Designer Alexandra Moura na Conversa Delas

Alexandra Moura é designer de moda. Aos 44 anos, é vista como uma das mais vanguardistas e mais influentes criadoras portuguesas, com vários discípulos a trabalhar profissionalmente em Portugal e no estrangeiro.

É a única designer portuguesa a integrar as publicações “Young European Fashion Designers”, o “Atlas of Fashion Designers”, o “Mapa da Moda Contemporânea” e o “Fashion Designer Souths Book”. Apresenta as suas coleções em Portugal desde 2002. Na galeria acima reveja a última coleção apresentada pela estilista, no PortugalFashion.

Que balanço faz nestes dezasseis anos de trabalho?

Bem, já é um balanço com algum peso. Já são alguns anos e, neles, houve muitos desafios, projetos, metas conquistadas e muitas ainda por conquistar. Portanto, faço um balanço de muito trabalho, mas sinto que ainda tenho muito mais para fazer e ter muitos mais anos pela frente.

Faço-lhe esta pergunta porque uma das questões mais faladas na apresentação da coleção para a próxima estação fria, no PortugalFashion, em março deste ano, apontavam para o facto de as suas propostas serem um regresso às origens e um balanço de vida. Foi mesmo?

Foi. Se calhar não tanto ao nível do detalhe mais conceptual, puro e duro. Mas sim, foi, sem dúvida, um regresso ao passado para de alguma forma desenhar um bocadinho o futuro, apesar de aquela coleção ser só para daqui a um ano. Mostrei ali muito de mim enquanto criança e adolescente: as minhas crises existenciais, as minhas certezas, as minhas paixões, as minhas referências musicais e cinematográficas.

Isso quer dizer ET, The Jesus and Mary Chain, The Smiths e muitas referências musicais também estampadas?

Sim, muitas referências. Quer ao nível da ilustração pura e dura, quer ao nível de palavras e frases contidas no próprio padrão. Desde os The Smiths e o Blade Runner, que foi um dos filmes que mais me marcou, os Encontros Imediatos de Terceiro Grau… Ou seja, de alguma forma foram sempre referências, quer na música, quer no cinema, com as quais me identificava porque saíam da caixa. Porque iam buscar eles próprios, um acreditar noutras coisas e noutros mundos que podiam existir. E isso fazia todo o sentido porque eu tinha muitos mundos dentro da minha cabeça. Era uma confusão a minha cabeça! E portanto, acabei por me identificar com todos eles.

Alexandra Moura era conhecida na Figueira da Foz, onde morava durante a adolescência, como uma rapariga vanguardista. Estas referências de que fala eram habituais de algum grupo de pessoas, mas não era propriamente mainstream (corrente dominante). Considera que essas referências culturais que tinha na altura influenciaram determinantemente aquilo que faz hoje?

Sim, claro que sim. Essas referências, no fundo, criavam em mim desejos e vontades de conhecer outras coisas e onde, nessa busca de encontrar outras coisas, fui conhecendo chaves essenciais que me fizeram sair das ciências e vir para a moda.

Quer contar-nos como foi essa epifania que teve em Londres, numa livraria? Descobriu ‘Ah! Afinal quero ser designer de moda’?

O design de moda nunca esteve nos meus planos. Não tinha sequer qualquer noção, na altura, de como desenhar roupa. Vivia numa família e num mundo muito ligado às ciências e, portanto, aquilo acabava por me contagiar. E contagiava-me num bom sentido, porque, de facto, amava todo o lado das ciências, da biologia animal, o mundo dos cetáceos – que era uma das paixões -, o lado da astronomia, o universo, e é lá que vou buscar muitas das minhas referências: no silêncio de olhar para o universo. Portanto, não estava, de todo, virada para a moda. Mas, numa viagem a Londres, acabei por encontrar alguém com quem me identifiquei, ou que não era assim tão bicho do mato como eu achava que eu era, e que via o corpo e a forma de estar ao nível da nossa apresentação pela roupa. A forma do que é ser feminina? O que é ser sensual? O que é ser sexy? Os conceitos que existiam, e que para mim não faziam sentido nenhum no senso comum, encontrei-os ao deparar-me com um livro que mostrava o trabalho de Rei Kawakubo, fundadora da marca Comme des Garçons. Deparei-me com uma estética que fez todo o sentido para mim e percebi que, afinal, não estava sozinha nestes meus pensamentos.

