Arquiteto já fez 500 gorros de proteção para oferecer

MM2-1-423x563(1)

Sexta-feira, 13, sábado, 14 de março, domingo, 15 segunda, 16. Os olhos e os ouvidos de Marco Moreira não se descolaram das notícias relativas ao Coronavírus, os dedos não pararam de teclar mensagens nas múltiplas redes sociais e sobre o mesmo assunto.

Retido em casa, em confinamento voluntário como grande parte dos portugueses, este arquiteto de 44 anos, da Câmara Municipal de Odivelas, estava absolutamente concentrado na pandemia, nas condições dos hospitais e replicava-se em alertas para o que estava por vir. “Estava a entrar em desespero”, conta ao Delas.pt, esta sexta-feira, 20 de março.

Por isso, assim que a semana começou também ele decidiu dar um novo arranque à forma como estava a viver a quarentena. “Como tenho alguém muito querido e próximo de mim a trabalhar num hospital, percebi, através de uma das imagens que me mandaram, que a realidade portuguesa, em termos de equipamento, não era nada comparada com as que tinha visto da China ou Itália até aquele momento. Foi aí que tive a ideia de fazer um gorro”, revela.

Numa altura em que as máscaras cirúrgicas se revelam bens raros – e em que se espera pelo desenvolvimento de tecidos tecnológicos, em Portugal, a ideia de Marco Moreira foi a de criar um equipamento, uma cógula, que pudesse proteger o pescoço e o rosto. Pôs mãos à obra e concebeu um molde que, com a ajuda de Rui Tomás, designer gráfico e marido de uma antiga colega do curso de Moda da Faculdade de Arquitetura, da Universidade de Lisboa, o passou para um modelo CAD e para o tamanho real, pronto a ser usado gratuitamente, “sem quaisquer fins lucrativos” e por quem pudesse ou tivesse matérias-primas e estruturas.

Publicado por Marco Moreira em Sexta-feira, 20 de março de 2020

Enquanto as respostas não chegavam, este arquiteto, detentor da marca MBut, ao abrigo da qual chegou a vestir Áurea e Cláudia Vieira, foi procurar Tecido Não Tecido, comprou 300 metros de pano a quem já nem sequer ia abrir as portas e começou a fazer ele mesmo estes gorros. “Fiz 15 ou 20”, refere. Até testou o material. “Consegue resistir uma hora e 45 minutos à água”, conta.

Não teria mais tempo para fazer muitas mais peças porque as solicitações que começou a receber, em menos de 24 horas após divulgação nas redes sociais, transformaram aquele projeto exatamente no que ele queria: “que fosse de todos”. “Recebi contactos de pessoas que me ligaram de Braga, de Arruda dos vinhos, da Nazaré – de onde é natural – e querem saber como podem ajudar na fabricação”, conta Marco Moreira.

Máscarra gorro covid-19 coronavírus
Marco Moreira [Fotografia: Facebook]
Desde influencers e bloggers até empresas, certo é que a primeira encomenda chega já na terça-feira, 24 de março, aos arredores de Lisboa. “São 500 cógulas, terei apenas de fazer o atilho que as aperta ao pescoço”, explica, sublinhando que “não existe qualquer contrapartida financeira neste projeto”. E antecipa: “Quero apresentar este material e esta proposta no Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge para ser verificada porque não quero criar uma falsa ideia de segurança junto das pessoas.”

Os gorros vão ser, clarifica Marco Moreira, concedidos a título gratuito a enfermeiros e outros profissionais que, através das redes sociais, pediram para testar o modelo, com a salvaguarda, porém, de que não há ainda garantia de eficácia cirúrgica. “Ainda estamos em contactos tecnológicos”, revela Marco Moreira, explicando que se procuram os materiais certos para que a ideia avance num material que possa efetivamente proteger profissionais de saúde.

“No entanto, acho que pode ser útil junto de populações que mais precisem deles, lares por exemplo. Acredito que mais vale alguma proteção do que proteção nenhuma”, afirma Marco Moreira. Recorde-se que a Direção-Geral de Saúde tem vincado que o uso de máscaras deve ser limitado a quem está infetado ou suspeita de infeção e para profissionais de saúde.

Imagem do gorro quando usado [Fotografia: Marco Moreira]
Um projeto “sem fins lucrativos” que levou este arquiteto e funcionário público a querer fazer um investimento inicial em tecido, 300 euros, e a colaborar numa percentagem de pagamentos de salários da empresa que pegou no molde e o replicou 500 vezes. a RP-Pachecos Mobiliário. Antes, foi obtido ainda mais material de uma empresa de estofos e mobiliários, a Cabeceiras.pt.

“No futuro, acho que é possível abrir uma linha de crowdfunding absolutamente transparente sobre os preços dos materiais, do corte e da costura e para a qual os portugueses possam contribuir e, com esse valor, fazer mais equipamentos com menos custos e ter mais pessoas a trabalhar em segurança”.

Em cima da mesa de corte de Marco Moreira estão ainda as linhas, a fita métrica, os moldes e os gorros que nasceram no início desta semana, mas estão agora também outros planos. “A ideia é canalizar as minhas energias na produção de proteção para botas, talvez em lençol descartável de macas. É preciso fazer o teste”, revela o arquiteto.

Uma semana depois da entrada em clausura, diz desconhecer os números da pandemia. “Não sei quantas pessoas morreram, não sei quantos estão infetados, sinto que estou do outro lado da barricada e estou mais calmo e tranquilo”, conta.

gorro covid-19 coronavírus[Fotografia: Marco Moreira]