A economia do luxo por Helena Amaral Neto no Conversa Delas

15338832_10154823205034650_1526730865214833166_n

Helena Amaral Neto, 45 anos. É coordenadora de cursos executivos na área do luxo no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), da Universidade de Lisboa. É licenciada em Economia, mestre em Finanças e, também, consultora para a área do luxo.

O que é o luxo?

É aquela pergunta one million dolar (milhão de dólares). No caso do luxo, é mesmo one million. O luxo tem aqui várias vertentes e, enquanto profissional na área da consultoria, surge numa ótica de negócio. Ou seja, é a gestão, é a componente associada a um negócio que é o meu foco de atuação. Isto só para distinguir o conceito de luxo, que pode variar desde a ideia de tempo – que é o maior luxo que nós temos. O meu foco de atuação não é esse.

Isso quer dizer que não define o que é o luxo, mas faz antes uma metodologia de trabalho para aplicar aos trabalhos de luxo?

Para aplicar. Ou seja, utilizamos ferramentas de gestão, aplicadas ao setor de luxo e usamo-las para, no fundo, dar muito conhecimento a nível daquilo que são as técnicas, as ferramentas e as óticas de gestão das marcas de luxo. Vamos buscá-las como exemplos porque, de facto, têm enormes vertentes onde podemos tirar imensas mais-valias. Mas um dos aspetos que defendemos, ativamente, no ISEG, passa por verificar que a formação na área de luxo não requer tratar-se de uma marca de luxo ou de uma empresa do setor para aprender com esta realidade.

Estes cursos executivos que ministra no ISEG, com outros professores das mais variadas áreas das finanças têm três vertentes: uma para marcas, outra para turismo e outra para imobiliário de luxo. Quem é que vai frequentar estes cursos? Quem é que se interessa por aprender mais sobre o luxo, nestas três áreas?

Se calhar, começo pelas duas áreas principais do luxo: o imobiliário e o turismo. Os dois estão intimamente ligados e, daí, termos desenvolvido estas duas ofertas formativas, especificamente para cada um dos segmentos. Na área imobiliária, este curso está muito vocacionado para os mediadores, para quem lida com imóveis classificados como luxo e, sobretudo, numa ótica dos clientes internacionais, estrangeiros, que procuram Portugal, quer a nível de investimento, quer a nível de modo de vida. E é preciso, de facto, saber lidar com estes clientes.

“Começo pelas duas áreas principais do luxo: o imobiliário e o turismo. Os dois estão intimamente ligados e, daí, termos desenvolvido estas duas ofertas formativas”

E nesse caso, do imobiliário de luxo, isso quer dizer o quê? Que ferramentas é que são dadas aos alunos para que possam fazer o seu trabalho bem feito?

Damos as ferramentas que permitem, em primeiro lugar – e isto é a parte crítica e transversal em qualquer área de negócio -, conhecer o cliente. Passa por identificar quais é que são as suas características, como fazer uma perfilagem que permita, basicamente, responder às expetativas. No caso do luxo, passa por surpreender e ultrapassar essas mesmas expetativas. O cliente, no caso do imobiliário, tanto pode ser profissional, ou seja, ser um fundo de investimento, ou particular, como um brasileiro, um americano, um chinês ou um francês que decide comprar um imóvel em Portugal e que tem que ter o serviço associado a esse mesmo produto. E é neste serviço que nós focamos a nossa formação na área do imobiliário.

E na parte do turismo? Como é que se diferencia uma coisa da outra e como é que se diferencia um produto turístico de luxo?

Os princípios base, em termos de metodologia, são idênticos, porque parte tudo do principio de “conhecer o cliente” e nas vertentes das suas expetativas, podendo surpreendê-lo. Agora, no caso do turismo, a distinção é feita a nível do mercado empresarial e do mercado de lazer, e pode ser a mesma pessoa: tanto pode vir para um congresso médico em Lisboa, como apaixonar-se pela cidade, que é absolutamente normal, e depois voltar num fim de semana, para um city break. Chama-se a isto fazer um marketing de contexto que, apesar de ter o mesmo cliente, vai permitir tratá-lo de forma diferente de acordo com os objetivos dele.

E nestes cursos, como é que se ensina a conhecer esse cliente que é potencial mas que ainda não existe? Ou seja, estamos a falar em aberto ou em mercados preferenciais e em expetativas já conhecidas, destes clientes, noutros mercados, por exemplo?

