Acórdão polémico sobre mulher adúltera pode chegar ao Parlamento

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Só no final da semana é que poderá ser conhecido o texto conjunto, mas a UMAR – União de Mulheres Alternativa e Resposta anuncia ao Delas.pt que vai apresentar queixa ao Conselho Superior de Magistratura (CSM). Uma posição que surge depois daquele órgão ter afirmado esta segunda-feira, 23 de outubro, que não vai intervir (posição que pode ler aqui) relativamente ao acórdão polémico do Tribunal de Relação do Porto que justifica o uso à violência doméstica por se estar perante uma mulher adúltera.


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A UMAR pondera também ir mais além do que esta queixa. “Apesar de o CSM já ter dito que não intervém na matéria, as organizações sentem que essa é uma posição de força que deve, mesmo assim, ser tomada”, afirma a presidente da UMAR, Elisabete Brasil, que prossegue: “para lá da queixa, poderemos ainda vir a propor alterações noutro sentido e aí teremos de nos dirigir à Assembleia da República, a quem compete legislar, no sentido de ver alargadas o âmbito de ação do próprio CSM”.

Aquela associação não irá, contudo, fazê-la sozinha. “Estamos a preparar uma ação conjunta com a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres, a Associação de Mulheres contra a Violência, a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima e possivelmente outras, mas ainda estamos em conversas”, afirma ao Delas.pt. O final da semana é agora o horizonte para concluir este processo.


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Isto porque já não é a primeira vez que surgem queixas desta natureza junto à CSM que acabam numa não intervenção. “O CSM diz que só age perante uma violação dos deveres profissionais ou de norma deontológica, alegando que se trata de posições que cabem no exercício independente de cada pessoa”. Certo é que “se o CSM responde sistematicamente o mesmo face a acórdãos da mesma natureza por não poder ir mais além. Então, teremos de pensar como se pode ir mais além”, afirma a mesma responsável.

Juiz é “manifestamente incapaz de julgar casos desta natureza”, diz APAV

Confirmando que participa dos esforços conjuntos, a APAV afirmou, em comunicado enviado às redações, que se “associa a uma iniciativa conjunta de várias organizações junto do Conselho Superior da Magistratura”. Em causa está o “exercício da função jurisdicional por um órgão de soberania do Estado, o que reveste esta situação de extrema gravidade”.

A associação lembra que “o Senhor Juiz Desembargador Neto de Moura, Relator deste processo, é reincidente na utilização deste tipo de fundamentação”, considera a associação que o magistrado se tornou “manifestamente incapaz de julgar casos desta natureza”.

Recorde-se, aliás, que em junho de 2016, o juiz desembargador Joaquim Neto de Moura tinha criticado, numa decisão judicial, uma mulher com comportamento adúltero como “uma pessoa falsa, hipócrita, desonesta, desleal, fútil, imoral”. Na ocasião, revela ainda a revista Sábado, o magistrado tinha anulado uma sentença de prisão em pena suspensa por violência doméstica agravada.

Na mesma nota agora enviada à comunicação social, a APAV considera que “se trata de uma infeliz exceção (embora não única)”, crendo que “a esmagadora maioria dos magistrados portugueses não se revê nesta iniquidade”. Porém, vinca também que “a decisão do Tribunal da Relação do Porto” pode ser “um claro e preocupante sinal do muito que ainda há por fazer nesta matéria, quer junto dos operadores do sistema de justiça quer, em geral, na sociedade portuguesa”.

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