António Variações: 35 anos de ausência não apagam o génio

Um concerto de homenagem e um (muito aguardado) filme biográfico marcam o ano em que se assinala o 35º. aniversário da morte de António Variações (e 75 do seu nascimento). António Joaquim Rodrigues Ribeiro, de seu nome verdadeiro, nasceu em Braga a 3 de dezembro de 1944 e morreu em Lisboa no dia em que a cidade celebra o feriado de festejos a Santo António, 13 de junho, e no ano de 1984. Anos antes, viveu e andou pelo mundo, traçando um eixo de expansão “entre Braga e Nova Iorque” que serviria de síntese à sua biografia e aos estilos que juntou na sua música. Composições pop, moderna, com cunho distintivamente português, fado na voz, Amália na admiração e uma teia improvável onde teceu, de forma bem sucedida, folclore com pop, rock e eletrónica. A tudo isso somou, como poucos, letras certeiras e apuradas na escrita, ainda que se tenha ficado durante um tempo somente com a quarta classe, para começar a trabalhar, como marçano, em Lisboa, na transição da infância para a adolescência. Natural de Fiscal, freguesia do concelho de Amares e oriundo de uma família pobre, sendo um entre 11 irmãos, foi para a capital apenas com 12 anos. Só mais tarde viria a retomar os estudos, à noite, enquanto trabalhava. “O António fez-se a si próprio, em termos culturais”, diria, citada pela Blitz, Manuela Gonzaga, autora de ‘António Variações, Entre Braga e Nova Iorque’ (Bertrand Editora), a única biografia, publicada em Portugal, sobre o cantor.

Tinha 40 anos e uma curta mas fulgurante carreira musical quando morreu. Percurso que deixaria um legado de influências na geração vindoura de artistas, sem substitutos que, contudo, se impusessem ao lugar de destaque que ainda hoje ocupa na história musical portuguesa.

 

Além de músico, António Variações trabalhou como cabeleireiro. A sua imagem era tão iconográfica e impactante como as suas canções [DR]

‘Canção do Engate’, ‘É P’ra Amanhã’ ou ‘O Corpo é Que Paga’ são apenas alguns dos hinos que continuam a ser lembrados, reinterpretados e descobertos – em boa parte graças às novas plataformas. Há quem o compare a artistas atuais e internacionais, porque desfia o novelo ao contrário e conhece a partir do presente, para o passado, há quem o descubra do lado de lá do oceano e quem revele a existência de culto à sua figura, simbolismo e música, em paragens e alfabetos longínquos. “Todos os gays na Argélia o conhecem e tentam aprender português para entender o que ele canta”, escreve alguém no Youtube, nos comentários ao trailer do filme ‘Variações’. Tem estreia marcada para 22 de agosto, realização de João Maia e interpretação de Sérgio Praia no papel de António Variações, que, nos anos 1980, foi sobretudo mais conhecido – e maltratado – por ser homossexual e ter uma imagem excêntrica do que propriamente pelas qualidades musicais agora consensualmente reconhecidas.

 

Para este renovado interesse na sua obra terão contribuído em muitos os músicos da nova geração, em particular projetos como os ‘Humanos’ (2004), que revisitaram temas menos conhecidos do seu repertório e lhes deram uma roupagem contemporânea, reavivando a memória daqueles que conheceram o autor original e atraindo os que o ouviam, dessa forma, pela primeira vez.

Sucederam-se reedições da música de Variações, livros sobre a sua vida e espetáculos de homenagem a cada data redonda, como o concerto da edição de 2014 do Rock In Rio Lisboa, comemorativo dos 70 anos do seu nascimento. Este ano, a autarquia lisboeta preparou também uma homenagem ao cantor, músico e compositor da banda sonora da vida de tanta gente. O espetáculo, gratuito, que acontece nos jardins da Torre de Belém a 29 de junho (às 22h), encerra as Festas de Lisboa e contará com a participação de vários cantores, como Ana Bacalhau, Conan Osíris, Lena D’Água, Manuela Azevedo, Paulo Bragança e Selma Uamusse, que se juntarão à Orquestra Metropolitana para reinterpretar alguns dos temas mais populares de António Variações.

Antes disso, já amanhã, quando passam os 35 anos da sua morte, a Feira do Livro de Lisboa assinala a data com o relançamento do livro de Manuela Gonzaga, ‘António Variações: Entre Braga e Nova Iorque’, num evento que terá alguns convidados especiais, entre os quais a cantora Lena d’Água, que interpretará algumas canções de Variações. O lançamento está marcado para as 19h, no Auditório da APEL.