Num país em que se estima que 50 mil pessoas sofra com a epilepsia, de que forma os tempos recentes puderam ou não desencadear episódios desta natureza para quem já padecia da doença? Mais do que estarem na origem da doença, há muito que se discutem as causas “psicológicas” da doença, de que forma se relacionam com o stress, ansiedade, angústia e depressão agudizam uma condição já existente.
Ao Delas.pt, José Pimentel, neurologista do Hospital CUF Descobertas e no Hospital de Santa Maria e professor da Faculdade de Medicina da Faculdade de Lisboa, explica o que está na génese da doença e deixa caminhos para melhor lidar com ela.
Qual a incidência da epilepsia?
Estima-se cerca de 50 casos por cem mil habitantes por ano e uma prevalência de cerca de quatro a seis casos por mil habitantes, provavelmente muito mais nos países em desenvolvimento. Há dois “picos” de incidência relacionados com a idade: crianças e idosos. No primeiro grupo, mais epilepsias de causa “genética” (não obrigatoriamente hereditárias), no segundo, mais epilepsias ditas “estruturais”, relacionadas com acidentes vasculares cerebrais (“tromboses”), traumatismos cranioencefálicos graves, tumores, demências, por exemplo. Em Portugal, calcula-se que haja cerca de 50 mil pessoas com epilepsia.
Que fatores mais desencadeiam a doença?
As causas ligadas a alterações de genes existentes em algumas células do cérebro (neurónios) que alteram, no sentido de aumentar, a comunicação entre eles, e causas ligadas a alterações dos circuitos que fazem a comunicação entre essas células, como sejam as referidas para as epilepsias dos idosos.
O que interfere mais no desencadear de episódios e em que medida fatores como stress, ansiedade, angústia sobre o futuro podem promover isso mesmo?
Discute-se há muito se causas “psicológicas” relacionadas com o referido stress, ansiedade, angústia, depressão podem causar, ou melhor e mais corretamente dizendo, agravar o controlo de uma epilepsia já existente. O que é certo é que, na minha longa experiência com pessoas epilépticas, essa causa foi e é repetidamente referida pela pessoa, sem que outras, mais óbvias, houvesse. Há anos, um artigo científico publicado numa boa revista de epilepsia veio demonstrar que sim, é verdade, estes fatores podem agravar, não provocar, uma epilepsia.
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De que forma o isolamento social promove o surgimento desta condição ou a existência de crises?
O isolamento social neste caso concreto da pandemia que presentemente vivemos, pode ocasionar as perturbações stress, ansiedade, angústia, depressão, e, com isso, levar a que as pessoas com epilepsia tenham de tomar medicamentos antidepressivos, ou outros, como os neurolépticos, que podem ocasionar o aparecimento de crises epiléptica. Pode, também, levar as pessoas a abandonar a consulta por medo de frequentar um hospital, o que eventualmente pode piorar ou agravar a epilepsia. Por essa razão, têm sido realizadas teleconsultas, as quais, pelo menos para os casos menos graves, são uma boa solução para ultrapassar este receio, lícito e não desejável, de eventual contágio. É até muito provável que possam continuar para lá da pandemia.
De que forma as crises como falta de dinheiro podem potenciar o surgimento destas crises?
A crise financeira que muitas pessoas/famílias sofrem com esta pandemia pode fazer com que as pessoas com epilepsia não tenham os recursos monetários suficientes para comprar a medicação para a epilepsia que deve ser tomada sempre diariamente
Que caminhos? Que soluções?
Assegurar o mais possível as pessoas com epilepsia que a ida às consultas hospitalares devem ser consideradas seguras, desde que com a devida proteção individual. Praticar exercício físico, quer em casa, se for necessário confinamento, quer na rua, embora com o distanciamento devido, uma vez que ele pode ajudar a diminuir o stress e ansiedade. Ter acesso fácil ao seu médico assistente para a pessoa com epilepsia não se “sentir só” e ter noção de que se “encontra protegida”. Obviamente, pensar de maneira positiva quanto a um desfecho favorável da crise, e cumprir as determinações do seu médico.
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