Estamos a falar em termos de definição da estratégia de cada um dos operadores. E aqui, podemos estar a falar desde cadeias hoteleiras grandes, como de um Boutique Hotel, de um operador de viagens, ou até mesmo do barco de cruzeiros. O nosso curso, focado no turismo, abrange todas estas áreas de atividade. Identificar qual é a estratégia, onde é que querem ir captar clientes? Agora fala-se muito, no caso da hotelaria e do turismo em geral, de focar no mercado americano, que representa cerca de 5% a 6% de todas as receitas turísticas em Portugal. É um valor muito baixo e tem um potencial de crescimento muito elevado. Imaginemos que o foco daquela cadeia de hotéis é, de facto, alavancar e captar mais clientes americanos – isto é um mercado geográfico, e dentro deste é preciso segmentar o nível de clientes que “nós”, enquanto hotel, pretendemos captar. É um segmento mais alto? Mais de massas? Qual é o produto que vamos desenvolver para captar esse mesmo cliente e, quais é que são os canais de comunicação e de marketing que vamos utilizar para atingir esse objetivo?

“Agora fala-se muito, no caso da hotelaria e do turismo em geral, de focar no mercado americano, que representa cerca de 5% a 6% de todas as receitas turísticas em Portugal”

Nós aqui falamos de vários exemplos, não só de cadeias de hotelaria, como também de operadores turísticos e até mesmo nas próprias linhas aéreas. Ou seja, o facto de Portugal estar, hoje em dia, na moda e de ser considerado um destino de luxo, vem, em grande parte, do enorme trabalho que tem sido feito pelos profissionais desta área para pôr Portugal nesta rota. Gosto muito da expressão ‘Portugal na rota do luxo’, que me faz lembrar as ligações com a rota da seda, que teve o seu apogeu há 500 anos. Acredito que temos todas as condições para estar aqui.

Tem escrito várias vezes na imprensa portuguesa sobre este assunto. Sobre colocar Portugal na rota do luxo. Como é que isso se pode fazer?

Com muito trabalho.

Dizia-me que são necessárias três vertentes. Que vertentes são essas que são precisas completar para sermos um país de luxo?

Acredito que, enquanto país, temos características únicas, das quais destaco duas: primeiro, a autenticidade enquanto destino; e, segundo, a hospitalidade das pessoas, ou seja, o povo português, que é reconhecido internacionalmente pela sua capacidade de acolher não só os turistas, como profissionais e empresas. Estas duas características são únicas e devemos, de facto, trabalhá-las e usá-las como o nosso ponto forte enquanto rota e enquanto destino. Isto porquê? Porque somos um país muito pequeno e nunca nos vamos distinguir em termos de mercado turístico de massas. Não vamos ser nunca um destino muito procurado nem vamos bater a França em termos dos números de visitantes. Daí, acreditar que devemos apostar num turismo de qualidade.

“O facto de Portugal estar, hoje em dia, na moda e de ser considerado um destino de luxo, vem, em grande parte, do enorme trabalho que tem sido feito pelos profissionais da área”

Mas esse é o retrato que a Helena consegue fazer neste momento? É que andando pela rua, nas cidades portuguesas de maior dimensão, percebemos que o turismo está a ter um impacto muito grande. Ou seja, há a sensação dos habitantes de Lisboa e do Porto que estão transformados num país de destino de massas.

Os números – do Turismo Portugal e da Associação de Hotelaria de Portugal – não revelam isso. Mostram que as taxas de ocupação estão entre as mais elevadas de sempre, os preços médios estão também em crescimento. O que significa que o turismo que antes era associado à praia, verifica, hoje em dia, uma valorização da nossa oferta. Estamos a conseguir extrair mais valor do maior número de turistas, o que também se reflete a nível do imobiliário. De facto, falou aqui nas cidades de Lisboa e do Porto, vivemos em estaleiro: sempre em obras. Mas, são obras que estão a valorizar o nosso património e sem as quais não iríamos ter capacidade não só para atrair os atuais turistas, como os futuros. E essas obras permitem oferecer uma capacidade de alojamento muitíssimo mais interessante, mais autêntica. Mais uma vez estamos reabilitar edifícios antigos, como palácios e prédios, o nosso património que é, de facto, o que os turistas procuram. Procuram coisas locais, coisas autênticas e experiências que não conseguem ter noutras partes do mundo. Basta ver a nível de hotelaria. Os hotéis que estão licenciados para abrir nos próximos três anos são, na maior parte, de quatro e cinco estrelas. Portanto, a nossa oferta está a subir em termos de qualidade e esse é, claramente, o caminho a fazer.

