Éric Ménat: “A anorexia favorece sempre a osteoporose”

Dieta

Éric Ménat, médico francês, especializado em dietética, quer combater a osteoporose pela prevenção. O mesmo dizer que é pela nutrição e pelos bons hábitos que se constrói o futuro. Por isso, das dietas sem vigilância aos regimes alimentares, passando pelas mudanças hormonais que as mulheres atravessam, que a vida pode – e deve – ser feita?

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Éric Ménat [Fotografia: Divulgação]

Ao Delas.pt, o médico, homeopata e autor do livro recém-editado Osteoporose: Tratamento pela Alimentação [editora Gradiva, 13,50 €] fala da prevenção por um futuro melhor no feminino. Afinal, falamos uma doença que passa pela fratura da anca e que culmina na incapacitação de cerca de 50% das pessoas e na morte de 20% após dois anos daquele episódio. Números registados em França, porque em Portugal têm outra expressão. Ménat pede, por isso, prevenção para combater esta realidade. Um controlo de danos que começa a anteriori e, geralmente, à mesa.

Dos perigos da anorexia aos danos de regimes alimentares sem vigilância que crescem nesta época do ano, vale a pena perceber o que se pode começar a evitar já hoje.

No que diz respeito à osteoporose, o que quer dizer aos seus pares em matéria de saúde e homeopatia?

Não falo muito de homeopatia para a osteoporose porque isso é uma pequena parte. Temos de dar medicamentos para a doença, esperamos demasiado tempo para fazer a prevenção. O objetivo deste livro passa por explicar que a fratura da osteoporose passa pela higiene de vida, pela alimentação. Na medicina, damos vitamina D e cálcio, mas é um pouco mais complicado, e podemos fazer bastante melhor, seja pela alimentação, seja pelos hábitos de vida.

No seu livro, fala frequentemente que as restrições alimentares que surgem com as dietas são um dos maiores fatores de risco para a osteoporose. Porquê?

Se fazemos dietas para emagrecer sem controlo médico, que muitas vezes as mulheres têm acesso pelas revistas, muito frequentemente podem ser desequilibradas. É que, no início­, as pessoas tendem a cometem excessos. Há estudos que indicam até que as pessoas, mesmo quando fazem dietas prescritas, habitualmente comem, no início, menos 20% do que o que os médicos definiram. Logo, isto cria carências. Quando se emagrece e se engorda depois, perdemos gordura e músculo porque, frequentemente, estes regimes são pouco ricos em proteí­nas. Mas, quando se volta a engordar, um mês ou seis depois, de pouco a pouco, perdemos o músculo. E sabemos que o osso, a massa óssea segue a massa muscular. Quando perdemos massa muscular perdemos também, em geral, massa óssea, porque essa estrutura tem proteínas. E sem elas­, o cálcio não se pode fixar.

“Há estudos que indicam até que as pessoas, mesmo quando fazem dietas prescritas, habitualmente comem, no início, menos 20% do que o que os médicos definiram”

Todas as pessoas que fazem dieta estão em perigo?

Não, tudo depende da forma como a fazem. As dietas tornam-se perigosas quando não são acompanhadas, quando são feitas de motu proprio e em modo iô-iô. As pessoas que o fazem privam-se de comer, seja porque vão à praia ou porque se vão casar. Penso que em Portugal, creio que numa realidade muito parecida com aquela que se passa em França, a população não tem carência de proteínas, mas há um conjunto de pessoas que não olham para esta circunstância. Falo do veganismo, do vegetarianismo e de muitos regimes que seguem.

Todas essas pessoas correm sérios riscos de terem, no futuro, fraturas no colo do fémur?

Na osteoporose, há sempre um fator genético. Mesmo as pessoas que comem mal podem ter algum risco, mas há que considerar a hereditariedade. Há, depois, a questão do desporto, a ingestão de bebidas gaseificadas, o tabaco… Não é apenas o facto de emagrecer que é perigoso, falo mais de um regime desequilibrado que pode levar à doença.

“Não é apenas o facto de emagrecer que é perigoso, falo mais de um regime desequilibrado que pode levar à doença”

Qual a importância do desporto?

Esse é mesmo o fator número um. Costumo usar o exemplo dos cosmonautas que, mesmo sendo maioritariamente masculinos, com uma alimentação saudável, com saúde, convivem com o facto de não terem pressão atmosférica, o que não ajuda no que diz respeito à massa óssea. Eles são um exemplo do quão importante é o exercício fí­sico.

E qual, então, a solução?

Idealmente, deve-se praticar exercício­ 30 minutos por dia ou uma hora três vezes por semana. Tudo o que for feito a mais, melhor. Já para não falar que ajuda a combater a obesidade.

Estamos na primavera, virá o verão, sinónimo de restrições alimentares. O que pensa, como médico, sobre esta época do ano?

