Balenciaga: quando as bainhas são os melhores bastidores do espetáculo Moda

Se for a Londres em férias não perca a exposição temporária no Victoria & Albert Museum dedicada ao génio do costureiro Balenciaga. Mas não precisa de ir já a correr: vai estar em mostra até fevereiro do ano que vem.

Chama-se Shaping Fashion e faz todo o sentido: mais do que costureiro, Cristóbal Balenciaga era um escultor de formas, que por serem em têxtil, fizeram dele o maior dos engenheiros/artistas/costureiros entre os seus pares. Desde sempre.

Eu sou um rapaz, mas nestas alturas assumo que dá vontade de ser rapariga. Vestir Balenciaga deve ser a mesma coisa que vestir Caravaggio, Canovas ou Bach. Sei que é fácil desenhar o próximo fashion-boom e também sei que difícil é concretizá-lo: um verdadeiro costureiro não delega a construção das suas peças, assume-as, e quanto mais o fizer, em todas as linhas do processo e até ao seu fim, melhor o resultado final: é quando uma roupa deixa de o ser, passando a ser couture, arte de vestir.

Balenciaga é o que é porque tinha a ideia, rabiscava-a, cortava-a e montava-a, engenhando-a para ser aquilo que tinha na cabeça. Ou seja, tinha na mão todo o processo criativo, como um artista. O seu up-grade em relação ao artista ‘comum’ é que as coisas de Balenciaga vestiam-se, não iam para a parede ou para cima de uma coluna.

E agora aquilo que é a mais-valia que melhor distingue esta exposição: os ‘truques’ do artista estão aqui radiografados, mesmo com radiografias – não há aqui eufemismo – que nos mostram que pesos de chumbo, que escusa de bainhas, que trabalho de bastidores e avessos que não aparecem são tão cruciais: junto de cada modelo mais fascinante na sua construção, a curadoria da exposição implementou estas radiografias que desvendam o mistério do edifício de cada obra.

O primeiro piso da exposição (são dois apenas e a subida para o segundo, por si, vale muito a pena!) é um percurso de Balenciaga abrangente e ao tema: as casas de costura, a maestria da construção, as clientes famosas, as peças icónicas, os chapéus que eram metade do look, os sapatos, os esquissos, os moldes, as indicações para as linhas de montagem.

Do andar de baixo, escuro, propositadamente serôdio e intimista, passa-se ao superior, por uma escada branca e iluminada, com balaustrada, como as dos grandes salões do meio do século passado por onde as meninas desciam com uma placa com o número do modelo.

No andar de cima, iluminado a branco e ao gosto de agora, estão as criações, assumidas ou par hasard , de todos os grandes da moda homenageando Balenciaga, nas formas, na construção e na ousadia. Desde clássicos como de la Renta até aos fresquíssimos como Gareth Pugh, todos confessam em tecido uma admiração que permanece desde sempre e afeta, no melhor sentido, os criadores de agora e os da altura.

Balenciaga, a ter que ser definido, foi costureiro, engenheiro e visionário. Em 1968 anunciou que fecharia a loja, literalmente, pela simples razão porque não havia mais nada de novo para criar. E não havia realmente. Exceto nas mais recentes incursões da impressão 3D (mais belas e inusitadas pelo método do que pelo génio do indivíduo), de lá para cá, nada mais de novo ou de relevante se fez na moda. Moda feita assim desta maneira, comprometida, assumida, engenhada e manufaturada, como deveria ser sempre afinal.

Não é uma questão de bota-elasticismo, é como as coisas são. Couture é isto, o que não é, não é.


No segundo piso da exposição, o das homenagens, são projetadas as opiniões dos pares de Balenciaga, os de sempre e os de agora:

“Balenciaga é o único designer que ousa fazer o que quer.”

Elsa Schiaparelli

“Num tempo em tudo era aprimorado, apropriado e bonitinho, as coisas dele eram de uma escala quase obscena.”

Molly Goddard

“Balenciaga é o criador no verdadeiro sentido da palavra. Apenas ele consegue cortar, montar e coser uma sua criação pela própria mão. Todos os outros são apenas desenhadores de modelos.”

Coco Chanel

“Trabalhar os tecidos de forma a deixá-los informar-te do que fazer a seguir é um método verdadeiramente moderno.”

Gareth Pugh

“O Mestre de todos nós.”

Christian Dior

“Não penso que a Bíblia me tenha ensinado tanto quanto Balenciaga.”

Givenchy

 

P.S: se for ver esta exposição com uma companhia que não esteja virada para as modas, com sorte ela estará virada para os Pink Floyd; mesmo ao lado do Balenciaga está a exposição “Pink Floyd: Their Mortal Remains” . É também uma mostra imperdível, super bem estruturada e produzida e pode ser vista até 1 de outubro.