Estamos a falar de há 30 anos no qual, em Portugal, a oferta de moda ainda era muito limitada.

Bastante. Como curiosa que era, já conhecia bastante bem a marca Ana Salazar. Aliás, não fazia birras porque já era crescida, mas concentrava todas as minhas forças e o meu foco em preferir não ter e não comprar peças de roupa porque sim, mas juntar e comprar peças da Ana Salazar e depois, também, de José António Tenente. Portanto havia ali um equilíbrio entre a minha forma de estar e de vestir, entre o lado mais concetual da Ana e o lado mais subtil do José António Tenente.

Mas é só quando, em Londres, descobre o trabalho da fundadora da Comme des Garçons, que decide ser designer de moda. Como é que isso acontece? Qual é o processo?

Foi um bocado estranho. Costumo dizer que me meteram em piloto automático e, de repente, acordei nesta área. Foi tudo muito intuitivo e quase que fácil. Fácil no sentido de, às vezes, termos de lutar muito e ter de fazer as provas, as entrevistas de cultura geral e de desenho. E eu nem sequer tinha desenho. Aconteceu tudo de uma forma muito simples. Na altura, conheci o IADE (Instituto de Artes Visuais, Design e Marketing) e, por ser uma escola que não pedia a área do desenho, estava um bocadinho mais à vontade. Tinha algo a meu favor, que era estar na área de ciências e poder ir fazer umas provas em artes, e fui. Correu super-bem e, logo na entrevista, o coordenador do curso da altura, o engenheiro e poeta Melo e Castro, disse-me que eu ficava e ajudou-me a arranjar quarto. Apesar de eu ser de Lisboa, a minha casa estava alugada e eu tinha que ter um sítio para estar. Foi tudo orgânico, muito fluido. O curso correu muito fluidamente e consegui sempre conciliar: fazer o curso, concorrer a provas, fazer outros trabalhos paralelos no mundo da moda, etc. Foi tudo acontecendo até 2002.


Oiça a entrevista na TSF


 

A Alexandra Moura, hoje, já sabe desenhar?

[risos] Sim, a Alexandra Moura já sabe desenhar. Apesar de nunca ter tido formação em desenho, sempre tive elementos na família que tinham uma queda para o desenho e para as artes. O meu avô Rodrigo desenhava super bem e era um autodidata, portanto quero acreditar que tenha ali umas ‘celulazinhas’ genéticas dele que me ajudaram, obviamente, a conseguir ter uma perceção da tridimensionalidade, do desenho, da proporção, da sombra, das linhas, e isso estava muito em mim, não aprendi. Mas, claramente, ajudou-me a fazer aquela prova.

Como é que é o seu processo de criação hoje e como é que se constrói uma coleção e uma marca?

É complexo. Não é fácil. Aliás, hoje em dia, na nossa equipa, costumo dizer que, de repente, todo o processo deu uma volta, o que me balançou um bocadinho. Quando houve esta forte aposta na internacionalização. Uma coisa é quando temos um processo criativo e vamos fazendo coleções de seis em seis meses, obviamente também com um objetivo comercial, de negócio, e porque tem que haver sustentabilidade. Mas eu tinha um processo muito romântico, muito demorado! Quase que sentia que me podia dar ao luxo de ter o meu tempo de criação, a minha pesquisa. Demorava horrores de tempo porque tenho que ter a certeza de tudo o que quero, tenho que ter tudo na minha cabeça para depois passar ao ato criativo e de desenho. E, portanto, antes era assim: pesquisava, desenhava, pensava muito, executava, experimentava ao nível da confeção e nasciam as peças. Neste momento, com o construir de uma marca e com as responsabilidades que tal acarreta, o processo criativo é extremamente rápido, Costumo dizer que ‘só se diverte na moda quem não trabalha nela’, porque é uma área que é, de facto, dura e que requer muito trabalho e abdicação de aspetos da nossa vida em prol de corresponder às solicitações e aos objetivos. Muita gente depende de nós e vice-versa. Obviamente que o processo criativo é muito amadurecido na minha cabeça, quase que em silêncio. Ainda estou a fazer a coleção de inverno, mas, em simultâneo, já estou a pensar na coleção de verão. Ou seja, estou a ir ganhando “tempos” na minha cabeça ao nível dessa tal pesquisa e para, rapidamente, poder chegar a um consenso de peças, a um line-up, como se costuma dizer. São as peças que vão integrar a coleção, porque antes de elas serem apresentadas num desfile há todo um processo. A parte da modelação, que é mais demorada, a confeção, em que temos de dar tempo a quem trabalha connosco para a pesquisa de tecidos. Esta é uma área à qual dou muito valor seja pela qualidade dos tecidos, pela origem, pelo cheiro, tudo isso é muito importante. Portanto, há o tempo dessa escolha, há o tempo de ter que chegar, há o tempo de ter que passar à confeção para as pessoas poderem confecionar. Ou seja, o tempo que eu tinha de criação ficou o mais “castigado”.

