Lemos o novo livro da Cristina que reúne mais de 150 comentários ofensivos – parcialmente identificados e enviados, em grande parte, por mulheres – e que lhe foram dirigidos nas redes sociais, nos últimos meses.
Ataques pessoais, sexuais, acusações de traição, ganância e falsidade que a apresentadora da TVI republica na obra Pra Cima de Puta e no qual pede para que seja posto termo e pede legislação para acabar com o insulto gratuito online. Diz que não é “uma vingança”, nem que esta iniciativa serve para terem “pena” dela ou da família. Porém, a apresentadora quer lançar debate, “criar reflexão e discussão” sobre o facto de as pessoas comentarem “sem conhecimento de causa, por inveja pura e simples ou por qualquer outro sentimento” a ser identificado por especialistas.
Neste trabalho, Cristina Ferreira escreve sobre os ataques que tem sofrido nas redes sociais, nos últimos meses e desde que saiu da SIC para a TVI. Em Pra Cima de Puta, a apresentadora, diretora de Entretenimento e Ficção da TVI e acionista da Media Capital reúne mais de 150 comentários ofensivos de cariz sexual, social e pessoal, identificados pelo primeiro nome por quem os escreveu, dirigidos a ela. Vinca, aliás, tratar-se de mensagens que, na sua maioria, são dirigidos por mulheres, curiosa e tendencialmente a maior fatia do público que a vê na televisão.
A responsável da estação de Queluz de Baixo espera documentar a “parte da História e da história das pessoas que, impunemente, optam por agredir”, o rosto da estação quer que se faça legislação para combater estes ataques.
“Quero muito que haja uma legislação que regule esta situação de impunidade em que vivemos. Em que se pode escrever tudo”, escreve a apresentadora, onde refere que abordou este tema com a Entidade Reguladora para a Comunicação Social quer no plano dos ataques individuais, quer nos sites que fazem, “sem condenação alguma, qualquer tipo de notícia”.
“Não será uma lei fácil de redigir e levará tempo”, antecipa a autora no livro da editora Contraponto. “Temos de começar a falar sobre o tema e agir”, acrescenta, sublinhado: “Não posso ter seja quem for a escrever isto na minha página de Instagram ou de Facebook: és uma grande vaca.”
“Está na hora – pede a responsável televisiva num capítulo inicial – de chamar à atenção para este fenómeno, para quem comenta de maneira hostil. A difamação, a injúria e violência verbal gratuitas não podem ser normalizadas”, pede.
As mulheres os comentários de cariz sexual
Várias vezes no livro que retrata o período em que Cristina Ferreira protagonizou a mais polémica e mais cara – e possivelmente longa batalha judicial – transferência televisiva, a apresentadora vinca que o ataque mais massivo que lhe é feito parte de mulheres. “[Sobre os insultos nas redes sociais] Guardo apenas se é homem ou mulher. Há uma disparidade muito grande. E essa avaliação merece ser feita. A grande maioria das pessoas que me atacam é composta por mulheres”, escreve já na reta final da obra.
Não sem antes especificar: “Os homens tendem a ser mais contidos a este nível, mas quando as mulheres fazem comentários de cariz sexual, e insinuam que foi através de favores sexuais que cheguei onde cheguei, confesso que isso me entristece bastante.” Um lamento que chega, prossegue Cristina no texto, “por perceber que ainda há mulheres a perpetuarem este tipo de pensamento que limita tanto a igualdade entre homens e mulheres por ainda haver mulheres que pensam que, para serem bem-sucedidas, as suas semelhantes têm de se deitar com alguém”. Cristina recorda, aliás, o episódio em que denunciou ter sido vítima de assédio, uma revelação feita no livro que editou em 2016, Sentir. “É possível fazer seja o que for, sem ter de pedir favores de espécie alguma, mas sobretudo sexuais. Nada diminui tanto uma pessoa, nada diminuiu tanto as mulheres que se querem iguais
O trabalho, a saída da SIC e contratos que “muitas vezes não cumprem” com ela
“Saí da TVI para a SIC. Agora voltei. As pessoas que me agrediram quando decidi sair devem ser as mesmas que agora me atacaram”, escreve Cristina Ferreira, que refere que “as agressões são idênticas. Especulam. Falam do que não sabem.”
A apresentadora reitera ao longo da obra sobre o trabalho que teve para chegar a este ponto, refere que ganha muito dinheiro e volta a afirmar – como tinha feito na entrevista que deu na TVI – porque regressou àquilo que chamou “casa-mãe”. “O que a, esse nível [ganhar muito dinheiro], perdi com esta escolha que fiz de regressar à TVI e o que ganhei, tenho de concluir que não está tão desequilibrado quanto poderia estar. O que não quer dizer que esteja arrependida. Não estou. Mesmo que o peso daquilo que eu perdi fosse maior, continuava a querer estar aqui, no sítio onde estou”, escreveu.
Na obra, em que a palavra SIC é moderamente referida pela autora – Cristina está a travar uma batalha legal em que o canal de Balsemão reivindica à apresentadora o pagamento de mais de 20 milhões de euros por quebra de contrato e prejuízos decorrentes -, a agora rosto da TVI lembra que “os contratos têm cláusulas”. “Eu cumpro a minha palavra. Muitas vezes não cumprem comigo. Sobre isso, sobre a vida dos bastidores, não se sabe nada. E eu sou o alvo mais fácil. A impunidade desta hostilidade é um veneno ma sociedade de hoje”, escreve
Livro com 156 comentários distribuídos por capítulos
Pra Cima de Puta apresenta 156 comentários insultuosos que foram dirigidos a Cristina Ferreira, nos últimos meses e nomeadamente após a decisão de rescindir unilateralmente com a SIC para ir para a TVI e a dois anos do fim do contrato. Ataques que lhe chegaram via redes sociais e que agora estão distribuídos por sete capítulos intitulados Convencida, Vergonhosa, Traidora, Manipuladora, Falsa, Exibicionista, Gananciosa.
O livro reúne ainda contributos de especialistas que analisam o fenómeno do ataque online e os efeitos dos mesmos. A jurista Dulce Rocha, a filósofa Joana Rita Sousa, o psiquiatra Júlio Machado Vaz, a socióloga Maria José da Silveira Núncio e o pedopsiquiatra Pedro Strecht participam na obra que conta com prefácio do escritor Valter Hugo Mãe.