“Essas obras permitem oferecer uma capacidade de alojamento muitíssimo mais interessante, mais autêntica”

Os preços estão a crescer, conhecemos, pela imprensa, vários casos de pessoas que têm de abandonar as casas onde sempre viveram, no centro das cidades e, passar para os subúrbios. A semana passada tínhamos a notícia de vários alfarrabistas, no Chiado, a fecharem. É conciliável este aumento exponencial de preços relacionado com este destino de luxo e a vivência quotidiana e autêntica das cidades?

É um equilíbrio difícil. Não acho que haja uma resposta direta, como em qualquer fase de ajustamento que estamos a ultrapassar. Vemos casos de lojas tradicionais a saírem porque, de facto, não têm capacidade financeira para suportar as novas rendas e as novas condições de mercado. Por isso, há um equilíbrio entre esta fase de ajustamento, e isso vai continuar a acontecer. As populações do centro das cidades, basicamente de Lisboa e Porto, vão assistir a uma pressão enorme sobre os valores não só de compra de casa, como também de arrendamento. O que vai obrigar as pessoas e as famílias a saírem do centro da cidade e a libertarem essas casas para novos investidores, a maior parte deles estrangeiros e para novas formas de negócio. A Câmara de Lisboa, pelo menos, já anunciou a construção de habitação com rendas controladas para a classe média, o que vai permitir manter alguma oferta com rendas controladas, que é uma coisa que acontece noutras cidades europeias e não só. Nos Estados Unidos da América também acontece. Permite criar um equilíbrio, mas que vai passar por uma fase de ajustamento. Como em tudo. Ou seja, vamos ver, primeiro, um êxodo e, depois, um regresso aos centros das cidades.

“vamos ver, primeiro, um êxodo e, depois, um regresso aos centros das cidades”

Mas não há o risco de Lisboa e, talvez o Porto, em menor escala, passarem a ser as novas Venezas? Isto é um risco quando estamos a falar de mercado de luxo turístico, quando colocamos a premissa na autenticidade e no “saber receber”.

Esse risco existe, se formos olhar para um turismo de massas, porque estamos a falar em quantidade. Daí a minha defesa de Portugal enquanto destino não só de turismo, mas também de investimento e de qualidade. Apostar nesta permite manter a autenticidade em termos de património e da oferta. Ou seja, se calhar é melhor termos um Boutique Hotel com 18 quartos, que cobra 300€, 400€ ou 500€ por noite, do que hotéis com trezentos quartos a 90€. Isso é a minha premissa, porque permite manter a autenticidade da cidade e controlar o número. O próprio mercado de luxo, por definição, é o topo da cadeia, falamos em qualidade e não em quantidade. Todo o valor acrescentado chega em qualidade e não em quantidade. Pelo que tenho visto, e os números também o mostram, há uma tendência nesse sentido, o que nos permite posicionarmo-nos enquanto destino de luxo. Depois, um dos efeitos que decorre desse percurso é o destino enquanto retalho. Este é um conceito que também gostava de trazer aqui: o de criar em Lisboa e no Porto – as duas principais cidades – um turismo de compras.

“Se calhar é melhor termos um Boutique Hotel com 18 quartos, que cobra 300€, 400€ ou 500€ por noite, do que hotéis com trezentos quartos a 90€”

Isso quer dizer que tornar-nos-íamos um destino para comprar marcas de luxo?

Sim, metade das vendas de produtos de luxo é feita a compradores em viagem, os chamados global shoppers. Estes compradores planeiam as suas viagens em função do roteiro de compras e, depois, passam pelos monumentos para tirar uma selfie.

Portanto, ao contrário daquilo que as pessoas associam ao turismo?

Exatamente. Esta é uma boa estratégia porque vai captar clientes de qualidade, de uma gama alta. Em termos de poder aquisitivo, permite alimentar não só a hotelaria, como todos os serviços turísticos associados à qualidade. Permite, também, desenvolver toda a área do imobiliário associado a essa mesma oferta turística e, ainda, alimentar o retalho e o retalho de luxo. São três em um.

Essa venda de turismo de compras de luxo, que efeitos práticos tem na economia nacional? As grandes marcas, consideradas de luxo, não são portuguesas. Depois, do ponto de vista das compras, também sabemos que quem tem passaporte estrangeiro consegue reaver o IVA do que compra, na Alfândega, antes de deixar Portugal.

Quem tem passaporte e fora da União Europeia.

Sim, estamos a falar por exemplo, de mercados como os Estados Unidos.