Estamos a falar de quanto tempo? Ou seja, a Alexandra Moura tem uma ideia e faz uma pesquisa para perceber se essa ideia pode ser alimentada? É este o processo?

Não. A pesquisa já é para alimentar a ideia que eu tive. Não consigo ter tempo para poder experimentar ou perder tempo numa pesquisa que, se calhar, depois não a sigo. A pesquisa vai servir para consolidar ideias que me vão ajudar no desenvolvimento criativo, nos detalhes da coleção, mas já tenho que ter pensado muitas coisas antes para ter ganho esse tempo.

E do princípio ao fim, quanto tempo é que demora?

As coleções são apresentadas sazonalmente, pelos desfiles. Mas lá está, se calhar dois e três meses antes é apresentado o show room, a época de vendas. A coleção que apresentei agora em março, que foi para o inverno 2018/2019, começou com uma ideia do que ia fazer para o verão de 2019 e, neste momento, já tenho o próximo show room em Junho, a estação de Homem. O que quer dizer que já estive a fazer todo o lado de pesquisa, que já estive a desenhar a coleção masculina e que, nesta fase, já estão a ser produzidos os protótipos e a modelação feita no Homem.

Portanto, está a fazer vários trabalhos ao mesmo tempo?

Sim.

Porque é que se decidiu pela internacionalização? A Alexandra Moura agora vende fora e a percentagem de vendas é superior àquela que consegue fazer em Portugal?

Sim, claramente. Apesar de sempre ter querido trabalhar no meu país e de adorar o meu país, e de ter a consciência que Portugal está a evoluir numa cultura de moda, ainda não está no ponto de a entender alguma e de a consumir. As pessoas, de alguma forma, gostam e acham muita graça ir a desfiles, mas não consomem a moda. Há muitas coisas por trás e de caráter cultural. Umas porque, de facto, ainda não há uma grande cultura de moda, não há uma cultura visual de moda. Outra, porque ainda há um certo estigma por se tratar de uma marca portuguesa e, ainda outra, porque há um equívoco na cabeça das pessoas em acharem que as nossas roupas são caríssimas em relação a muitas outras.

E não são caríssimas?

Não, não são caríssimas, de todo.

De que valor que estamos a falar?

Cada marca tem o seu público-alvo. Eu fui começando a trabalhar e percebi que a marca evoluiu para um target médio alto, mas porque foi a minha opção. Percebi que, também na conjuntura do meu país, eu não podia estar a trabalhar para uma classe média, pelas razões que sabemos.

Porque a classe média tem poucos rendimentos?

Exatamente. E porque, de alguma forma, o meu produto não sai, à partida, “baratinho”. Tem o seu valor. Os tecidos são pensados de forma a terem bastante qualidade, a mão-de-obra é justa, tem um preço justo. Todas as costureiras, de alguma forma, trabalham o tempo que têm de trabalhar e não lhes é pedido ou regateado o preço, obviamente. E, portanto, nunca vai ser demasiado acessível. Por isso, o nosso caminho começou a ser essa tal classe média alta e alta, porque o produto assim o pede. Comecei a perceber que, em Portugal, não é fácil trabalhar nesses nichos de mercado. Ainda há muito aquele conceito de “há dinheiro, compra-se a griffe internacional”, e fui percebendo que, lá fora, o impacto da nossa marca e do nosso design era enorme, o feedback era incrível. As pessoas entendiam-nos.

E consegue perceber porque é que há essa diferença entre, por um lado a perceção do que é a marca portuguesa, depois do que é português? Pelo que diz, o made in Portugal, no estrangeiro, é uma coisa boa.

É muito boa e extremamente valorizada. Porquê? Porque lá fora eles percebem que há uma boa qualidade. E existem uma série de valores, não só materiais, mas éticos também atrás das marcas. E nós falamos muito sobre isso com os nossos buyers – os compradores de moda. Eles próprios nos perguntam não só a origem dos tecidos, bem como o tipo de matérias-primas que colocamos nos forros, quem são as pessoas que estão por trás da confeção daquelas peças, e nós não temos vergonha nenhuma em dizer do que é feita a nossa roupa.

