Christiane Torloni: “Com o ‘Amazónia para Sempre’ comecei a receber muitas ameaças de morte”

Institucional
Christiane Torloni [Fotografia: Globo]

Rosto incontornável de novelas brasileiras que, há décadas, são exibidas em Portugal, Christiane Torloni foi sempre muito além da ficção. Há já década e meia que abraçou a luta pela preservação da Amazónia.

Em 2019, lançou o filme Amazónia, o Despertar da Florestania – que pode ser visto em Portugal na plataforma de streaming da Globo -, no âmbito do qual recolheu múltiplos testemunhos evocando para a importância da proteção daquela vasta área em risco.

Mas não é apenas a selva que está em perigo. Quem denuncia as práticas ilegais também receia pela vida. Esta semana, aliás, as autoridades brasileiras confirmaram o assassinado do jornalista britânico e ativista brasileiro Dom Phillips e Bruno Araújo Pereira. Ainda que a polícia creia, segundo comunicado, que os suspeitos agiram sozinhos, o desaparecimento de ativistas pelo ambiente tem vindo a crescer.

Christiane Torloni, de 65 anos, que se envolveu nesta luta ainda antes de 2007, quando pós em marcha o abaixo-assinado Amazónia Para Sempre – recolhendo mais de milhão e 200 mil assinaturas – não será certamente alheia a esta realidade.

Em entrevista ao Delas.pt, em outubro, a atriz brasileira revelou: “À conta do ‘Amazónia para Sempre’ comecei a receber muitas ameaças de morte.”

“Estamos a mexer com o poder do dinheiro. Os grileiros [pessoa que se apropria de terras devolutas ou de outros, cria documentação falsa e se dedica à especulação imobiliária] estão lá como? Eles não têm dinheiro para comprar aquelas máquinas. Falamos de 22 mil grileiros, homens, a entrarem naquelas terras dos Yanomami e cavando aquela região”, relata a atriz.

Christiane Torloni [Fotografia: Globo]

Anos depois destes ataques iniciais e já depois de um trabalho cinematográfico que tem vindo a ser visionado e debatido no Brasil, Estados Unidos da América e em Portugal, Christiane Torloni não revela se a sua integridade física continua em perigo, nem por parte de quem. “Vamos lutar onde temos de lutar, sabemos de onde vêm e dizem-nos para não nos metermos onde nos devemos. Por isso, vamos caminhando, há sempre gente que não vai gostar”, atira.

Não penso muito nisso [ameaças de morte] e vamos em frente”, reage. “Se o facto de ser uma pessoa conhecida me traz algum tipo de escudo? Não sei se talvez, de alguma maneira, me permita ir a alguns lugares que fui. Estou aqui para fazer as coisas. Infelizmente, nós estamos isolados, quem mata está a solta”, acrescenta.

‘Amazónia, o Despertar da Florestania’ em Portugal

A película está feita e pode ser vista na plataforma de streaming agregado ao canal brasileiro Globo, mas Torloni não quer ficar por aqui. “Como realizadora, penso num desdobramento do documentário Amazonia. Tenho pérolas de entrevistas que não couberam no filme. A série seria basicamente para televisão”, avança. E os planos são concretos: “Devo fazer pelo menos conseguir fazer uns dez episódios e que não conseguiram entrar.”

 

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Não sabe se vai regressar ao terreno, afinal o material que tem em mãos colocam a película na agenda do dia. “Infelizmente, o meu filme é mais atual agora do que há dois anos. Tivemos grandes problemas para conseguir os arquivos do filme”, analisa Torloni, que vinca: “Faço a minha política através da minha arte. Amazónia é um filme político.”

Ao Delas.pt, a atriz explica ‘Florestania’ é um “neologismo”. “Sabemos o que significa cidadania, mas sabemos que existe código de deveres e direitos para os animais e para todas as plantas? Estamos a queimar catedrais de conhecimento, aliás, nem sequer sabemos bem o que estamos a queimar, talvez o conhecimento mais ancestral que os índios já tinham e que estamos a tentar recuperar”, sintetiza.