Sim, Estados Unidos, brasileiros, chineses e os angolanos, que são os principais compradores, por incrível que pareça.

Ou seja, a entrada de capital na economia nacional é mesmo real? É assim tão causa-efeito, uma vez que temos as grandes marcas sediadas noutros países e, portanto, não pagam todos os impostos em Portugal. E temos, por outro lado, os impostos ao consumo que podem ser rebatidos à saída do país.

Se calhar, uma parte da mais-valia não fica em Portugal, porque são marcas internacionais. Mas estamos a esquecer-nos da componente da geração de emprego e de todos os serviços associados, ou seja, da captação de receitas que conseguimos obter para o país com efeito direto nas contas públicas e no impacto a nível da economia da entrada destes turistas, que são turistas que vêm para fazer compras. Só para dar uma ideia do efeito, não há números concretos em relação às vendas de produtos de luxo. Vamos supor, no caso de Lisboa, na Avenida da Liberdade, não há números globais, mas, o que se notou no ano passado foi que, no último trimestre, que é tipicamente mais calmo em termos de turismo, teve um aumento de 50% das vendas. Isto significa que estes novos turistas, que vêm fora daquilo que se chama a época alta do turismo – a partir de outubro, novembro e dezembro -, vêm, ficam nos melhores hotéis, frequentam os bons restaurantes, querem conhecer aquilo que a cidade tem de melhor para dar e, fazem as suas compras, neste caso, de Natal e não só, nessa principal artéria do luxo em Lisboa, que é a Avenida da Liberdade e toda a zona envolvente.

“Uma parte da mais-valia não fica em Portugal, porque são marcas internacionais. Mas estamos a esquecer-nos da componente da geração de emprego e de todos os serviços associados”

Temos um valor acrescentado muito grande que tipicamente não teríamos. Estamos a atrair um valor adicional que não tínhamos há uns anos e, para isso acontecer, é preciso haver uma conjugação de oferta com serviços associados que estejam preparados para lidar com este fluxo de clientes altamente exigentes. São clientes que estão habituados a tudo, do bom e do melhor, como se costuma dizer. A vantagem adicional é que, por exemplo, um cliente que vem a Lisboa – seja chinês brasileiro ou americano – passa uma estadia e gosta tanto que querem voltar, comprar casa e investir num negócio. Esta é uma fonte de captação de investimento que pode entrar através do retalho e depois pode ter repercussões: a nível do imobiliário, a nível do próprio turismo e a nível das start up. Ou seja, é uma porta de entrada para depois alavancar as outras áreas de negócio, as outras áreas de oferta que possamos ter para o país.

É possível fazer um calendário para que Portugal entre definitivamente nesse roteiro do luxo?

Ontem? (risos)

Mas, qual seria o plano de produção do fomento desta ideia, nas cabeças dos turistas internacionais no setor do luxo?

É um trabalho que tem vindo a ser feito e o mérito é não só do governo, mas, sobretudo, do Turismo de Portugal e de todos os profissionais que trabalham nesta área. Há um trabalho extraordinário que tem sido feito. A própria Estratégia do Turismo 2027 também define quais são as linhas orientadores, e estão muito vocacionadas para a qualidade, em detrimento da quantidade. Esse trabalho está a ser feito. Agora, um calendário… O fator imobiliário é o principal em termos de valores de investimento, porque estamos a falar de valores, muitíssimo, mais avultados. O trabalho a nível do imobiliário também tem sido excelente, em termos de captação de investidores estrangeiros, sobretudo. Há muitos fundos de investimento imobiliário que, só agora que temos um mercado também de luxo a ser mais consolidado, começam a olhar para Portugal enquanto destino. Portugal passa a ser interessante enquanto destino de imobiliário porque apresenta potencial de rentabilidade bastante interessante e, uma parte dela, vem através da exploração turística. Por isso é que temos aqui estes dois fatores – o imobiliário e o turismo -, um permite alavancar o outro.

Quanto ao calendário?

É continuarmos a trabalhar a este ritmo ou, eventualmente, acelerar. Nos últimos anos temos tido um enorme benefício por sermos a capital que acolhe as principais conferências dedicadas ao luxo. Tivemos, há 15 dias, a conferência de Luxo da Condé Nast, que tem uma série de publicações e cuja a ideia era discutir a linguagem do luxo.