Escrevi dois livros sobre obesidade. Não sou contra as dietas, afinal, do outro lado, também sabemos que a obesidade cria, entre outros, problemas de diabetes e cancro. Não digo que não seja preciso fazer dieta, digo é que deve ser feita de forma equilibrada. Durante muito tempo dissemos a todos que era preciso evitar as gorduras para emagrecer, mas isso não era a verdade.

Não?

Garanto que não. É preciso combater o açúcar. É preciso reduzir a gordura má, não a boa. É preciso consumir as boas proteínas, são muito importantes.

Numa altura em que os alimentos transformados dominam grande parte das refeições das pessoas, onde é que elas podem encontrar as boas gorduras?

Não conheço bem os hábitos alimentares dos portugueses, mas creio que é fácil comer bem, não sendo necessariamente mais caro. É possível comer peixe, boa carne, ovos, aves em Portugal. Não precisamos de comer comida processada, transformada. É possí­vel encontrar boas proteínas magras e acredito que, a partir dos hábitos culinários portugueses, tal não seja difícil­. Falo de proteí­nas magras e de qualidade e legumes. Pode custar talvez um pouco mais caro, mas não creio que a diferença seja grande.

“Creio que é fácil comer bem, não sendo necessariamente mais caro”

Temos cada vez mais perturbações alimentares, estão a crescer e em idades cada vez mais jovens. Quando as restrições decorrem de anorexia, as pessoas que passaram por isso vão ter, definitivamente, osteoporose no futuro?

Quase sempre. Há dois tipos de osteoporose: a do colo do fémur e a da coluna vertebral. Esta atinge sobretudo as mulheres. E a primeira atinge 2/3 das mulheres e 1/3 dos homens. Normalmente, aos 50 a 55 anos, por altura da menopausa, as mulheres têm tudo bem no que diz respeito ao fémur, mas as perdas nas vértebras podem ser maiores. Muito frequentemente, encontramos casos com essas idades cuja condição denuncia uma alimentação carenciada na infância ou uma doença que as obrigou a estarem deitadas por longos períodos. As mulheres que passaram por episódios de anorexia, sobretudo entre os 14 e os 25 anos, não fabricaram o osso que deveriam e, por isso, terão carências de stock relevantes. Não o formaram em tempo e terão uma estrutura óssea fraca. Frequentemente, quando tiverem a sorte de saírem da anorexia, aos 25 anos, elas voltam a comer normalmente, mas aos 50 terão um stock de osso muito mais fraco. A anorexia favorece sempre a osteoporose.

“Os distúrbios alimentares são mesmo um problema verdadeiro. Há riscos de osteoporose”

Falamos de um perigo de epidemia?

Os distúrbios alimentares são mesmo um problema verdadeiro. Há riscos de osteoporose.

Fala de alimentação, mas também de suplementação. Quanto dinheiro é preciso uma pessoa gastar, em média, para evitar a osteoporose?

Creio que muito pouco, francamente. É preciso vitamina D, e quase tudo o resto podemos encontrar na alimentação­. Temos o sol, mas damo-nos conta que tal não está a ser suficiente. Há cada vez mais carências e cremos que uma das pistas tem a ver com a questão do colesterol, porque a vitamina D é fabricada dessa forma.

Luta contra o colesterol está a baixar a produção de vitamina D no corpo?

Essa questão da menor produção de vitamina D pode passar a vir, no futuro, a ser hereditária?

Isso pode fazer a diferença. Grave, grave? Bem, não será preocupante, mas pode ser uma hipótese provável.

Numa altura em que o número de pessoas intolerante ao leite cresce, como podem elas ir em busca do cálcio, elemento determinante no que diz respeito à prevenção da osteoporose?

É fácil. Se se tem intolerância ao leite e derivados – e não apenas à lactose -, há muitos alimentos vegetais com cálcio como, por exemplo, as amêndoas. Mas é impossí­vel cumprir os níveis de cálcio, mesmo que se ingiram os derivados de lacticí­nios. se não os comemos, a suplementação é mesmo necessária. E muito pouco caro e é muitas vezes comparticipada. Depois, é preciso vitamina B12, que creio que também não é cara. Há ainda depois a silícia, um pouco mais cara, e mesmo necessária quando há osteoporose.

Que recomendações deixa a todas as mulheres que estão a atravessar a menopausa?

Aos 40 e 50 e até aos 60 anos, é importante vincar que ainda há tempo no que diz respeito à osteoporose. É importante comer corretamente proteínas em número suficiente, ter uma alimentação pouco ácida, medir a vitamina D, ingerir cálcio tomando suplementação, ingerir lacticínios­, se toleráveis, e fazer exercício fí­sico.

E a suplementação hormonal na menopausa?

Na osteoporose há dois aspetos a ter em conta: o primeiro, é que o tratamento da menopausa não é o da osteoporose. Num segundo aspeto, o tratamento da menopausa uma vez tomado, pode permitir ­proteger as vértebras (sensíveis às hormonas). Tal não acontece com o colo do fémur, que é mais sensível à alimentação.

Imagem de destaque: Shuterstock

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