Casos de Covid-19 aumentam. Como controlar a angústia de uma nova vaga?

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[Fotografia: Pexels]

Vários países estiveram sujeitos ao confinamento durante vários meses depois de a pandemia provocada da Covid-19 ter atacado. Após algum abrandamento, os números voltam a disparar em Portugal, que só nos últimos três dias já registou de mil e 400 novos casos de infetados. A impotência, o receio do caos, a angústia e o medo do regresso ao passado recente podem estar a agitar a mente. É preciso olhar e saber lidar com tudo isto para prosseguir sem pânico.

Durante este período mais recente “sentíamos um certo alívio ao perceber que, a nível nacional, os números seguiam, de forma geral, uma tendência decrescente, o que nos ajudou a serenar as nossas preocupações e receios relativamente ao vírus”, contou Cécile Domingues, psicóloga, psicoterapeuta e diretora da Clínica da Mente, em entrevista ao Delas.pt.

Já depois do período de desconfinamento, mas com os casos de Covid-19 a aumentarem novamente no mês de setembro, o impacto psicológico relativo à doença é uma realidade que não terminará tão cedo.

Embora vivamos atualmente numa pandemia graças à Covid-19, vivemos uma epidemia de saúde mental há muito mais tempo.

Para alguns, este novo aumento pode não trazer grandes diferenças, mas há quem possa entrar em pânico ao ver a sua segurança pessoal novamente frágil.

Afinal, neste mês, “as crianças e jovens vão regressar às escolas, os adultos vão regressar ao trabalho de forma presencial e tudo isto assusta-nos e os números vêm reforçar os nossos receios e intensificar a nossa ansiedade”, explicou Cécile Domingues.

No entanto, segundo o que a psicóloga Filipa Jardim da Silva explicou em conversa com o Delas.pt, “esta situação convida-nos a ganhar alguma perspetiva. Temos de fazer questões como: sim, os números estão a aumentar e o que é que isso significa, concretamente, para o meu dia-a-dia? O que é que isso significa em termos de pandemia? Até que ponto é que não era previsível que isto acontecesse com o aumento de mais contactos e mais circulação na rua?”.

Apesar de ser algo expectável, “muitas pessoas pensavam que este novo aumento ia apenas decorrer mais tarde”, quando os dias estivessem mais frios. Mas, mais uma vez, o vírus provou-se imprevisível, trazendo consigo sentimentos de angústia e impotência.

“Ninguém sabe exatamente dizer o que isto é. Por isso, colocar os nossos planos futuros e a nossa segurança à mercê da imprevisibilidade absoluta e daquilo que nós não controlamos é sempre uma má estratégia“, indica a psicóloga.

Cécile Domingues concorda e acrescenta que “de nada vale tentar negar ou encontrar teorias que refutem os perigos e/ou consequências desta pandemia. No meu entender é perda de tempo e perda de energia”.

Ainda assim e para além dos desafios que possamos ter a vir de enfrentar a nível profissional e pessoal, há aspetos que devemos ter em conta para podermos aliviar alguns dos sentimentos negativos que advêm da pandemia.

Filipa Jardim da Silva refere que o primeiro passo está em saber “filtrar a quantidade de informação relativa à pandemia a que temos acesso”, sendo que este aspeto está fundamentalmente ligado ao autocuidado.

“Quando estamos todo o dia com vários alertas no telemóvel e vemos vários canais digitais, televisão e tudo isso – sempre na procura de mais informação relativa à pandemia – estamos potencialmente mais inquietantes e nada produtivos. Mas, no final do dia, não adianta porque esses sentimentos não vão mudar nada”, refere a especialista.

Para a diretora da Clínica da Mente, “recolher uma avalanche de informação proveniente de várias fontes só nos prejudica e deixa-nos ainda mais inseguros”.

Como tal, Filipa Jardim da Silva recomenda que se faça uma “triagem” dos conteúdos noticiosos a que se tem acesso, já que isso está “no nosso campo de ação para controlar, ao contrário da evolução da doença”.

O segundo passo deve ser “treinar a nossa auto-observação”, prossegue Filipa Jardim da Silva, acrescentando que “quanto mais cultivarmos uma postura de curiosidade e de observação para nós mesmos, mais vamos ser capazes de investigar alguns comportamentos nossos e ganhar uma perspetiva eles para depois os conseguirmos regular”.

“É importante conseguir gerir as nossas emoções, racionalizando-as e percebendo que estamos todos a viver a mesma situação”, indica Cécile Domingues.

Na verdade, alguns dos comportamentos derivados de sentimentos como a angústia, não são produtivos e estão a dar conta de maiores níveis de insegurança, sendo algo que “nos vai prejudicar”.

Assim, desta estratégia de auto-observação surge a final: “apostar no autocuidado”. Como se faz isso? Existem várias atividades que pode fazer de forma a se autoajudar e não se deixar levar por sentimentos que a prendem.

“Quanto mais cuidar dos meus hábitos de sono, melhor. Mais estou a cuidar do meu sistema imunitário. Quanto mais olhar para a comida como uma medicação natural, mais vou torná-la uma potência boa para mim. Quanto mais encarar a minha gestão de stress procurando alguns limites e equilíbrio, também isso me vai beneficiar. O foco é sempre no que eu controlo”, reflete Filipa Jardim da Silva.

E é neste último aspeto que devemos depositar toda a nossa atenção: “tentarmos controlar os nossos níveis de segurança por estes números tão gerais, é sempre uma má estratégia e é algo que, no fundo, implica sempre blocos de controlo externo“, explica a psicóloga, apontando que a “impossibilidade e impotência são sempre a fórmula do caos. E esta pandemia reveste-se precisamente destas duas características”.

Ainda assim, Cécile Domingues alerta para que “se apesar de todos os esforços, não conseguir controlar os pensamentos, medos e sensações, recomenda-se que procure ajuda de um profissional de saúde, de um psicólogo, que o irá ajudar a ultrapassar as suas dificuldades”.