Dior: 70 anos de marketing da felicidade

 

Roupa feminina, como deve de ser, tem que ser Dior. Desculpa camarada feminista, que antes de o ser já eras rapariga. Para celebrar os 70 anos da Casa Dior, o Museu de Artes Decorativas de Paris traz até janeiro do próximo ano a exposição retrospetiva “Christian Dior, Costureiro de Sonho”.

Quero lá saber da Porto Editora, da Pantone e dos teoristas trendy todos. Há ser-se mulher, (há até homens que o quereriam muito ser!) e há o resto. E neste ser-se feminino não há como Dior para o vestir. Não é uma coisa de género, é uma coisa de ser: de ser grácil, delicado, impecável e etéreo.

Dior cravou as agulhas no mundo com o New Style, um estilo que gastava pelo menos quatro metros de tecido numa saia, depois de décadas a vestir saias travadas porque não havia tecido para mais ou que já tinha antes sido cortina.

A marca surgiu em 1946, depois de duas Grandes Guerras Mundiais, três décadas de saias justas, acanhadas, má comida, fatos de macaco e 10 horas de trabalho na fábrica. A Dior abriu loja com atelier logo atrás (como deveria ser sempre aliás) em 1946. E vendeu como ninguém a ideia de ser rapariga em tempos de progresso e felicidade. Depois de casacos de lã tricotados à lareira e calças de ganga o que as mulheres queriam eram marcar a cintura, mostrar as costuras das meias novas e ser felizes.

Esse é ainda o critério de escolha dos novos ‘diors’, podem vir do submundo, da alfaiataria ou do sportswear, mas têm que ser sempre assim, gráceis, delicados, impecáveis e etéreos. A exposição “Christian Dior, Costureiro de Sonho”, traz assim não só a visão original do mestre mas também a dos seus cuidadosamente escolhidos sucedâneos: Saint Laurent, Galliano ou Raf Simons, estes e todos os outros, os raros que conseguem apanhar a visão de Dior, conseguem médio, que igual a Christian não há.

São mais de trezentos gowns de alta costura- não há tradução certa para português, na altura da criação e desenvolvimento modernos do vocábulo gown, Portugal era pobre, triste e ignorante. Gown designa um vestido desenhado e realizado propositadamente para alguém concreto em alguma situação. Com todo o trabalho, tempo e equipa que tal implicar (método que por vezes se traduz, ainda, em fortunas).

Para além dos gowns em si, do melhor de Dior e seus ‘herdeiros’, a exposição traz toiles de originais, fotografias, ilustrações acabadas e esquissos, cartas e todos os acessórios que complementam e reforçam o intento dos criadores: chapéus, joias, malas, sapatos e a tão relevante indústria da perfumaria, que em termos financeiros é muito mais que um negócio paralelo.

A última exposição anterior parisiense dedicada ao costureiro foi também aqui, no Museu de Artes Decorativas, em 1987, mas versava apenas a década de arranque da Casa Dior, 1947 a 1957. Esta exposição a decorrer é totalmente abrangente e abarca as 7 décadas de história da Casa: para além do mestre, são mostradas as obras dos seis diretores artísticos que se foram sucedendo ao longo destes 70 anos: Saint Laurent, Marc Bohan, Ferré, Galliano, Raf Simons e Maria Grazia Chiuri, a atual ‘herdeira’ de estilo. Todos eles escolhidos pela sua própria sensibilidade artística e, mais relevantemente, conseguirem ser fiéis à narrativa e ao conceito original de Dior, apresentando-o relacionado com as suas próprias épocas e costumes.

Exposição “Christian Dior, Couturier du Rêve”

Museu de Artes Decorativas, 107 Rue de Rivoli

75001 Paris

Horários e bilheteira: www.lesartsdecoratifs.fr

João Galvão