David Ferreira, uma criança consagrada?

David Ferreira faz já parte do grupo dos adultos da Moda Lisboa. Desfila dentro da iniciativa Lab, que apoia as pequenas marcas, mas já se afirma como um portento da moda nacional. Não sabemos, no entanto, se adulto é uma palavra em que as criações de David Ferreira se encaixem. Aliás, sabemos que não.

Nada de contido, zero de convencional e muito pouco da coordenação que os comuns mortais, como nós, poriam numa proposta de moda. É por isso que David Ferreira é criador de moda e nós espetadores.

Isto para dizer que a espetacularidade da coleção apresentada nos fez pensar que só era pena a sala do desfile ser tão fria – uma grande galeria pintada de branco. A coleção tem referências ao circo: há um jumpsuit de palhaço, colarinhos e mangas de balão de domador de leões, penas de pavão nas cabeças, casacos cintados a lembrar a época vitoriana, quase tudo em cetim e em seda, de cores garridas – rosas choque, verde alface.

E aqui vamos só na descrição da parte mais simples da coleção. Porque, depois, entram em palco as grandes mangas em tule, que triplicam o diâmetro dos braços; de seguida chegam outras mangas sobredimensionadas em pelúcia, as saias muito justas e os sapatos muito altos – tudo a dificultar os movimentos das manequins.

O público não se cala, pelo contrário, comenta efusivamente as peças. Quando a música baixa por instantes é percetível o burburinho.

Há um “aaaah” generalizado quando entra um casaco de pelo com uns chumaços que elevam os ombros para cima do topo da cabeça da manequim.

E depois o grande final, quando uma saia de tule em camadas que se apertam entre si, cozida na vertical, entra pela passerelle dentro (quase sem modelo quase só saia) e, a cada curto passo que ela dá, parece ver-se um coração a bater.

A esta altura a plateia de oito filas cheias está estupefacta, as palmas demoram a surgir porque depois de tudo esperava-se que entrassem mesmo os leões. David Ferreira agradece, contente. A moda também é isto, senhoras e senhores: espetáculo.