Guia para compreender a adolescência

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Se este título a interessou talvez tenha um adolescente em casa. Eventualmente sente que os dias em que ele era criança e olhava para si com admiração e ternura, pedindo colo, abraços e miminhos chegaram ao fim. Certamente tem algumas dúvidas sobre o que o seu filho está a passar e como o pode acompanhar, já que sente que não sabe lidar com a pessoa que tem agora diante de si.
Propomos-lhe um pequeno desafio. Antes de continuar a ler, feche os olhos, recue no tempo e imagine-se novamente adolescente. Pense um pouco, dê-se tempo para sentir… que palavras lhe vêm à cabeça para descrever essa fase da sua vida? Curiosidade, descoberta, liberdade, rebeldia, incompreensão, solidão, insegurança são algumas das palavras que lhe podem ter vindo à memória, verdade?
Cada adolescente vive esta fase de uma maneira própria, mas há algo que é comum a todos: a mudança. Ao contrário das outras fases do desenvolvimento, na adolescência verificam-se mudanças a todos os níveis, em simultâneo, deixando o adolescente surpreendido, receoso, perdido, curioso.

O corpo
É no corpo que se constatam os primeiros sinais da incrível mudança que é deixar de ser criança e tornar-se adulto. As alterações hormonais e físicas tornam evidente que o corpo se está a transformar, quase de dia para dia. Os órgãos sexuais desenvolvem-se, com as primeiras ereções nos rapazes e o crescimento do peito nas raparigas, crescem os pelos, alarga-se o corpo, muda a voz.
Estas mudanças – que muitas vezes trazem algum desconforto e até dor – podem ser assustadoras e deixar o adolescente numa situação de enorme vulnerabilidade, por sentir que não tem nenhum controlo sobre o que se está a passar no seu corpo. Por vezes são também incompreensíveis, porque a maturidade emocional é ainda a de uma criança, e nem sempre os amigos têm os mesmos “sintomas”.

O pensamento
O cérebro de um adolescente é um turbilhão. No início, as transmissões sináticas entre neurónios aumentam exponencialmente, até chegar a uma fase em que algumas se perdem e outras (as mais utilizadas) são reforçadas.
É nesta fase que se ganha acesso ao pensamento abstrato e à capacidade hipotético-dedutiva, que permite colocar, pela primeira vez, cenários infinitos.
É agora possível pensar de forma muito mais abrangente e abstrata, e surge o interesse pelo fascinante mundo da espiritualidade e da religião, da ética e da moral.
O futuro torna-se algo real, que pode ser pensado e que depende das ações e decisões do presente.

A autoimagem
As enormes mudanças físicas e a nova capacidade de pensar alteram a forma como o adolescente se vê a si próprio e obrigam à construção de uma nova imagem de si, na dupla vertente física e mental.
A autoimagem que vai construindo de si vai basear-se nas experiências que teve ao longo da infância, reforçadas ou não pelas que agora atravessa, e será determinante nas decisões que vai tomar e na forma como conduzirá a sua vida. Acreditará nas características que vê e sente em si de tal forma que as suas ações serão condicionadas por esta crença.
A autoimagem construída na adolescência, mesmo que baseada em crenças que não são reais, perdurará no adulto e será um traço muito importante da sua personalidade. Poderá, por isso, impulsioná-lo a aceitar desafios que lhe trarão sucesso e felicidade ou, ao invés, levá-lo a evitar situações para as quais não se sente apto, impedindo-o de desenvolver o seu potencial e alcançar objetivos e sonhos.

Os relacionamentos
A menina ou o menino sorridente, que adorava programas em família, que olhava embevecido para os pais e que choramingava de saudades quando estava longe deles desaparece. Por vezes de forma gradual e anunciada, outras de um dia para o outro, frequentemente com avanços e retrocessos.
No seu lugar, surge um jovem que olha os pais com alguma desconfiança e sobranceria, quais “velhos” que nada entendem. Em algumas famílias surgem conflitos e desentendimentos mais acesos, enquanto noutras há apenas um aparente esfriar das relações, mas em todas há um afastamento das figuras parentais, de que o adolescente precisa para se afirmar como um ser diferenciado deles, com convicções próprias.
O grupo de amigos vai agora adquirir mais importância e passar a ser o suporte do adolescente. Os amigos são os companheiros, os confidentes, ocupam um lugar de destaque na vida do adolescente.
A vida amorosa e sexual inicia-se neste período, marcado pelas paixões assolapadas e pelas novas experiências que, para os adultos, podem parecer exageradas, mas que têm para o jovem uma importância vital.

Os sentimentos
A amplitude e a rapidez das mudanças provocam um turbilhão de sentimentos.
A adolescência é por excelência um período de enorme curiosidade, alegria, experimentação e prazer, mas também de dúvidas e angústias, muitas vezes em simultâneo.
Tal como os pais, também o adolescente tem que se despedir da criança que foi (do seu corpo, dos seus interesses, da sua ingenuidade), e fazer o luto da infância que
não voltará a viver. Sentimentos de raiva e tristeza poderão surgir, sem que o adolescente tenha consciência do que significam e sem saber como os pode regular.
As aquisições da adolescência são feitas com avanços e retrocessos, numa instabilidade que pode ser tão imediata que se torna assustadora e muito difícil de gerir. O adolescente tem dificuldade em se compreender a si próprio; como poderá sentir que alguém o pode compreender?
Todo o crescimento implica mudança, novas aquisições, períodos de maior dificuldade. Mas, então, porque é a adolescência um período tão especial? Porque muda tudo. Como sou, quem sou, do que gosto, para onde vou, são questões que surgem e para as quais é urgente encontrar respostas. A adolescência é este caminho desconhecido e tumultuoso, com um destino incerto que se vai construindo a cada passo. Antes dela, existia uma criança, depois dela nascerá um adulto.
Para os pais, o (enorme) desafio será permanecer compreensivo, acolhedor, disponível, apesar das inquietações que podem estar a atravessar e das reações que veem nos seus filhos. Os adolescentes estão a viver um processo absolutamente fundamental para a construção da sua pessoa, e para isso têm que se afastar, mas há que ter confiança na sua reaproximação. Nessa altura, surgirá uma nova relação, agora entre adultos.