Brexit: Voto das mulheres pode ser decisivo

A cerca de uma semana do referendo que vai decidir a permanência do Reino Unido na União Europeia (UE), as sondagens apontam para uma vitória do não, ou seja, para a saída.

A mais recente sondagem feita pelo YouGov com o jornal The Times apresenta 46% de intenções de votos a favor do brexit, 39% pela permanência na UE (bremain) e 11% de indecisos. E se é nos indecisos que se pode jogar a decisão final dos britânicos, entre estes poderão ser mesmo as mulheres a ter a última palavra. Isto porque, segundo apontava uma sondagem da ICM Fawcett Society, realizada em abril, o número de mulheres que permaneciam indecisas era o dobro do dos homens, quando inquiridas sobre se as campanhas tinham abordado os assuntos que consideravam importantes e as suas preocupações.

Enquanto os homens tendiam a manifestar mais a discordância face às propostas – 38% contra 24% das mulheres -, a percentagem de eleitores do sexo feminino a escolher a opção “não sabe” era significativamente superior, correspondendo a 23%, por oposição a 10% do lado masculino, revelava a pesquisa daquela organização que promove a igualdade de género. E mesmo entre os eleitores que afirmaram que irão votar mas que admitem não saber em qual das duas posições, são novamente as mulheres que aparecem em maior número (16% contra 9% de homens).

“As mulheres são mais propensas a ser indecisas, mas menos a sentirem que as campanhas as ajudaram a formar uma decisão”, disse Jemima Olchawski, uma das responsáveis da Fawcett Society ao site Refinery29. Mas o que explicará até que ponto o peso das mulheres pode ser decisivo será o facto de elas “se sentirem mais confortáveis em dizerem que não sabem” do que os homens, como referiu fonte do YouGov citada num artigo do Evening Standard, publicado no dia 1 deste mês e que reflete sobre a forma como uma eventual saída do Reino Unido da UE pode afetar as britânicas.

Já em janeiro um estudo do think-thank British Future revelava essa tendência de as eleitoras assumirem com muito menos relutância do que os homens a sua ignorância em relação a alguns assuntos debatidos e ao sentido de voto. Houve, inclusivamente, quem visse nesta tendência uma réplica do que já tinha acontecido no referendo de independência escocês, como Rosie Campbell, professora de Política na Birkbeck University. Citada pelo The Guardian, a académica lembra que nessa ocasião o eleitorado feminino também esteve oscilante face ao seu sentido de voto, tendo no final escolhido o “não”, a opção que ganhou.

No inquérito da Fawcett Society, percentagem de eleitoras a dizer que iria votar pela permanência na UE no referendo do próximo dia 23 de junho era de 45%, ao passo que 39% optaria pela saída.

A comparação não é consensual entre os analistas. No mesmo artigo há quem alerte que as sondagens não provam que as mulheres são mais indecisas que os homens, mas sim que o manifestam com maior naturalidade.

Divergências à parte, o que é certo e assumido, de ambos os lados da campanha para este referendo, é que as mulheres estão ausentes do debate, tanto no que toca à sua participação direta como no discurso e nas preocupações dos políticos relativamente a este eleitorado.

Mulheres ausentes das campanhas

A ausência das mulheres ao longo da campanha tem sido notada tanto do lado dos conservadores como dos trabalhistas. Além de sentirem que não chegam até si esclarecimentos suficientes sobre os assuntos envolvidos no processo que lhes permitam formar uma opinião, há ainda a relutância em envolverem-se em discussões agressivas.

Muitas das mulheres ouvidas pelo The Guardian afirmam que o terreno está demasiado dominado pelos homens, que fazem centrar o debate numa ou noutra questão mais fraturante, ignorando outros temas, ou em disputas de liderança, como criticou a líder dos Verdes, Natalie Bennet. “É um concurso para a liderança dos Conservadores mascarado de debate sobre a UE”, afirmou.

Uma pesquisa da Universidade de Loughborough, divulgada no passado dia 12, confirma que o top 10 da presença mediática dos políticos é quase exclusivamente dominado por homens.

Entre 6 de maio e 8 de junho a ministra do Emprego era a única mulher num ranking que media a frequência com os políticos apareciam nos media a comentar o referendo. Priti Patel aparece em décimo lugar, numa lista encabeçada por David Cameron e Boris Johnson.

Apelando ao eleitorado feminino, Priti Patel, que tem feito campanha pela saída da UE, comparou a defesa do brexit à luta das sufragistas, alegando que “Emmeline Pankhurst e as outras sufragistas não lutaram pelo direito a votar em que as governava para agora verem essa decisão entregue a instituições não democráticas da UE e à sua elite política”. Do outro lado, há quem sustente que a saída da União representaria um retrocesso nos direitos das mulheres, como os laborais e de maternidade.

Roberta Guerrina, leitora de Política, na Universidade de Surrey, considerou, em declarações ao Evening Standard, que é difícil prever o que vai acontecer no futuro, embora reconheça que as diretivas comunitárias fornecem uma “rede de segurança” à garantia dos direitos conquistados pelas mulheres ao longo de décadas.

Para a especialista, a perda de direitos pode estar, contudo, relacionada com outra questão mais abrangente mas que pode enquadrar o debate. “A igualdade é algo que os governos promovem em tempos de prosperidade económica, mas que passam a ser aceites como danos colaterais em alturas de crise. A justiça social, a igualdade de género e um salário igual tiveram um retrocesso significativo devido à austeridade”, apontou Roberta Guerrina, exortando ambas as campanhas a não se ficarem pela taxa dos tampões quando se dirigem ao eleitorado feminino. “O que nenhuma das campanhas fez foi estabelecer a ponte entre os assuntos primordiais para as mulheres, que são importantes, e os grandes assuntos políticos, como a economia.”

Feitas as contas, o que está em causa é um milhão de votantes que nenhum dos lados parece estar a conseguir agarrar, como alertou, em abril, Sam Smethers, CEO da Fawcett Society. “23% das mulheres ainda ‘não sabem’ enquanto uma em cada quatro não concorda nem discorda de que as questões abordadas nas campanhas lhes digam respeito. Isto mostra que metade do eleitorado feminino tem estado até agora desligado do processo”, concluiu.

Fotografia de destaque: Reuters/ Neil Hall