Argentina aprova lei que permite aborto até à 14ª semana de gravidez

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[Fotografia: Istock]

O Senado da Argentina aprovou durante a madrugada de quarta-feira, 30 de dezembro, um projeto-lei que permite às mulheres acederem livremente ao aborto até à 14.ª semana de gestação, uma medida exigida há muito tempo por grupos feministas.

O texto do projeto-lei apresentado pelo Governo, que já tinha sido aprovado pelos deputados no passado dia 11 de setembro recebeu os votos a favor de 38 senadores, 29 votos contra e uma abstenção, após uma sessão que se prolongou durante 12 horas.

O projeto-lei representa uma forte mudança em relação à atual situação em que só era permitida a interrupção voluntária da gravidez se a mulher tivesse sido vítima de violação ou estivesse em perigo de vida.

O texto autoriza, igualmente, a objeção de consciência a todos os profissionais de saúde que o manifestem, mas exige que atuem com rapidez na procura de médicos que levem a cabo a interrupção voluntária da gravidez.

Com esta aprovação, a Argentina soma-se a uma pequena lista de lugares onde o aborto é legal na América Latina: Uruguai, Guiana, Cuba e cidade do México.

Do lado de fora do Congresso, em Buenos Aires, milhares de pessoas favoráveis e contrárias ao aborto mantiveram-se em vigília ao longo das 12 horas de intenso debate.

Assim que os ecrãs gigantes anunciaram a vitória da legalização, as “verdes”, cor da luta pelo aborto legal, explodiram num grito de vitória seguido de lágrimas e danças de felicidade, enquanto as “azuis”, cor dos movimentos pró-vida, retiraram-se derrotadas.

“A luta agora será pela implementação da lei sem restrições. Ganhamos uma batalha crucial para lutarmos agora pela educação sexual, pela igualdade de géneros e contra os feminicídios”, vibrou Juliana Cabrera, 33 anos.

“A luta vai continuar porque há muitas coisas na agenda. Há muita desigualdade de género. Vemos isso através dos feminicídios. Estamos cansados de que o Estado seja cúmplice desses assassinatos. Portanto, a luta nunca vai terminar”, garantiu a militante Ariadna Pardo Berríos, 18 anos.

Os movimentos feministas esperam agora que a Argentina seja fonte de inspiração para os países vizinhos, especialmente para o Chile, que vai redigir uma nova Constituição a partir do ano que vem.

Na América Latina, apenas o Uruguai, a Guiana, Cuba e a cidade do México permitem o aborto. São países pequenos com situações isoladas. Com a Argentina, referência regional na luta feminista, o aborto ganha uma projeção inédita.

Do outro lado, os contrários ao aborto avaliam recorrer à Justiça. Afirmam que a lei é inconstitucional porque a Constituição argentina define os direitos de uma pessoa a partir da própria conceção.

O Conselho de Advogados de Buenos Aires avaliou que a legalização do aborto “não supera o teste constitucional”.

“O direito argentino determina claramente a existência da pessoa humana a partir do momento da conceção”, diz o Conselho em nota, detalhando todos os artigos que sustentam a afirmação.

As sondagens de opinião pública indicam que a maioria dos argentinos é contra o aborto. Na Argentina, a atual lei de 1921 só permite o aborto em caso de violação ou em casos nos quais a mãe corre risco de vida.