#delasexplica: Quantas vagas tem o feminismo?

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O feminismo foi a palavra do ano de 2017, nos Estados Unidos da América. E o tema volta a estar na ordem do dia como nunca. Por isso, para lá do significado que o vocábulo encerra, é preciso ir à História para perceber há quantos séculos andam as mulheres – e alguns homens – a lutar pelos direitos e pela igualdade. Uma conquista feita passo a passo!

Primeira vaga: Concentrada na busca pela igualdade de direitos entre homens e mulheres, as lutas, ocorridas no século XIX e no início do século XX, travavam-se pela igualdade contratual, pelo igual acesso às propriedades, pelo direito ao voto e contra os casamentos predefinidos que ignoravam as escolhas femininas. É nesta época que as sufragistas ganham destaque e começam por conquistar o direito o voto. Nos EUA as preocupações femininas estendiam-se ao fim da escravatura. No entanto, muito antes desta época foram publicados textos que, à luz dos tempos, pugnavam por alguma igualdade.

E Portugal arriscou-se a estar entre os primeiros com a publicação do livro Dos privilegios &praerogativasq ho genero feminino te por direito comu & ordenações do Reyno mais que ho genero masculino. A obra de Rui Gonçalves foi editada em 1557.

O jurista que defendeu igualdade das mulheres… em 1557

 

Há ainda outros exemplos europeus: A dramaturga, ativista política e feminista francesa Olympe de Gouges chega em 1971 com a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã. Um ano depois, a escritora inglesa Mary Wollstonecraft, em Uma Reivindicação pelos Direitos das Mulheres, de 1792, considerava que o facto de se “nascer mulher” já acarretava consigo o fardo da inferioridade e da opressão. Algo que Simone de Beauvoir tornava ainda mais evidente em 1949, na obra O Segundo Sexo.

Segunda vaga: A francesa Simone de Beauvoir, mas também as feministas norte-americanas Betty Friedan e Kate Millet – e muitas outras pensadoras pelo mundo – começam a lançar as bases para novas lutas das mulheres: a que as coloca sob o alvo da violência, subalternas ao homem, subjugadas por padrões culturais que proclamam a inferioridade da mulher face ao todo-poderoso ser masculino. Nos anos 60 e 70 do século passado, as mulheres prosseguiam na sua busca pela igualdade de direitos tal como na primeira vaga – entre eles, a valorização no trabalho -, mas procuravam o fim da discriminação, o direito ao prazer, queriam libertar-se das amarras, da violência sexual e da própria “mística feminina”. Queriam agarrar o poder e ter mão no seu próprio corpo. É nesta altura que chega a pílula anticoncecional que começaria por mudar, para sempre, o papel feminino na sociedade.

Terceira vaga: Não se trata apenas de uma corrente, mas múltiplas porque as mulheres têm, na sua diversidade, limitações sociais e, nessa sequência, lutas e necessidades distintas que são necessárias colmatar. Chegada nos anos 90 do século passado, esta terceira onda veio pôr em perspetiva as anteriores e tentar colmatar o vazio deixado pelas mesmas em algumas matérias. Falamos em grande parte de uma batalha travada pelas filhas das feministas da segunda vaga e, talvez, por netas das da primeira. Beneficiaram do progresso e de alguma folga económica proporcionada pela independência financeira anteriormente conquistada e puderam olhar para novas reivindicações: ir além na liberdade sexual, a combater o racismo, o classismo, o sistema patriarcal, a discriminação, a lutar contra a violência com histórias de sobrevivência, a redefinir temas e papéis como o da maternidade ou da mulher numa relação.

Quarta vaga: Não há consenso se esta nova onda já está em marcha – se está, terá começado na primeira década deste século – ou se o mundo assiste ainda à evolução da anterior. Porém , há quem relate diferenças que podem ser os alicerces de uma nova onda feminista. Cabem nesta, segundo alguns analistas, reivindicações amplas como a liberdade do corpo, o adeus às formas, padrões e tamanhos corporais e de beleza pré-estabelecidos pela sociedade, a inclusão absoluta e inequívoca do transgénero, o combate total à misandria. Sim, porque não pode haver espaço para o antónimo da misoginia quando esta corrente é inclusiva de todos os géneros, de todos os sexos, de todas as identidades. Falamos por fim de uma nova vaga que já nasceu e vive no digital (com tudo o que isso traz de novo), mas que ainda pugna por pressupostos que sempre faltaram ao sexo feminino: a igualdade de representação em todos os setores. E, essa, como sabemos, ainda recorre à ajuda da lei para definir parâmetros.

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