Cancro do ovário: Mais de 500 novos casos por ano e oito em cada dez chegam em fase avançada

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[Fotografia: Pexels/Olha Ruskykh]

Os números dão que pensar. São reportados, em Portugal, cerca de 500 novos casos de cancro do ovário por ano, um tumor que é a oitava causa de morte por cancro na mulher, e quase oito em cada dez casos são diagnosticados em fase avançada. Os dados são revelados no momento em que se celebra o Dia Mundial do Cancro do Ovário, esta segunda-feira, 8 de maio.

A inexistência de modelos de rastreio, como já sucede com outros como o da mama ou colo do útero, e os sintomas inespecíficos levam a que seja uma patologia de diagnóstico mais difícil e tardio, com riscos claros para as mulheres e para as suas condições de sobrevida após doença.

“Com o cancro do endométrio, não havendo rastreio, 80% das mulheres apresentam uma manifestação precoce – uma hemorragia vaginal anómala – no Cancro do ovário não há nem uma coisa, nem outra. Ou seja, nem um método de rastreio definido, demonstrado como eficaz, nem uma queixa específica”, esclarece o presidente da Secção Portuguesa de Ginecologia Oncológica (SPGO), em comunicado. Henrique Nabais sublinha o risco de diagnósticos tardios, que “implicam sempre tratamentos mais caros e resultados menos positivos”. É uma situação “altamente onerosa e não apenas no que diz respeito a uma questão monetária. São múltiplas as esferas na vida da mulher e da sociedade que são afetadas”, alerta o especialista.

O cancro do ovário trata-se de um tumor em que “os principais fatores de risco são a idade, história reprodutiva da mulher (menstruação precoce, menopausa tardia) e obesidade”, lê-se na nota enviada à comunicação social. Recorde-se ainda que, segundo dados oficiais, há uma componente genética presente neste tipo de tumores: “20 a 25% de todos os cancros de ovário estão associados a um fator genético e a presença da mutação BRCA 1 e/ou 2, confere um risco de desenvolver a doença à medida que a idade avança, entre 39% a 65%.”

Num país em que parte da população esapaca a vigilância regular por falta de médico de família e mediante sintomas tão comuns e geralmente desvalorizados, o especialista pede para que se ouça o corpo e com o propósito de chegar mais cedo ao diagnóstico. “Quando alguma queixa diferente daquilo que é habitual surge, tem de ser valorizada. Imagine-se uma mulher que fica enfartada depois de comer. Se isso apenas acontecia uma vez e passou a ter uma frequência maior, ao fim de duas semanas a um mês tem de ser avaliado. Tudo o que seja uma queixa de novo ou que tenha um agravamento tem de ser tida em conta. Qualquer um dos sintomas que tenha uma frequência de mais de 12 dias por mês deve ser avaliado”, vinca Henrique Nabais.

Campanha na rua e petição para legislação no Parlamento

A propósito do Dia Mundial do Cancro do Ovário, está a ser lançada a iniciativa “saBer mais ContA” que lança uma campanha, com o mote ‘Eu preferia saber…’, convocando atenções para a existência de mutações genéticas que aumentam o risco deste tumor.

Paralelamente, deu entrada, na semana passada, uma petição com quase 11 mil signatários e que pede acesso generalizado a cuidados de primeira linha, numa doença que ainda é muito marcada pela desigualdade financeira entre as mulheres e apenas a mulheres com fatores genéticos de risco identificados.

O documento público ‘Nenhuma mulher portuguesa com cancro do ovário deixada para trás’, submetida na Assembleia da República pede para que a alternativa de tratamento esteja disponível no Serviço Nacional da Saúde. “Até há pouco tempo, Portugal era dos únicos países da Europa sem uma alternativa de tratamento de manutenção em primeira linha para o cancro do ovário, financiada e disponível no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Neste momento, já existe essa opção, mas apenas para doentes com mutação (sBRCA ou Gbrca). Essa decisão não é democrática, nem compreensível. As doentes sem mutação, além de serem a maior parte dos casos de cancro do ovário (mais de 75%), são as que apresentam maiores necessidades médicas, devido ao pior prognóstico”, lê-se na petição.

De acordo com os peticionários, “o acesso a um tratamento de manutenção em primeira linha pode significar mais anos e melhor qualidade de vida”.

Atualmente, pode ser solicitado pelo médico um pedido de Autorização de Utilização Excecional (AUE) à Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed), mas quando o especialista considere existir benefício para a doente. Os peticionários afirmam que “têm existido pedidos de AUE para utilização de fármacos aprovados internacionalmente para tratamento de manutenção em primeira linha de mulheres com cancro do ovário sem mutação BRCA, sendo que o Infarmed tem indeferido os mesmos, com a justificação de que as doentes não estão em risco de vida”, refere o documento, contrapondo com o que diz ser evidência científica. “85% das mulheres com cancro do ovário vão ter uma recaída/recidiva após a cirurgia e a quimioterapia com platina, sendo que a maioria acabará por falecer nos cinco anos seguintes (30%)“, lê-se na petição