronaldo, ao fim dos eufemismos, passando pelos baixos resultados escolares, conheça os erros que a especialista mais nota nas famílias portuguesas. Em época de férias e família, nada como olhar para aquela rosa-dos-ventos emocional e perceber o que pode mudar, sobretudo se tem filhos que ainda se inscrevem na janela de oportunidade por excelência definida por Valente: “dos três meses de gestação aos sete primeiros anos de vida”.

Depois disto, refere a especialista ao Delas.pt, resta a reprogramação, nada mais que uma confrontação intensiva, um treino de fim de semana, com as memórias que definiram o caráter de cada um. Práticas direcionadas para jovens a partir dos 11 anos, mas também para adultos. Sim, leu bem, todos nós vamos, segundo Valente, mais do que a tempo de aprender a viver melhor.

Percorra a galeria acima e fique a conhecer melhor, de forma sintética, o que deve e não fazer para melhorar a atitude perante a vida. Abaixo, e com mais detalhe, veja o que explica a especialista em treino de Desenvolvimento e Liderança.

A raiva e o exemplo que chega de CR7

“A função da raiva é destruir os obstáculos que impedem as pessoas de conseguirem o que se pretende, e não destruir diretamente os outros. Ou, falando de alguém mais introvertido, destruir-se a si próprio, amealhando tudo dentro de si e provocando danos internos”, afirma Cristina Valente.

A psicóloga escolhe, inclusivamente, o melhor do mundo de futebol para ilustrar e vincar o que quer chamar à atenção. “O Cristiano Ronaldo dá-nos o melhor exemplo de como ele consegue transformar esta emoção base em algo muito positivo. Ele pega nessa força que a raiva lhe dá e transforma-a em algo positivo”, analisa a especialista.

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Mas como o faz? Cristina especifica: “Sempre que ele ouvia o estádio a gritar por Messi, o seu rival, ele utilizava essa raiva e colocava-a ao serviço do seu objetivo, do seu ponto de vista e, com a sua performance, calava o público. Ou seja, utilizava essa raiva não para dar pontapé ao árbitro, não para chamar nomes ao público, mas para marcar e depois dizer: ‘sou eu que estou aqui, e não o Messi’.”

O medo e os baixos resultados escolares

As lentes do medo dos pais criam receios e, com isso, impreparação para enfrentar o mundo. Uma perpetuação de um estado que, afinal, mal se toca e que, por isso mesmo, se teme.

E se isto é assim em casa, na escola a emoção base do medo cresce e, numa proporção geométrica, deixa as suas marcas. “Aí, o ambiente é de caça do erro, a pessoa é o centro das atenções pelas razões erradas”, começa por dizer a especialista ao Delas.pt. E porquê? “O erro não é visto como uma oportunidade de aprendizagem, o miúdo tem medo de arriscar, não se diverte. E o cérebro, para aprender, tem de se divertir”, sublinha Valente.

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“O que é dito aos miúdos é que quanto mais quadrados forem, quanto menos pensarem pela sua cabeça, mais bem avaliados serão. E não é culpa dos professores, que estão ali a cumprir ordens para um tipo de transmissão de conhecimento que já não funciona para os miúdos digitais”, sintetiza a psicóloga e especialista em treino

Tristeza: “As estrelinhas no céu têm de acabar”

Não dá para continuar a esconder as desgraças, as tragédias e o que de mal – e natural – acontece na vida. No que diz respeito à tristeza, a especialista sugere que a conversa da “estrelinha no céu quando alguém próximo morre tem de acabar”.

E prossegue: “É claro que é uma tristeza, mas os miúdos devem encarar de frente a realidade para melhor combaterem a iliteracia emocional que estão a viver”. “É preciso mostrar aos filhos que algo que não está bem deve ser encarado de frente. Os pais não aguentam que os filhos estejam tristes, mas é importante dar-lhes essa aprendizagem”.

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E se Valente trata as agruras da vida com a rudeza que a própria vida pode ter, não o faz por menos quando o tema é o aborrecimento. “É preciso ensinar os pais a conviverem com esse estado dos filhos. É no tédio que nasce a criatividade e a genialidade, e todos temos a tendência para fazer o contrário.

“Temos muita incapacidade em celebrar as alegrias”

De todas as emoções humanas base, esta é provavelmente aquela que daria menos trabalho a resgatar e a dar forma com o objetivo de ter uma vida melhor. No entanto, Cristina Valente volta a lembrar que a sua prática clínica regular lhe traz ecos frequentes noutro sentido.

“Também temos muita incapacidade em celebrarmos as alegrias”, refere, lembrando que se trata de “uma das emoções básicas” e que deve dar a força para “celebrar as pequenas vitórias, os tais objetivos cumpridos”, deve ser entendido como “a energia motivadora”.

“É no tédio que nasce a criatividade e a genialidade”, refere Cristina Valente

Mas, afinal, o que fazemos de errado? “Não ensinamos a ir buscar aquela sensação que, em tempos, uma determinada alegria nos proporcionou. Se aprendermos a fazer isto, criamos um caminho neuronal e passaremos a fazer coisas, algo que ainda não aconteceu, tendo em vista voltar a sentir essa mesma emoção no nosso corpo”, diz Cristina, que clarifica: “a este processo chamamos, nos termos da neurociência, uma âncora.”

Imagem de destaque: istockphoto

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