Entrevista a Daniela Ruah: “No meio masculino sou a outra, num país católico sou judia”

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Fotografias: Instagram Daniela Ruah e Rui Pedro Pereira

É no centro histórico de Torres Vedras que, regressada dos Estados Unidos, Daniela Ruah andou por estes dias a gravar Os Vivos, o Morto e o Peixe Frito, uma das películas que a RTP1 vai estrear e que integra o lote de filmes de 60 minutos de “Contado por Mulheres”, que aposta em realizadoras como Cristina Carvalhal, Anabela Moreira ou Maria João Luís. Trata-se da segunda aposta na realização, depois de ter realizado, em Los Angeles, nos Estados Unidos, um dos episódios da série Investigação Criminal, na qual protagoniza a agente Kensi.

“Aprendi muita coisa com a realização do episódio, mas já tinha aprendido muita coisa como atriz. Quando comecei a realizar, nos Estados Unidos, foi um bocadinho com um empurrão de vários amigos, um deles o Diogo Morgado”, lembra a atriz, em entrevista ao Delas. “Com os movimentos do empoderamento feminino há espaço agora para darmos esse passo, sem ter pessoas a dar-nos para trás. Para agarrar essa oportunidade tinha que ser agora”, acrescenta Daniela Ruah, que se justifica: “Os produtores gostam de trabalhar com quem conhecem e confiam. A produtora Ukbar criou este projeto do ‘Contado’ para dar oportunidades a mulheres e inserirem-se neste meio. Todas nós ou somos atrizes, ou viemos do meio da publicidade, temos até uma bailarina. Nos Estados Unidos ainda pensei em tirar um curso, mas uma amiga disse-me: ‘Abre os olhos! Tu vives dentro de uma escola de cinema. Mesmo! Senta-te com editor, com os câmaras e percebe porque é importante aquilo que eles fazem’. Comecei a perceber muito melhor e hoje consigo aproveitar-me de todos esses talentos para enriquecer o que estou a fazer.”

Casada com o duplo David Paul Olsen, a atriz confessa que, depois de a ter impulsionado a apresentar o Festival da Eurovisão da Canção realizado em Portugal, foi também o marido quem a questionou o que gostava de fazer se não fosse intérprete: “Ele perguntou-me e fiquei preocupada porque não sabia responder. Mas agora sei que, se algo na carreira de intérprete correr mal e não tiver trabalho como atriz, posso produzir o meu próprio filme”.

“Nos Estados Unidos os episódios têm 42 minutos, aqui vou em 60 e, por este andar, vou conseguir realizar uma longa-metragem de 90 minutos”, brinca a artista, que é uma americana que cresceu na Europa e realiza um filme africano escrito por Ondjaki. “Estava à espera dessa pergunta, que é pertinente. Perguntei-me ‘porquê eu?’ neste projeto. Posso não saber o que é ser uma africana em Portugal, mas sei o que é ser emigrante cá, em Londres e nos Estados Unidos. Nasci lá, cheguei a Portugal com seis anos e voltei para os Estados Unidos com 23, como emigrante, a habituar-me às pistolas e políticas malucas. Tenho noção do que é ser o outro, porque no meio masculino eu sou a outra, como mulher, num país católico eu sou judia, eu sou diferente da cultura. Mas posso inserir-me e assimilá-la. Isto dá-me uma forma de ver e viver a minha vida de forma um bocadinho a diferente. Eu é que tenho de me adaptar ao sítio onde estou, mas não é por isso que perco a minha identidade, posso adaptar-me e viver o dia a dia, mas não deixo de ser eu”.

Entretanto, Daniela Ruah volta a 15 de julho para gravações nos Estados Unidos. “Tenho cá os meus filhos, vou aproveitá-los aqui com os meus pais. Já não vinha cá desde 2019. Fiz A Espia, depois o meu pai teve um AVC, passei por Lisboa novembro desse ano. Os meus filhos já estiveram com ele e já demos beijinhos e abraços. Está tudo a voltar à normalidade”, remata Daniela Ruah.