“É lamentável que tantas mulheres tenham de esconder que são mães”

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[Fotografia: Shutterstock]

Catarina Campos tem 28 anos e é mãe de quatro filhos: dois rapazes e duas raparigas de 7, 5, 3 e um ano. A jurista estreou-se bem cedo na maternidade, o que justificou, conta ao Delas.pt, a necessidade de levar a descendência consigo “para a faculdade, para não perder as aulas”. Decidiu, pouco tempo depois, que era altura de mudar de rumo, de largar o trabalho, e optou por ficar em casa com os filhos. “A certa altura percebi que uma filha minha, em bebé, era mais insegura e precisava de mim. Decidi ser o que hoje em dia se chama de stay-at-home-mom (mãe em casa, em tradução livre)”, revela.

Para esta mãe a tempo inteiro, Catarina lamenta que “muitos falem, mas poucos saibam realmente o valor dessa condição”. “Não há apoios, não somos pagas, o trabalho, a curto prazo, é invisível, causa um enorme desgaste físico e psicológico e existe ainda, até mesmo entre mulheres, uma certa aura de ‘coitadinha, por estar em casa a tomar conta dos filhos’, como se fosse uma forma menor de se ser mulher ou um atestado direto de fraca capacidade intelectual”, analisa.

E se os outros acham que é fácil, para Catarina foi duro dar este passo de ficar em casa com os filhos. Uma decisão sem ânimo leve. “Na altura foi muito difícil porque gosto muito de estudar, de aprender, de debater. Mas não tenho qualquer dúvida de que foi a melhor decisão. Foi um caminho longo, mas valeu cada segundo. Que sentido teria a minha vida se me esforçasse imenso para os meus trabalhos académicos e não me desse completamente aos filhos que gerei?”, interroga-se.

“Quando foi preciso, levei os meus filhos para a faculdade, para não perder as aulas. Quando foi preciso, larguei tudo para os socorrer”

Catarina Campos é uma das três mulheres que a que edição especial em papel do Delas.pt – que chega este domingo às bancas com o Diário de Notícias – deu voz, numa matéria que procura olhar para as mulheres e a maternidade como um todo: as que são mães e que adoram e precisam de trabalhar para manter a sanidade mental, as que se dividem em dois turnos porque precisam dos rendimentos, as que escolheram ficar em casa e as que não querem ter filhos e não acham graça que lhes perguntem se está arrependida. Múltiplas opções, onde a da leitora também caberá, mas todas – sempre todas – criticadas pela sociedade.

Falta de apoios e viabilidade económica difícil

Há vários anos em casa, Catarina aponta a “falta de apoios e reconhecimento” e vinca que “é muito difícil haver viabilidade económica estando em casa a tempo inteiro. Por outro lado, os horários de trabalho dificultam em muito que uma mulher consiga estar a horas em casa, com os filhos.”

Para esta jurista, já é “tempo de compreender que uma mulher que gere uma casa e filhos tem necessariamente índices de produtividade altos, porque é essa a sua vida”. Considera ainda que “é preciso reconhecer os benefícios que a maternidade e a família trazem à capacidade de trabalho e ponderá-los face às restrições naturais que existem na disponibilidade de uma mãe de família. Só assim será feita uma verdadeira discriminação positiva”.

“Não existe emancipação da mulher enquanto não se puder escolher livremente formar uma família e ter os filhos que se quiser sem que o ‘chefe’ entre nessa equação”

Num segundo aspeto, esta mãe de quatro lembra que “se a dimensão familiar for respeitada e tida em consideração, por exemplo, na questão dos horários, a motivação para o trabalho será maior”. Num terceiro nível, Catarina lamenta que “tantas mulheres tenham que esconder que são mães ou tenham que hipotecar o seu projeto familiar com receio de não poder prosseguir uma carreira”. Afinal, refere: “Não existe emancipação da mulher enquanto não se puder escolher livremente formar uma família e ter os filhos que se quiser sem que o ‘chefe’ entre nessa equação”.

“Crianças precisam da presença dos pais”

A maioria das mulheres portuguesas trabalha fora de casa. Ao fim do dia, têm à sua espera toda uma lida doméstica e filhos para cuidar. Estes dois turnos justificam-se porque é preciso obter rendimentos. Uma imposição à qual é impossível escapar.

Catarina Campos tem consciência disso como ninguém e fez a escolha: “As crianças estão na creche desde os quatro meses (tempo mínimo consignado pela lei num contrato de trabalho a termo) porque as mulheres não têm outra opção, e isto é inadmissível. As crianças precisam da presença dos pais, e em Portugal é muito difícil garantir esta presença”. Afinal, lembra esta mãe a tempo inteiro e num claro contrato sem termo, “crianças equilibradas geram adultos equilibrados e felizes, e isso reflete-se, no futuro, na sociedade e no país”.

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