Denúncias de assédio sexual “apenas no começo”, diz diretora da ONU Mulheres

A diretora executiva da ONU Mulheres, Phumzile Mlambo-Ngcuka, considerou que a avalancha de denúncias de assédio sexual que atinge o mundo do cinema, da música ou televisão nos Estados Unidos está “apenas no começo”.

Em entrevista à agência de notícias francesa AFP, Phumzile Mlambo-Ngcuka afirmou que os comportamentos vão mudar depois de numerosas mulheres terem quebrado o silêncio para revelar as histórias ou expressar a sua vontade de ver o fim dos abusos.

“Isto está a apenas a começar, penso que vamos ver muito mais mulheres a falar”, sublinhou a responsável da ONU, acrescentando: “Elas querem exprimir-se cada vez mais”.

A antiga vice-presidente sul-africana, que defende a igualdade de género na ONU desde 2013, afirmou que, ao mesmo tempo, o ponto de viragem para uma mudança radical de comportamento ainda não foi alcançado.

“Ainda não há pessoas suficientes a pensar” que esses abusos representam “um profundo trauma e uma dor interminável para muitas mulheres”, sustentou.

Nas últimas semanas, centenas de mulheres denunciaram comportamentos passados ou atuais de figuras conhecidas do mundo do cinema, da política ou do jornalismo.

Phumzile Mlambo-Ngcuka afirmou estar surpreendida por ver que, em vários casos, um mesmo homem foi acusado de abusos sexuais por diversas mulheres ou jovens.

“Ver que um mesmo homem é um assediador em série, que ocupa um cargo elevado, e que isso passou despercebido durante vários anos” mostra “uma verdadeira lacuna” no respeito pela aplicação de leis nos locais de trabalho, sublinhou Phumzile Mlambo-Ngcuka.

Segundo a responsável da ONU, a presença de um grande número de mulheres em cargos de direção podia ajudá-las a sair da sombra por “saberem que alguém do outro lado da mesa acreditaria nelas”.

Phumzile Mlambo-Ngcuka afirmou esperar que a vaga de denúncias galgue as fronteiras norte-americanas e vá além das atrizes de cinema.

“A tempestade tem sido perfeita, mas precisa de desenvolver-se para que outras mulheres, que não gozam de fama, possam encontrar também uma forma de cicatrizar e que os responsáveis de outros setores [da sociedade] sofram as consequências pelos seus atos”, observou.

Phumzile Mlambo-Ngcuka também expressou o seu desconforto relativamente ao “grande silêncio dos homens” que não levantaram a voz e não se distanciaram dos predadores sexuais, sublinhando “a importância de uma mudança de comportamento”.

Eles devem dizer “que nunca aceitarão assistir” a tais abusos e aqueles que os praticaram “comprometer-se a nunca mais o fazer”, vincou.

“É preciso que os homens reajam, que também se apropriem do problema, comprometendo-se a tomar medidas para resolvê-lo”, sustentou Phumzile Mlambo-Ngcuka, apontando que os responsáveis políticos dececionam ao afastarem-se do tema do assédio sexual, “talvez por terem medo de abrir uma caixa de Pandora”.

“Não há uma gestão forte” deste dossiê do assédio por parte das autoridades que detêm o poder, lamentou.

Dezasseis dias de ativismo devem arrancar no sábado, decretado Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra a Mulher.

Não existem dados mundiais sobre o assédio sexual, mas estudos europeus mostram que na União Europeia entre 45 a 55% das mulheres, com idade superior a 15 anos, são vítimas.

Imagem de destaque: Reuters


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