Mãe de Rui Pedro: “Mostravam-me crianças a serem violadas e eles a terem prazer com o choro”

Cristina Ferreira entrevistou Filomena Teixeira, a mãe de Rui Pedro, que está desaparecido há 20 anos. Na conversa exibida na terça-feira, 8 de janeiro, em O Programa da Cristina, que estreou na segunda-feira, a mãe do rapaz que desapareceu em Lousada, a 4 de março de 1998, revelou que mergulhou no mundo obscuro da pedofilia para tentar encontrar o filho.

Em jeito de introdução à entrevista, a nova apresentadora da SIC referiu que o pai de Filomena Teixeira gastou todo o dinheiro que podia à procura do neto, para aliviar a dor da família, e que a própria mãe “tinha pessoas que a chamavam para ver vídeos de pedofilia”.

“Vi coisas horríveis, Cristina. A partir das 4 horas da manhã é que se consegue ver os pedófilos a atuar. Mostravam-me crianças a serem violadas e eles a terem prazer com o choro. Masturbavam-se à custa disso. Estava a ver as imagens, para ver se algum deles era o meu, e cheguei a um ponto em que não conseguia mais. Caí para o lado”, recordou Filomena Teixeira.

Vítor Marques, o inspetor da Polícia Judiciária que esteve em estúdio a comentar a entrevista, acredita que não foram as autoridades a mostrar este tipo de imagens à mãe de Rui Pedro.

“Julgo que não terá sido a polícia a patrocinar estas imagens. Não quero acreditar porque a polícia tem forma de mostrar sem som e sem imagens, puxando apenas uma fotografia para que a mãe possa identificar ou não”, explicou Vítor Marques.

“Já chorei tanto que não tenho mais lágrimas para chorar”

Apesar de o paradeiro do filho ser desconhecido há duas décadas, Filomena Teixeira não perdeu a esperança de reencontrar Rui Pedro, que atualmente terá 32 anos.

“Já chorei tanto que não tenho mais lágrimas para chorar. Não fiz luto, nem faço luto. Posso ser maluca, chamem-me maluca, mas ainda acredito que vou saber do meu filho. Ou pelo menos o que lhe aconteceu”, contou a mãe de Rui Pedro.

Na opinião de Vítor Marques, na altura a polícia portuguesa não estava tão bem preparada como atualmente para resolver este tipo de casos. No entanto, não deixavam de investigar nem de conseguir que muitas investigações chegassem ao fim.

“Neste caso não houve falta de vontade e de trabalho, houve falta de comunicação. Esta é a área em que esta senhora, que dá o rosto por uma família amargurada durante todos estes anos, sente mais”, afirmou o inspetor da PJ.

Desde 1967 que a Associação para o Planeamento da Família (APF) tem intervindo em casos de exploração sexual. Um problema que afeta, sobretudo, meninas e mulheres.

2018: “Grande aumento do número de crianças em situação de tráfico”

“No tráfico de crianças nem precisa de haver um objetivo para a retirada daquela criança, ou seja, não é preciso perceber se querem vendê-la ou se é para exploração. O simples facto de haver uma criança que é retirada de um determinado contexto para ser levada para outro, sem autorização e sem as regras sociais formais, é logo considerado uma situação de tráfico“, explicou ao Delas.pt Sónia Lopes, coordenadora da APF.

No entanto, a responsável pela IPSS revelou que, dos casos que identificam, nunca conseguem perceber qual o verdadeiro motivo para o tráfico da criança.

“Nunca foi explícito que os fins a que se propunham numa situação de tráfico fossem para exploração sexual. Interviemos sempre logo na altura em que algo não estava a correr bem para retirarmos as crianças, seja porque estão a fazer viagens que não são supostas ou porque estão com adultos que não conhecem”, revelou a coordenadora.

O ano que há pouco terminou foi preocupante no que a este problema diz respeito. De acordo com Sónia Lopes, no início de 2018 houve um grande aumento do número de crianças em situação de tráfico em Portugal, principalmente em Lisboa.

“A grande dificuldade em combater estes casos de tráfico e crime organizado é que não se consegue estabelecer um padrão. Assim que se começa a perceber, os criminosos mudam rapidamente para outro padrão, nunca fica tempo suficiente para que o possamos identificar e saber como atuar”, referiu Sónia Lopes.

Para ajudar profissionais ligados à área da psicologia, serviço social e educadores que trabalham em casas de acolhimento ou estão ligados a tribunais, a APF vai organizar, nos dias 17, 24 e 31 deste mês, um curso sobre abuso sexual de crianças e jovens.

“Este curso é dado pela psicóloga Rute Agulhas, que acaba por ser uma pessoa perita nesta área. É dirigido a profissionais que lidam com crianças em risco. Muitos deles nunca lidaram com este tipo de casos, mas querem estar preparados para a possibilidade”, afirmou a coordenadora da APF.

Um luto de uma “dor que não tem nome”

Ainda na entrevista a Cristina Ferreira, Filomena Teixeira revelou que um médico a aconselhou a pôr uma pedra no quarto do filho.

“Quer que meta um túmulo no quarto do meu filho? O meu filho está desaparecido, não morreu. Espero que um dia ele me bata à porta. Dou-lhe um abraço tão grande. Infelizmente o presente não é como desejava que fosse, mas ninguém me vai tirar este sorriso”, acrescentou Filomena Teixeira.

O psicólogo Mauro Paulino tentou explicar a dor da mãe de Rui Pedro ao longo destas duas décadas.

“Isto é uma dor a que não se consegue dar nome. Todas as perguntas vão gerando um sofrimento imenso que obrigam a criar carapaças, a recorrer a medicação que não é a solução para este tipo de dor tão intensa”, acrescentou o especialista.

Nas redes sociais, Cristina Ferreira afirmou que esta foi a entrevista mais difícil da sua carreira.

“É talvez a entrevista mais dura da minha vida. A mais desconcertante. A Filomena é uma mulher extraordinária. Como nunca conheci. O Rui Pedro desapareceu há 20 anos. Alguém imagina viver assim?“, escreveu Cristina Ferreira.

Cristina Ferreira estreia-se na SIC e vence Manuel Luís Goucha