E quem são essas pessoas que confecionam?

São profissionais que têm os seus atliês ou as suas pequenas fábricas, que vieram de outras grandes fábricas. Umas porque faliram, outras porque, enfim…a indústria têxtil no nosso país tem estes altos e baixos. E houve muitas pessoas que ficaram desempregadas e foram construindo os seus próprios atliês, o que foi maravilhoso porque, na altura, não trouxeram os seus ordenados, mas trouxeram as maquinarias que lhes permitiram começar uma vida nova. E nós fomos descobrindo essas pessoas, fomos conhecendo esses sítios e, até hoje, trabalhamos com elas.

Alexandra Moura [Fotografia: Reinaldo Rodrigues/Global Imagens]

A Alexandra disse que “só se diverte na moda quem não trabalha nela”. Como é que vê o estigma que há sobre o trabalho de moda?

Todos temos noção de que quando se fala em moda – mas também um bocadinho por culpa de quem passa as imagens, do que é mostrado ao público – é como se se tratasse de um evento carnavalesco. E depois veem-se aquelas pessoas todas que giram à volta e que vão assistir a desfiles e tudo parece um bocadinho volátil e pouco credível. A moda é muito mais que isso, alberga imensas áreas de profissionais diferentes, em que o trabalho é árduo, duro e para o qual temos de ter muita concentração para conseguir corresponder a esses timings, aos altos e baixos do próprio mercado. Agora as compras estão a ser feitas de uma forma, daqui a seis meses tudo pode mudar, o que causa desequilíbrios emocionais dentro das próprias empresas. Temos de ter estruturas bastante fortes, emocional e psicologicamente, para aguentar um feedback que varia: em que numa estação foi para a direita e que, neste momento, está para a esquerda. Temos que adaptar o design, a roupa, a estratégia e a comunicação da empresa, e tudo quase mensalmente. Claro que causa níveis de stresse, horas de trabalho, muita reflexão e muito pensamento para conseguirmos ter tudo certo no momento certo. Mas, muitas das vezes, temos de ser um bocadinho gestores, um bocadinho contabilistas, de marketers e de vendedores. Consome e não nos dá muito tempo nem muita paciência para andar neste “tal lado” que as pessoas acham que a moda tem, mas que, de facto, só tem para os que estão a assistir, ou seja, para os que não estão inseridos, não estão dentro.

A Alexandra Moura apresentou a última coleção, como as anteriores, no PortugalFashion. Foi com esta associação de moda apresentar o seu trabalho em diversas semanas internacionais. Que apoio é que este tipo de associações traz, de facto, para o negócio?

Trazem bastante. Nós, como marca portuguesa e mesmo muitas marcas pelo mundo, não têm capacidade financeira para projetar um desfile numa London Fashion Week, com valores completamente loucos. E sozinhos nunca conseguiríamos ter uma capacidade destas. Portanto, estes apoios são fundamentais para que possamos estar nessas plataformas internacionais, onde muito mais facilmente chegamos aos buyers e, portanto, à venda.

O resultado desta colaboração significa um aumento do valor de negócio para as marcas portuguesas?

Sim, sem dúvida.

Onde é que se compra mais? Nos desfiles ou nos showrooms?

Antigamente, tínhamos os desfiles, em que as manequins até passavam com números, para que o fato, a seguir, pudesse ser logo comprado. Neste momento, aí não se vende nada. Os desfiles são momentos de statement, que ajudam a reforçar os conceitos das marcas, a criar o barulho à volta das marcas, que cria o desejo no cliente e que assegura a venda ao comprador – ao buyer -, e, por isso, é que um desfile é sempre depois do showroom, em que as peças já estão encaminhadas para venda.

Falava da quantidade de trabalho que é preciso ter no mundo da moda. Mas, além dele, ainda dá aulas. Como é que tem tempo para ir a Castelo Branco ensinar aquilo que faz?