Como se define o luxo

Uma das partes interessantes da conferência, além dos próprios conteúdos, foi o foco que deram a Portugal, não só como recetor de investimento, mas também como produtor e fornecedor de marcas de luxo e de empresas. Houve uma enorme capacitação e comunicação de Portugal enquanto destino. Teve um efeito muito positivo. Nós ainda não o sentimos, mas tem depois repercussões em todas as publicações da própria Condé Nast, a nível internacional. São exemplos destes, que trabalham a imagem de Portugal junto aos estrangeiros e junto aos investidores internacionais, que nos trazem efeitos concretos a prazo.

Saindo da macroeconomia e entrando na microeconomia, sabemos que Portugal é produtor de marcas de tão grande prestígio como a Dior e a Cartier. Mas, como é que as marcas portuguesas podem apanhar o comboio do luxo?

Isso é a pergunta one million dolar, mais uma vez. As condições e as varáveis de base são as mesmas: a autenticidade e o facto de sermos únicos enquanto oferta. Como é que as marcas podem fazer isso? Podem trabalhar setores e segmentos únicos, em termos de nicho. Temos um know how enorme e reconhecido internacionalmente, quer na área do têxtil, quer na do calçado. A diferença é entre trabalhar bem e a tempo. A criação de uma marca de luxo reconhecida a nível internacional demora tempo. Não é por nada que as grandes marcas são centenárias. É um processo que demora, que exige um grau de investimento e que, sobretudo, exige uma consistência em termos do produto e do serviço que é disponibilizado aos clientes. Por isso, para apanharmos esta boleia, temos que observar o que as internacionais fazem, aprender com elas e definir estratégias focadas na autenticidade do produto: seja ele sapatos, têxtil ou joalharia – em que também temos uma força muito grande – e continuar a apostar com força e convicção na qualidade do trabalho que é feito.

Mas para além do trabalho que é feito, que é reconhecido e, aliás, nós, no Delas.pt, acompanhámos as conferências e entrevistamos a anfitriã Susy Menkes. Ela falava-nos justamente da impressão positiva que lhe tinha causado o trabalho da Filigrana. Mas temos um problema de comunicação que é reconhecido interna e externamente. Ou seja, como é que um produto, que é trabalhado manualmente, com uma técnica que tem pelo menos 500 anos, que vem da Idade Média, que é transmitido de geração em geração e que, depois, continua a ser tão pouco valorizado?

A parte importante é perceber: temos estas caraterísticas que definem um produto de luxo. Começámos a nossa conversa pela pergunta “o que é o luxo?”, e acabou de responder. O luxo tem as características todas e o exemplo da Filigrana não podia ser mais adequado. Tem a qualidade, absolutamente, extraordinária em termos da produção da própria peça. Tem a tradição associada aos 500 anos de uma técnica de produção extraordinária e, depois, tem a exclusividade de cada peça, por ser única. Para além disso, acrescentava o facto de ser um “made in Portugal”, que é um valor acrescentado hoje em dia. Conceitos que se transmitem com estratégias de Marketing e, entrando na microeconomia, com o Marketing digital. Esta é uma das áreas em que é possível desenvolver uma estratégia eficaz, porque tudo o que implique usar aplicações de vídeo e contar histórias são peças fundamentais dentro do luxo, que permitem criar uma marca. Temos, exatamente, de contar a história de uma forma consistente e de uma qualidade ímpar. Hoje em dia, com as redes sociais, é permitido difundir essa história de uma forma eficaz e com investimentos relativamente pequenos. É preciso apostar forte na comunicação.

“Tudo o que implique usar aplicações de vídeo e contar histórias são peças fundamentais dentro do luxo, que permitem criar uma marca”

Fazer uma marca de luxo é muito diferente de fazer uma marca de massas?

É muito diferente, sem dúvida. A qualidade não pode ser questão, tem que estar totalmente resolvida numa marca de luxo. Depois há a questão da exclusividade, que se prende com a definição dos canais de distribuição.

Como assim?

‘Vamos vender online?’, ‘Vamos vender offline?’, ‘Como é que vendemos?’, ‘Em lojas monomarca?’, ‘Multimarcas?’, ‘Como é que fazemos a ligação entre os vários canais?’. Por fim, temos a questão da autenticidade ou da história, ou da tradição associada a esse mesmo produto. Estas seriam as três características que eu apontava como fundamentais e que, no caso das marcas para as massas, são menos relevantes. Há outros pontos mais importantes, tais como o preço. No caso do luxo, o produto ou o serviço – e aqui falamos das duas vertentes – tem de ter, pelo menos, estas três características totalmente resolvidas e de uma forma consistente. Por isso é que demora tempo.

Imagem de destaque: Facebook

Tecnologia e sustentabilidade são os pilares do novo luxo