São 15h00 de um sábado quente de primavera. Clara Silva, de 25 anos, prepara-se para começar a sessão de autógrafos do seu primeiro livro, Miga, Esquece Lá Isso!, na Feira do Livro, em Lisboa, dentro de meia hora. Mas esta não vai ser uma sessão de autógrafos habitual. Além de mensagens bonitas nos livros, a ilustradora compromete-se a desenhar os problemas de quem for ter com ela.
Chegou mais cedo para almoçar, mas ficou “presa” na cadeira onde vai estar o resto da tarde porque já tinha fãs ansiosas por um autógrafo e uma ilustração. Enquanto a fila vai crescendo, conta-nos como nasceu o gosto por esta arte e o seu nome artístico, Clara Não (percorra a galeria de imagens no topo do texto para ver algumas das ilustrações da artista).
“Sempre desenhei muito, mesmo na primária a minha mãe dava-me um limite de folhas por dia. Depois descobri onde as folhas estavam e a minha mãe percebeu que não havia solução. Quanto ao nome, sou Clara Silva e Silva é o nome mais comum de Portugal e Brasil, então fiz uma lista de nomes para trocar o Silva. Não achava nenhum, lembro-me perfeitamente de estar com um marcador à frente dos nomes e dizer: ‘Não, não, não.’ Ficou o não“, explica ao Delas.pt Clara Não.
Neste seu primeiro livro, que também descreve como um manifesto a favor da independência feminina, a jovem portuense quer mostrar como transformar os problemas em risadas de amor-próprio através da sua arte.
“Este é o livro que gostava que me tivessem dado para que percebesse que não sou a única pessoa a lidar com este tipo de problemas e que nada é assim tão problemático. Quero que as pessoas sintam que não estão sozinhas e que se riam das coisas que, provavelmente noutro contexto, nunca se iriam rir, como por exemplo alguém dizer: “Não estou pronto para uma relação mas estou quase.” Quero que as pessoas percebam que a vida é delas, não é de mais ninguém, está a acontecer agora e é para aproveitar”, afirma a ilustradora.
Na maioria das suas obras, Clara Não espalha mensagens de amor e indignação. Uma linha que escolheu seguir porque nem sempre disse o que pensava.
“Houve uma altura em que não dizia o que pensava porque achava que ia ser impertinente, que contrariava muito a noção de sociedade, pessoas e protocolos sociais. Depois houve todo um processo em que aprendi a amar-me. Se nos amarmos e aceitarmos as coisas são muito mais fáceis”, recorda Clara Não.
Apesar de ter vários dos seus trabalhos expostos em galerias como a Malapata, Apaixonarte e Senhora Presidenta, é nas redes sociais que tem uma das suas maiores montras. No Instagram já conta com mais de 38 mil seguidores e faz questão de partilhar ilustrações com regularidade.
“O mais fixe é que o teu trabalho chega a muita gente de forma fácil e simples. Não tem a condicionante geográfica e causa discussão. O que mais me preocupa é fazer com que os assuntos não morram. É uma comunidade que está ali a conversar e a debater problemas”, sublinha a jovem portuense.
Com a conversa já perto do final, Clara Não fica surpreendida ao ouvir anunciar o seu nome nos altifalantes da Feira do Livro. “É aquele estranho bom”, desabafa. Ainda por concretizar tem o sonho de colaborar com o artista visual britânico David Shrigley. Enquanto isso não acontece vai trabalhando com outros artistas nacionais que também admira.
“Estou em conversações para colaborar com o Another Angelo e esta semana vou ter a inauguração de uma exposição com Cara Trancada, no Selina, no Porto. Há mais pessoas, fora da área, com quem gostava de colaborar. Identifico-me muito com a Capicua e a Blaya por causa do empoderamento”, acrescenta Clara Não.
Em apenas uma semana, o livro Miga, Esquece Lá Isso! tornou-se no mais vendido na livraria online Wook, liderando o top 10, à frente de O Senhor, o novo romance de E. L. James, autora de As Cinquenta Sombras de Grey, A Sibila, de Agustina Bessa-Luís, e de Está Tudo Fodido, de Mark Manson, que ocupa o quarto lugar.
Ficha técnica do livro:
Miga, esquece-se lá isso!, de Clara Não. Ideias de Ler, 13,30€
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