Barro negro de Bisalhães versão design

Artesanal, histórico e relevante, são as premissas que Daniel Pera, 31 anos e Renato Rio Costa, 26, encontraram no barro preto de Bisalhães – cujo processo de fabrico faz parte desde 29 de novembro de 2016 do Património Cultural Imaterial da UNESCO – e com ele partem em fevereiro para a Ambiente, em Frankfurt, no restrito grupo Talents, jovens talentos do design escolhidos a dedo pelo mundo.

Juntos formam o Bisarro, “um projeto sociocultural, ligado às raízes artesanais e criativas de Vila Real, num período em que as artes menores são cada vez mais valorizadas e ganham algum terreno no mercado. O Bisarro é um projeto sobre o barro preto de Bisalhães, sobre esta arte em particular e sobre os artesãos que a trabalham com as próprias mãos “, como nos conta a dupla.

Para saber mais falámos com eles, numa semana em que já embalavam as cerâmicas para rumar à Alemanha.

Como receberam a recente notícia do processo do barro preto inscrito no património da UNESCO?

Há bastante tempo que estávamos ansiosos à aguardar o dia da convenção da UNESCO na Etiópia. No dia do anúncio estávamos a acompanhar de perto o evento através da equipa da Câmara Municipal de Vila Real que estava presente. Recebemos a notícia através de um dos elementos da equipa e foi de facto a confirmação de que esta olaria tem algo de especial e que vale a pena salvaguardar esta tradição.

Como pensam que pesará esta decisão na existência da Bisarro?

A classificação da UNESCO foi sem dúvida muito importante para a região e principalmente para esta tradição. Para nós, foi a confirmação que estamos no caminho certo. Acreditamos que novas oportunidades e novos horizontes surgirão não só para a olaria como também para os oleiros. O Bisarro continuará a trabalhar para impulsionar esta arte e esta tradição, agora reconhecida mundialmente.

O facto de existirem hoje apenas meia dúzia de artesãos do barro preto não compromete a sua existência? O que pode fazer a Bisarro para não deixar morrer a arte?

O facto de existirem poucos oleiros a trabalhar esta tradição é um grande risco, por esta razão a olaria de barro preto de Bisalhães está em vias de extinção. Além de serem poucos oleiros estes não têm a quem passar a herança desta tradição.

Ao longo deste processo, desta aventura, tivemos a oportunidade de trabalhar com vários oleiros. Neste momento estamos a trabalhar com um oleiro mais novo, o Manuel Tapada, da nova geração de oleiros desta tradição. Atualmente, trabalhar com gerações mais novas tem sido uma excelente oportunidade para inovar e experimentar novas formas e técnicas de trabalhar esta tradição.

Paralelamente à nossa produção temos alguns planos para salvaguardar esta olaria. Desde a formação de novos oleiros à aproximação das Universidades e de jovens Designers a esta arte. Atualmente temos um protocolo com a UBI – Universidade da Beira Interior e estamos a trabalhar juntamente com alunos de mestrado. Tem sido uma excelente experiência e estamos a conseguir captar o interesse das camadas mais jovens para vertentes mais artesanais.

Quais as vossas expectativas para o Talents?

Sendo a Ambiente uma das maiores e principais feiras de bens de consumo as nossas expectativas são bastante elevadas. Conhecemos esta feira bastante bem, dado o nosso background ligado à cerâmica, e temos a noção do impacto e da visibilidade que a Ambiente pode dar ao Bisarro. Nesta edição de 2017 temos a oportunidade de expor o nosso projeto, os nossos produtos e, principalmente levar um pouco do nosso país e da nossa cultura além fronteiras, por esta razão não poderíamos estar mais orgulhosos e expectantes.

Como conseguiram resistir à vaga migratória de jovens talentos que assolou o nosso país?

Não negamos que o apelo à migração não foi uma possibilidade para qualquer um dos dois. O facto de estarmos empregados nos últimos anos foi um fator importante para esta vaga nos ter passado ao lado. Tivemos a sorte de estar a fazer o realmente gostamos, a cerâmica.

Já têm produção própria disponível para venda? Onde?

Estamos neste momento a terminar o nosso site onde poderão fazer pré-encomendas das nossas peças. Vamos iniciar a produção em escala no início do próximo ano, neste período começaremos a expedir as pré-encomendas registadas e daremos início a novas. Depois do lançamento online iremos ter as nossas peças à venda em vários pontos, não só em Portugal como também em alguns países a anunciar brevemente.

Para além do Bisalhães, têm alguma projeto futuro abarcando outro produto tradicional local?

Neste momento o nosso foco é o Bisarro, não temos outro projeto especificamente para outro produto tradicional. No entanto, estamos a trabalhar outros materiais nacionais na nossa coleção, como por exemplo a cortiça e a madeira. Nas próximas coleções vamos conciliar o barro preto de Bisalhães com outras artes tradicionais, igualmente Portuguesas.

À QUEIMA ROUPA

O que pediram ao Pai Natal?

Pedimos ao Pai Natal um excelente futuro para o Bisarro!

Porque gostam de trabalhar um com o outro?

As nossas competências são bastante complementares. Conhecemo-nos bastante bem, o que facilita o workflow.

Como é o vosso espaço de trabalho ideal?

O nosso espaço ideal neste momento é onde possamos estar os dois a trabalhar, a discutir ideias e especialmente onde nos sintamos bem.

Se abrissem uma vaga, quem gostariam que enviasse um currículo?

Considerando qualquer pessoa como elegível para esta questão, sem dúvida a Stephanie Hering ou a Mikaela Dorfel, dois grandes ídolos e referências do mundo na cerâmica.

Para cozinhar, louça de barro ou de silicone? Porquê?

Sem dúvida de louça. Não entrando em questões técnicas, que não dominamos. A cerâmica será sempre indissociável da cozinha e do ato de cozinhar, faz parte da nossa cultura e das nossas tradições.