Podia começar esta crónica com o “era uma vez” e dar uma perspetiva romântica e floreada de todas as situações que vivi na divulgação da Associação Leque, que fundei e presido desde 2009. No entanto, episódios hilariantes e pouco comuns em congressos, palestras, encontros ou reuniões aconteceram mais que uma vez e o romantismo terminou assim que me vi obrigada a enviar uma fotografia antes de comparecer em ditos eventos, não fosse corrida dali para fora como impostora por descrédito dos/as presentes.
Recordo um episódio em que chego à capital, com ar “frescote” e “estilo à congressista” e apresento-me à organização como “A Palestrante”.
De longe ouvem-se vozes entusiasmadas à medida que corria o rumor que a “Celmira Macedo” tinha chegado! Não sei se foi maior o espanto delas ou o meu, ao perceber que me fitavam com ar esmagadoramente incrédulo: – “Mas a Dr.ª Celmira Macedo não veio”? Sorri e respondi: Mas eu sou a Celmira Macedo”.
– “Não, não, a menina não está a perceber, nós convidamos a Dr.ª Celmira Macedo, sabe, aquela senhora de Trás-os-Montes, com um currículo invejável no trabalho com pais de crianças com deficiência. Ela não veio”?
Neste momento eu já estava em dúvida sobre a minha própria existência, será que tinham convidado uma Celmira Macedo, de Trás-os-Montes, com um currículo invejável e que não era eu… Que pretensiosa achar que podia ser eu!
“A menina do secretariado” insistia visivelmente desiludida: – “Mas a sua mãe não pode vir? Foi a ela que convidámos…!!”
Na altura não sabia se rir ou chorar e resolvi uma última tentativa, já num tom mais determinado confirmar a minha identidade: “A minha mãe é sem dúvida uma grande mulher, mas a Celmira Macedo sou eu! Não é a minha mãe! Sou eu!” – E quando digo isto fez-se um silêncio constrangedor seguido de um “Aahhhhh!!!…mas é assim …frescota e moderna… é nós pensávamos que seria… [silêncio e ainda mais constrangedor]…diferente!”
Acredito que a certeza absoluta da minha identidade, só foi reposta no final da palestra. Até hoje estou na dúvida sobre o que queria dizer aquele “diferente”. Na verdade, a “Celmira Macedo, com um currículo invejável no trabalho com pais de crianças com deficiência” vinha de Trás-os-Montes! Será que as teorias implícitas na cultura portuguesa, apenas identificam a benfeitora transmontana como a senhora de meia-idade com “bigode, lenço preto na cabeça e com o burrico atrelado à porta? Será que ter um “ar frescote”, não faz jus a um currículo invejável no trabalho com pais de crianças com deficiência”? Ou o problema aqui é uma “Trás-os-Montes”?!!! Perdoem-me, mas atrás destes montes também há vida, há obra, há massa crítica (e moda também, diga-se de passagem!), há competência e profissionalismo! E não é só aparência, seja ela “frescota” ou nem tanto!
Bem, voltando à história, na dúvida, a partir daí mando sempre uma fotografia minha. Não vá “o diabo tecê-las” e eu ser travada à porta, por outra organização, que estará à espera da Celmira Macedo, aquela de Trás-os-Montes e que não seja eu!
Kiss, kiss. Bang, bang!