Barrigas de Aluguer chumbadas de novo, associação pede novas iniciativas no pós-eleições

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O Tribunal Constitucional declarou inconstitucional duas normas de alteração à lei da procriação medicamente assistida, após um pedido de fiscalização preventiva suscitado pelo Presidente da República.

Os fundamentos do acórdão, conhecido na quarta-feira, 18 de setembro, foram lidos à comunicação social no Palácio Ratton, sede do TC, em Lisboa. “Ao abrigo do artigo 278.º da Constituição da República Portuguesa, o TC pronuncia-se pela inconstitucionalidade das referidas normas por violação do direito ao desenvolvimento da personalidade da gestante, interpretado de acordo com o princípio da dignidade da pessoa humana, e do direito de constituir família, em consequência de uma restrição excessiva dos mesmos”, leu a juíza relatora do TC, Joana Costa.

Na decisão, votou vencido o conselheiro Cláudio Monteiro, apresentaram declaração de voto as conselheiras Mariana Canotilho e Fátima Mata Mouros, e apresentaram uma declaração de voto conjunta os conselheiros Gonçalo de Almeida Ribeiro, Fernando Vaz Ventura, Joana Fernandes Costa e Luis Rodrigues Ribeiro.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, requereu a 26 de agosto ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva do diploma sobre procriação medicamente assistida.

Na altura, Marcelo Rebelo de Sousa relembrou que “o regime anteriormente aprovado foi declarado inconstitucional” por um acórdão do TC de 24 abril de 2018.

“O entendimento que fez vencimento no Tribunal foi o da inconstitucionalidade do regime, na parte em que não admite a revogação do consentimento da gestante de substituição até à entrega da criança aos ‘beneficiários’, por violação do direito daquela ao desenvolvimento da personalidade, interpretado de acordo com o princípio da dignidade da pessoa humana, e do direito de constituir família, em consequência de uma restrição excessiva a estes direitos”, refere.

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Esta foi a primeira vez que o chefe de Estado enviou um diploma para o TC desde que tomou posse em 2016. O Presidente da República justificou o envio do diploma para o TC com a convicção de que a Assembleia da República votou contrariamente a uma anterior decisão deste tribunal.

“Tratava-se de uma lei aprovada um ano depois de uma decisão do TC que tinha declarado contra a Constituição várias normas de uma lei anterior, em rigor, aliás, de várias leis anteriores, e num ponto a Assembleia votou uma solução que, na minha perspetiva, entrava em choque com aquilo que o tribunal tinha dito em 2018”, declarou Marcelo Rebelo de Sousa aos jornalistas, em Lisboa.

Em 19 de julho, a Assembleia da República aprovou em votação final global a alteração ao regime jurídico da gestação de substituição, mas que não incluiu a revogabilidade do consentimento da gestante até ao nascimento da criança imposta pelo TC.

Associação pede que luta “não caia no esquecimento”

A Associação Portuguesa de Fertilidade (APF) espera que na próxima legislatura a lei da procriação medicamente assistida “não caia no esquecimento” e pede aos deputados que “façam o que lhes compete” garantindo o direito de todos a uma família.

Esperamos que os deputados eleitos façam aquilo que lhes compete, que é defender o direito e o acesso de todos os portugueses à constituição de família independentemente da sua situação clínica. Não se pretende que a gestação de substituição seja um negócio”, disse à Lusa a presidente da APF, Cláudia Vieira. “Iremos sensibilizar os partidos com assento parlamentar para a necessidade de deixarem de parte os seus preconceitos pessoais e que pensem de forma muito objetiva naquilo que está em causa. Não é a gestação de substituição propriamente dita, mas não adianta nada ela ser declarada constitucional se não existe uma lei que a suporte”, disse.

A esperança reside sobretudo no Bloco de Esquerda (BE) e Partido Socialista (PS), “que sempre se mostraram bastante alinhados com este assunto e interessados em o resolver”, esperando que “efetivamente retomem o assunto e que apresentem mais uma vez alternativas”.

“Os deputados limitaram-se a não fazer rigorosamente nada”, criticou Cláudia Vieira em relação às razões que suscitaram a declaração de inconstitucionalidade, frisando que a gestação de substituição não foi considerada inconstitucional e que falta apenas uma lei que a suporte e não obrigue casais com dificuldades em constituir família “a recorrer a países onde é legal ou ir por vias menos claras e menos seguras para todos os intervenientes”.

“É uma coisa que não gostaríamos que acontecesse, atendendo a que estas pessoas têm direito à constituição da sua família, é um direito que lhes assiste pela Constituição e sem este nó legislativo estar desembrulhado vão continuar a não poder ser pais biológicos no seu próprio país”, disse.

CB com Lusa

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