Costa ignora slogans e “críticas pessoais” de falta de “estatura”, “fibra” e “caráter”

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O primeiro-ministro defendeu esta terça-feira, 23 de outubro, que uma reforma profunda da floresta, da prevenção e combate aos incêndios tem de ser fundada na “cooperação institucional” e na ciência, reunindo um “imprescindível” consenso político.

Esta foi uma das primeiras respostas de António Costa à moção de censura apresentada por Assunção Cristas, presidente do CDS-PP, não se referindo uma única vez àquela iniciativa, nem respondendo a críticas, que têm vindo a subir de tom à medida que o debate está a prosseguir.

Costa diz mesmo, já numa intervenção posterior, que “vai passar ao lado de críticas pessoais e slogans” e “passar ao que interessa”, elencando todas as iniciativas que estão em curso e que, na sua maioria, foram anunciadas no último sábado, na sequência do Conselho de Ministros extraordinário. E lamenta que o CDS-PP esteja “preocupado em derrubar o governo”, enquanto o executivo quer “reconstruir o país”.

Recorde-se que, numa segunda e terceira intervenções da líder centrista, Cristas acusou Costa de “não ter estatura de primeiro-ministro” e, mais à frente, acusou-o de falta de “fibra” e de caráter”.

Retomando a palavra, o governante voltou a elencar as medidas que tinha já afirmado na sua intervenção inicial, na qual sublinhou a necessidade de “mudar o que tem de mudar, reparar o que tem de ser reparado e construir o que tem de ser construído”.

As medidas que já estão em marcha: indemnizações, mais meios e mais recursos

António Costa tinha avançado, na declaração inicial, que “só uma reforma fundada na cooperação institucional e no melhor do conhecimento científico tem condições para inspirar a necessária mobilização nacional e reunir o imprescindível consenso político”, acentuou.

O primeiro-ministro preferiu antes salientar que, tal como o seu executivo tinha antes anunciado, “comprovadas” pela Comissão Técnica Independente “as falhas de serviço, o Governo assumiu a responsabilidade do pagamento das indemnizações devidas às vítimas mortais e acordou um mecanismo extrajudicial de fixação dos critérios destas indemnizações, confiando ao provedor de justiça a sua aplicação a cada um dos familiares e herdeiros”.

No único ponto com “indiretas” às forças da oposição em torno da questão das indemnizações, António Costa sustentou que, “responsavelmente, o Governo comprometeu-se a retirar todas as ilações que decorressem deste relatório, quer para a assunção de responsabilidades, quer para a reforma do sistema”.

“Fizemo-lo por respeito a esta Assembleia [República], por respeito pela competência técnica e científica dos membros da comissão, por respeito pelas vítimas e populações atingidas, que exigiam solidez e consistência nas decisões, e não apenas mediáticos remendos legislativos“, disse, numa alusão indireta a posições tanto do PSD como do CDS-PP.

O primeiro-ministro referiu em seguida que o Conselho de Ministros extraordinário de sábado passado “adotou medidas que reforçam a proteção dos cidadãos, com a aprovação da Estratégia de Proteção Civil Preventiva, que promove uma cultura de segurança e reforça os mecanismos de informação e alerta às populações”.

Na perspetiva de António Costa, três princípios orientam a reforma agora desencadeada pelo Governo: “A aproximação entre prevenção e combate; a profissionalização e a capacitação; e a especialização, que permitirá a progressiva e tendencial segmentação de meios vocacionados para a proteção de pessoas e bens”.

Neste contexto, o primeiro-ministro aproveitou então este ponto para insistir nos apelos ao consenso político, defendendo uma reforma “que não divide, mas soma; que não afasta, mas une”.

“Uma reforma em que todos são essenciais, numa nova aliança entre o saber e a vontade de servir, a academia e os operacionais, a sociedade e as instituições. Encaremos juntos este desígnio, este ímpeto que nos desafia. Os portugueses não esperam outra coisa de nós, nesta altura“, advertiu.

Neste contexto, António Costa repetiu a frase que, na sequência dos incêndios deste último Verão, “nada pode ficar como antes”.

Eucaliptos: o centro da discussão

A célebre lei da liberalização dos eucaliptos foi, de forma esperada e logo no início do debate, o ponto central das acusações, com o deputado João Paulo Correia a começar por lembrar que “quem aponta o dedo a alguém, tem quatro a apontar para si”. Com isto, o socialista falava daquele diploma (de 2013), aprovado por Assunção Cristas, enquanto ministra da Agricultura no governo de coligação PSD/CDS.

Correia explicou que, com aquela lei, “o eucalipto foi colocado ao mesmo nível de outras espécies”, o que “nos três primeiros meses deste ano – janeiro a março – fez com que 92% de novas árvores fossem eucaliptos” e que, em 2015, “77% do investimento florestal foi direcionado” para aquela espécie.

O mesmo deputado falou dos cortes de “43%” no Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) na legislatura PSD/CDS, evocando ainda as reduções nos bombeiros.

Cristas reagiu e declarou que “o orçamento para as florestas foi inferior em 2016 e 2017” do que em anos anteriores e “o orçamento previsto para 2018 é inferior ao de 2012”. Também nos números, a líder centrista, afirmou que entre 1995 e os primeiros anos deste milénio, “cresceram 6333 hectares de eucalipto em média, por ano” e que, “entre 2013 (ano da lei) e o primeiro semestre por ano, a média foi de cerca de 1/3 por ano”. A líder do CDS-PP acusou o governo de ter “nomeado uma pessoa que vem da área do eucalipto para tratar da salvação do país”. A presidente centrista referia-se a Tiago Oliveira, responsável do grupo Navigator (ex-Portucel Soporcel) e que vai tutelar a Estrutura de Missão para a Gestão Integrada de Fogos Rurais.

A responsável de Os Verdes, Heloísa Apolónia, deixou no ar a pergunta: Se Assunção “não sentia nenhuma responsabilidade” pela aprovação da lei do eucalipto? E ia mais além: se se iria “absolver” deste papel.

 

Imagem de destaque: Mário Cruz/Lusa