Corpo, maternidade e trabalho – o corpo da Mulher à Obra

A luta pela igualdade de géneros não é uma luta pela igualdade absoluta. A mulher é diferente do homem; o seu corpo é diferente e é a maternidade, enquanto capacidade de gerar vida, o principal fator diferenciador.

A mulher que gera vida e que trabalha move-se num mundo laboral que foi essencialmente concebido por homens e para homens, pois evoluiu historicamente num contexto em que era exclusivamente, ou quase exclusivamente, do domínio masculino.

A segregação artificial entre vida familiar e vida laboral é uma violência contra o corpo da mulher

Apesar de terem vindo a ser tomadas medidas legislativas que pretendem promover a inclusão laboral das mulheres e a igualdade de géneros na área profissional, a mudança de paradigma faz-se lentamente. Não é apenas a legislação que tem que mudar, são mentalidades, crenças e práticas incorporadas ao longo de gerações até se tornarem subliminares, inconscientes e insidiosas.

Neste contexto, aquilo que diferencia a mulher pode ser entendido (mesmo que não seja assumido) enquanto um handicap, uma limitação, um fator de perturbação no seu percurso profissional. A gravidez, o aleitamento, o apoio aos filhos, são frequentemente vistos pelo mundo laboral como entraves que comprometem a disponibilidade da mulher para aquilo que realmente interessa, o seu trabalho.

O caminho mais fácil passará contratar homens e não mulheres, pagar mais aos homens do que às mulheres, confiar mais na competência profissional dos homens do que na das mulheres, remeter as mulheres novamente para a esfera do exclusiva do lar, pois estas, por condicionalismos inerentes ao seu corpo maternal, poderão vir a ter a sua capacidade laboral comprometida.

A legislação procura inverter esta tendência mas fá-lo de forma artificial: é uma imposição e não uma convicção. Daí a importância de acompanhar a evolução legislativa com uma revolução das mentalidades. Esta revolução das mentalidades tem que passar necessariamente por uma alteração da forma como se perceciona o próprio trabalho.

A Mulher à Obra reivindica o seu direito a viver plenamente a maternidade e a trabalhar num mundo sem preconceitos

Numa sociedade que possui uma relação obsessivo-compulsiva com a vida, que procura desesperadamente ordenar, sistematizar, compartimentar e hierarquizar as diversas áreas que compõem a nossa existência, a segregação artificial entre vida familiar e vida laboral é uma violência contra o corpo da mulher.

A «Mulher à Obra» procura libertar-se desta violência. Acredita na integração entre família e trabalho, na complementaridade entre duas esferas que se enriquecem mutuamente. Acredita que tem o direito de definir as suas prioridades, de gerir os seus horários, de satisfazer as suas necessidades e de cumprir as suas obrigações da forma que considera mais adequada. Não quer ser subalternizada por regras que não controla, por normas que não criou e por códigos de conduta com os quais não se identifica. Quer ter poder, o poder de conquistar a sua autonomia financeira, de fazer aquilo de que gosta, de explorar o seu potencial, de aprender coisas novas, de conhecer outras realidades, de socializar, de evoluir enquanto pessoa.

Todo este processo se realiza na vida como um todo e não necessariamente num emprego no seu sentido mais estrito. Uma área da vida não pode roubar o espaço das outras. Há um continuum entre todas as áreas, logo a «Mulher à Obra» reivindica o seu direito a viver plenamente a maternidade e a trabalhar num mundo sem preconceitos limitadores nem crenças castradoras. Caso não seja mãe, quer ter tempo para si, para as suas atividades, para os seus interesses, para os seus amigos. Quer ser a sua própria Mulher e não apenas a mulher dos outros.


Camila Rodrigues é fundadora do movimento Mulheres à Obra