Tenho de o arranjar. Depois começa a ser mecânico nas nossas agendas. Acabamos por conseguir construir e a organizar o trabalho de forma a poder encaixar tudo. Sabemos que naqueles dois dias não estou e, portanto, à segunda-feira, tudo é organizado para poder decorrer autonomamente na terça e na quarta. Quando chego, na quinta, fazemos o ponto de situação daqueles dois dias e é assim que nos vamos conseguindo gerir. Mas, sim, de facto estes dois dias acabam por me tirar umas boas horas do atliê, o que sobrecarrega os dias que se lhes seguem. Por outro lado, também consegui ganhar amor a dar aulas, que era uma coisa que nunca tinha pensado na vida. Não achava sequer que fosse possível eu ter de estar a falar para outras pessoas e de as ensinar. Mas aconteceu e já estou quase a caminho dos 15 anos de aulas.

E isso aconteceu por reivindicação dos alunos?

Sim. Na altura, quando fui convidada para dar um workshop, os alunos que ainda estavam em fase de escolha para um professor, que era para a disciplina design de moda. Eles juntaram-se, falaram com o diretor da escola e sugeriram-lhe que fosse eu a dar as aulas.

E esse amor dos alunos por si continua?

Acho que sim, uns mais que outros, com certeza. Mas nós não agradamos a toda a gente e nem tenho essa pretensão. O ser humano é mesmo assim, tem as suas químicas normais e fisiológicas em relação aos outros, na maneira de ser e de estar, mas creio que todos aqueles que querem aprender e que têm amor àquilo que estão a fazer, com certeza que veem em mim um grande braço direito.

Como é que a Alexandra Moura vê trabalhos como o dos Marques’Almeida, a dupla portuguesa que trabalha em Londres, e de outras pessoas que foram suas alunas e que estão aí a mostrar o trabalho, em grande, no mundo da moda?

Com muito orgulho. Eles também foram uns grandes lutadores. Acompanhei o processo deles irem para Londres e a forma como tudo começou. E fico muito orgulhosa pelo sucesso que têm.

Mas no caso dos criadores que desfilam atualmente e que foram seus alunos, é possível identificar algumas linhas. Como é que vê essa posição de líder e discípulos no mundo da moda?

Sempre me guiei por um lema que esteve presente no meu subconsciente e, agora, mais do que nunca, no meu consciente, e que é: um bom mestre apercebe-se que é bom quando consegue colocar o seu discípulo melhor do que ele próprio. Ele não deve ter medo disso porque significa que, então, é um bom mestre. Todos vivemos de referências, no mesmo planeta, absorvemos as mesmas coisas, há sintonias estéticas e, portanto, só posso sentir-me lisonjeada com algumas coisas que possam acontecer a esse nível. E fico muito contente se tiverem sucesso, claro.

E no dia-a-dia, o que é que a Alexandra Moura recebe dos seus alunos? É verdade que dar aulas renova mais rapidamente a forma de ver o mundo?

Sim. Por exemplo, quando estou dentro de uma sala de aula, tenho quase 40 alunos e, portanto, 40 universos diferentes, temas diferentes, conceitos diferentes, maneiras de ver a moda diferentes, éticas completamente diferentes e, do primeiro até ao último, tenho que estar sempre a 100%. Tenho que estar sempre ao mesmo nível para todos, a dar-lhes o feedback, os conselhos, a trabalhar com eles esteticamente e, claro, isto alimenta a nossa maneira de ver as coisas. Parece que estamos constantemente rejuvenescidos nas ideias. Tudo é uma troca.

Quem estuda Design Moda consigo vai ser o quê quando for grande?

Espero que façam o que têm nos seus sonhos e no seu querer. Mas tenho também a plena consciência que muitos, talvez por não terem a certeza desse sonho e dessa força de vontade no trabalho, provavelmente não farão nada nesta área. E a realidade é esta, o próprio filtro natural da vida esta sempre a funcionar. Não vamos achar que todos os anos, em turmas de 40 alunos, todos vão ser designers de moda. E ainda bem que não vão ser, se não também o mercado ficava saturado. É bom que eles percebam que, mais importante do que construir uma marca no “hoje”, em que já existem tantas e tanto sufoco ao nível do design, é bom integrar uma equipa e fazer alguma coisa de positivo na área.

Que características é necessário ter para se ser uma designer de moda importante, relevante e com uma marca forte?

Tem que ter muito amor àquilo que faz, perseverança, resiliência, níveis de tolerância elevados e uma forte solidez emocional para conseguir ter tantos jogos de cintura quer ao longo de um dia de trabalho – e conseguir acabar o dia minimamente bem –, quer ser capaz de conseguir trabalhar no dia a seguir. Portanto, é preciso ter algumas coisas, sim.

Imagem de destaque: PortugalFashion