Batom vermelho: sensualidade, atitude e o ataque “pouco informado” às mulheres

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[Fotografia: Pexels]

Tanto mulheres como homens encheram esta sexta-feira, 15 de janeiro, as redes sociais de fotografias de lábios pintados de vermelho, ao abrigo da #VermelhoemBelém. Tudo porque Marisa Matias, candidata às Presidenciais apoiada pelo Bloco de Esquerda, foi, entre argumentos políticos, apontada pelo líder e deputado único do Chega, André Ventura, de usar… batom vermelho.

Ela “não está muito bem em termos de imagem, com aquele batom vermelho, como se fosse uma coisa de brincar”, afirmou, ao quarto dia de campanha presidencial. Um comentário que levou rivais na corrida a Belém, como Ana Gomes, a publicar um vídeo onde surgia a pintar os lábios dessa cor.

Entre os agradecimentos que Marisa Matias foi dando a todos os que a apoiaram e tingiram as redes sociais de rouge, a candidata a Belém lembrou, nesta sexta-feira, 15 de janeiro, que o insulto que Ventura “fez às mulheres não diz nada sobre as mulheres, mas diz tudo sobre esse senhor”.

Do Antigo Egito ao pós-grandes guerras

“A história do tom vermelho nos lábios chega da Antiguidade Clássica, sendo que no Antigo Egito era usado por quem pertencia à elite e na Antiga Grécia era a escolha de mulheres que se prostituíam”, recorda a professora de Moda na Escola Superior de Artes Aplicadas de Castelo Branco (ESART) e IADE, Catarina Vasques Rito.

Já mais recentemente, no século XX, a democratização do uso de vermelho como componente da maquilhagem chegou por duas vias: pela autoestima e pelo cinema.

“O batom e o ou verniz vermelhos são das cores mais vendidas dos produtos de maquilhagem, principalmente nos momentos pós-Grande Guerra, quando o dinheiro escasseou para roupa e estes produtos se impuseram como forma de a mulher se sentir bonita e sensual em tempos de contenção”, refere a docente.

Mais tarde, prossegue Catarina Vasques Rito, “o vermelho instalou-se como a simbologia da sensualidade e da sofisticação associado à beleza e sensualidade da beleza e das atrizes de Hollywood e a década dourada”.

O “erro” de Ventura

Ao Jornal de Notícias, tanto a professora de moda como a maquilhada Inês Franco olham para a simbologia e a síntese é clara: Ventura falhou o alvo e a eficácia da mensagem. “O batom vermelho não é usado por qualquer pessoa, é usado por quem tem confiança, quem se sente bem consigo própria, é sinal de poder”, refere Inês Franco, responsável pela imagem de figuras públicas, entre elas a da apresentadora Cristina Ferreira.

Catarina Vasques Rito vai ainda mais longe: “Se a mensagem era chocar, insultar, ele comete logo um erro. O batom que Marisa está a usar não é um vermelho clássico, aberto e forte, chamado vermelho Valentino, mas um vermelho sangue de boi, ligeiramente mais escuro”. Isto no frente a frente que travou com ele, porque no debate com todos os candidatos, na RTP, “o baton era rosado”, lembra a professora.

Marisa Matias André Ventura
[Fotografia: DR]
A professora universitária crê mesmo que esta “boca populista e machista”, “inadmissível nos dias dias de hoje para uma mulher”, corre o risco de já não ser entendida pelos mais novos da mesma maneira.

“As novas gerações já interpretam estes símbolos de outras formas”, reafirma. Para Inês Franco, maquilhadora de Cristina Ferreira, é isso mesmo que está a acontecer. “Os homens ficam intimidados com mulheres que usam batom vermelho porque eles percebem que elas são seguras de si próprias e não têm problema nenhum em chamar a atenção”.