Sandra Oliveira é a única doula certificada, em Portugal, pela DONA internacional. Conselheira de aleitamento materno, pela Organização Mundial de Saúde e pela Unicef, e autora do livro ‘Nascer Saudável’ (editado pela Chá das Cinco) não tem dúvidas de que o apoio entre mães é fundamental para uma amamentação mais tranquila e bem-sucedida.
Por isso, chama a atenção para o facto de em Portugal essa realidade estar pouco implementada nas políticas de saúde materna, destacando a falta de formações conjuntas para mães e profissionais de saúde que permitam fomentar a criação de grupos onde as mulheres partilhem experiências e se apoiem mutuamente após o parto.
“O que nós temos de fundamentos científicos é que para que uma boa percentagem de mulheres saia a dar de mamar dos hospitais é importante que os profissionais estejam formados e que existam hospitais certificados amigos dos bebés, mas para que essa amamentação tenha continuidade o apoio de mãe para mãe é fundamental”, afirma ao Delas.pt
Sandra Oliveira foi das primeiras pessoas em Portugal a fazer a formação de conselheira de aleitamento materno, há 12 anos.
A doula lembra que os hospitais amigos do bebé – unidades que aderiram à campanha da OMS e da Unicef para incentivar as práticas de aleitamento materno e que, em 2016, eram 14 em Portugal – têm de seguir 10 passos para integrarem essa categoria. O décimo passo consiste em promover a criação de grupos de apoio ao aleitamento materno e encaminhar as mães para eles, depois de deixarem as maternidades.
“Para esse décimo passo existir, previa-se – e penso que ainda se mantém assim – que, cada vez que houvesse formação nos hospitais para profissionais, 10% das vagas fossem ocupadas com mães, para que o apoio, de igual para igual mas com conhecimento, nunca se perdesse”, afirma a conselheira.
Por outro lado, refere que, ao contrário do que é recomendado, quando havia formações estas não eram feitas em conjunto com os profissionais.
Maria João Martins, enfermeira da Unidade de Cuidados na Comunidade, do Agrupamento de Centros de Saúde de Lisboa Ocidental, explica ao Delas.pt que, na preparação que é dada às grávidas nas unidades públicas, “todas as que dão formação têm em conta fomentar, no grupo de mulheres em causa, o ambiente de partilha”.
Reconhece, porém, que “nem sempre o SNS cria grupos de continuidade” e concorda que “essa é uma parte importante no apoio à amamentação e são habitualmente as mulheres, através das redes sociais, que acabam por se agrupar”.
“O que tem acontecido é que nos cursos de preparação para o parto surge um grupo que continua a partilhar experiências tanto relativamente à própria maternidade em si, como à amamentação”.
Mesmo assim, diz, essa partilha não descarta um apoio essencial, numa fase crucial, aquela em que as mulheres regressam a casa. É nessa altura que surgem as maiores dificuldades, com dúvidas e desorientação, por muita formação que tenham tido.
“O que nós no SNS, através das unidades de cuidado na comunidade, fazemos é, não só ter abertura para que elas venham ter connosco, independentemente de terem as suas próprias unidades e enfermeiros de referência.” Uma palavra de ajuda, até através do apoio telefónico, também pode ajudar as recém-mamãs a corrigir o que for necessário ou, simplesmente, a sentirem-se menos inseguras em relação aos procedimentos.
“Independentemente de tudo isso, é necessário uma disponibilidade enorme, que deverá responder a qualquer dia e em qualquer hora, e que permita que os profissionais – e na minha unidade nós fazemos isso – possam fazer domicílios”.
Uma valência que todas as unidades de cuidados na comunidade – equipas que atuam, entre outras, nas áreas da saúde materna, nas Unidades de Saúde Familiar (antigos Centros de Saúde) – deverão, à partida, possuir.
Apesar das dificuldades na gestão dos recursos humanos que muitas vezes podem surgir e impedir o desenvolvimento e alargamento de projetos nesta área, Maria João Martins salienta que os profissionais estão cada vez mais focados nesta matéria e que há cada vez “mais unidades amigas dos bebés, tanto a nível hospitalar, como unidades de saúde familiares e, desde 2016, o Agrupamento de Centros de Saúde de Lisboa Ocidental e Oeiras, constituiu o primeiro ACES amigo dos bebés, como agrupamento de unidades que trabalham com este foco”.
Mas se os grupos de mães não substituem o acompanhamento profissional, este dificilmente colmata a experiência, empatia e compaixão que, segundo Sandra Oliveira, explicam os bons resultados dos primeiros. “Há um reconhecimento entre pares e há uma informalidade, um despir de barreiras que, por norma, temos entre profissional de saúde e utente”, conclui.