As jóias de filigrana contemporânea de Liliana Guerreiro

Liliana Guerreiro
Liliana Guerreiro, designer de joias há 14, dedica-se a reinterpretar a filigrana tradicional portuguesa. ( Fábio Poço / Global Imagens )

As jóias de Liliana Guerreiro já estiveram expostas no Museu de Design de Nova Iorque. São de filigrana, mas não parecem antigas. E podem ser compradas nas melhores ourivesarias.

Quando era pequena, Liliana Guerreiro gostava de vir a ser uma mulher carregada de jóias, imersa nelas. Já nessa altura a mãe apanhava-a a desmontar as que lhe ofereciam e outras que apanhava a jeito em casa para lhes acrescentar elementos. Na adolescência, gastava nisso todo o seu dinheiro. «Esta foi uma paixão que começou muito cedo, comigo a colar búzios nas peças de prata da minha mãe e da minha avó com Super Cola 3. Sempre gostei de usar joias e, principalmente, de alterá-las», diz.

Hoje, aos 40 anos, Liliana é especialista a reinventar a filigrana tradicional portuguesa e a primeira joalheira do país a ter exposto no Museu de Arte e Design de Nova Iorque, um evento que anualmente divulga 50 designers contemporâneos de todo o mundo. Foi uma das quatro selecionadas para vender as suas joias na loja do museu.

Liliana começou a gostar de filigrana no Minho, onde nasceu. Agarrou nas técnicas tradicionais e fez peças modernas.

Quando sai de casa, Liliana leva sempre umas joias dela, sobretudo anéis grandes. Ser natural de Viana do Castelo, o lugar das festas e da filigrana teve também o seu papel nesta história. Adorava a perfeição dos corações de Viana, a força das mulheres da sua terra carregadas de ouro. Conheceu a oficina dos mestres ourives Joaquim e Guilherme Rodrigues, na Póvoa de Lanhoso, há dez anos, numa visita de estudo.

Fez parte de um projeto chamado Leveza: Reanimar a Filigrana, com a Escola Superior de Artes e Design (ESAD) de Matosinhos e o Museu do Ouro de Travassos com o objetivo de para reinterpretar a filigrana nacional. “Continuo a ir ter com eles uma vez por semana, para pesquisar e trabalhar. Fazem aquilo tão bem que eu desenho, experimento, monto os protótipos, e eles repetem as peças e aplicam a técnica de soldadura.”  Confia totalmente no trabalho deles.

Liliana estudou em Lisboa design de interiores, na Escola Superior de Artes Decorativas da Fundação Ricardo Espírito Santo. Andava infeliz, a repensar a vida, quando uma amiga lhe mostrou as oficinas da ESAD de Matosinhos e ela soube que podia ser joalheira profissional. Depois aprofundou a formação especializada no Centro de Joalharia do Porto. Venceu o Concurso de Artesanato Tradicional da Feira Internacional de Lisboa, no seguinte ganhou o Concurso de Arte Contemporânea da FIA e o primeiro Concurso Internacional de Filigrana (na Póvoa de Lanhoso).

“A frase do Picasso que diz que a inspiração existe, mas de que nos encontra trabalhando é perfeita para descrever o meu caso”, diz. Ela estudou um relicário do século XIX – uma das peças mais trabalhadas e emblemáticas da filigrana tradicional. E foi com base nesses elementos que chegou às suas coleções Bocais, Fio, Cheio de Ramo, Estrutura ou Malha (a sua preferida). “Os nomes muito técnicos são os utilizados pelos ourives e representam os vários elementos e enchimentos que subtraí do relicário”.

“Toda a gente fica curiosa com a leveza e a simplicidade das peças. Quando explico serem feitas à mão com base numa técnica ancestral, os clientes ficam ainda mais interessados”, conta Liliana. A reação é ainda mais reconfortante nos países onde também há tradição em filigrana, como o Chile, a Colômbia ou Israel. “As jóias são muitas vezes usadas como símbolo de estatuto, eu prefiro vê-las como um prolongamento da personalidade e do corpo de quem as usa”, diz. Para ela, pelo menos, têm sido o maior talismã.