Escutismo: o que o movimento faz às raparigas

Hoje são cantoras, ativistas, atrizes ou jornalistas. No entanto, independentemente do percurso profissional que escolheram, estas mulheres têm em comum o facto de terem frequentado um movimento: o escutismo. Veja na galeria quem são elas e o que o movimento lhes trouxe como mulheres.

No Dia Mundial do Escutismo, que se celebra esta segunda-feira, 23 de abril, o Delas.pt foi ouvir testemunhos de mulheres que passaram pelo Corpo Nacional de Escutas (CNE) para lhes perguntar o que é que o movimento – fundado por Baden Powell e que se evoca mundialmente no dia de São Jorge (patrono dos escuteiros e patrono dos soldados e da Inglaterra) – lhes tinha trazido como mulheres.

A resposta, porém, nem sempre se revelou simples. Afinal, como dizem Margarida Pinto Correia, a responsável pela pasta da inovação na fundação EDP, e a cantora Susana Félix, a experiência que tiveram encaminharam-nas, precisamente, no sentido contrário: o de notar que, afinal, as mulheres não eram nem mais, nem menos, nem pior, nem melhor. Uma vez no movimento, o sexo feminino e masculino eram iguais: nas provas, nos desafios, na competição.

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Nunca tinha pensado no Escutismo dessa forma”, começa por explicar Margarida Pinto Correia. “Mas é, de facto, importante quando não precisamos de pensar nos fatores que nos influenciaram a ser como somos, é sinal que estavam e sempre estiveram lá de forma natural”, sublinha a antiga jornalista, que ingressou no Agrupamento 230 Olivais Sul aos 15 anos “por vontade própria” e onde permaneceu por cerca de três anos.

Em Torres Vedras, no 122, Susana Félix teve experiência semelhante. “O Escutismo ensinou-me que podia fazer tudo como os outros. Aprendi a fazer nós e tendas em cima das árvores como qualquer outro rapaz, as provas tinham sempre o mesmo grau de dificuldade para todos. Talvez por ter vivido e crescido nessa realidade é que, hoje em dia, as diferenças entre géneros me choquem tanto”, atira a cantora, que frequentou o movimento entre os dez e os 18 anos. E pergunta-se: “Se calhar, por isso é que me indigna que uma mulher ganhe menos que um homem em igualdade de funções.”

“Éramos todos tratados por igual. Deu-me um enorme à-vontade na minha feminilidade”

E lembra: “Mesmo quando existia espírito de competição, as raparigas batiam-se de igual para igual com os rapazes. Agora, olhando o contexto histórico, talvez fosse uma coisa muito à frente. Afinal, fui criada naturalmente num espírito de igualdade, sem me aperceber…”, suspira.

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Sim, “nos anos 80 do século passado”, contextualiza, corrobora e sorri Margarida Pinto Correia. “Tive a capacidade de me desenvolver como pessoa sem nunca sentir que tivesse, à partida uma incapacidade, handicap ou um qualquer prurido. Tinha, como todos os outros – rapazes e raparigas – cuidado com a segurança, com a descoberta, mas éramos todos tratados por igual. Deu-me um enorme à-vontade na minha feminilidade”, recorda, entre risos, lembrando que foi durante uma atividade escutista – um raide na Serra da Arrábida -, que recebeu o “primeiro beijo”, de um primeiro amor.

Liderança, coordenação e vencer a timidez

Atualmente, Sara Pinto é um dos principais rostos das notícias da noite dos canais do Cabo. Ao lado de Pedro Mourinho, ninguém diria que a jornalista tinha sentido na pele a timidez. Porém, crê que foi através da sua experiência nos escuteiros, no 1173 Fornos, de Marco de Canaveses, que, a par do acanhamento, venceu outros desafios.

“Mesmo quando existia espírito de competição, as raparigas batiam-se de igual para igual com os rapazes”

Um caminho que foi conquistando entre e os dez e os 20 e poucos anos. “Como mulher, o escutismo ajudou-me, por exemplo, a lidar e a ter uma posição de liderança, creio”, diz ao Delas.pt. “Havia os guias das equipas, e eu fui uma delas durante muito tempo, o que me ajudou no sentido de conseguir ter experiência a liderar equipas. Também me ajudou a perder um pouco a timidez”, refere, entre risos.

Mas, para Sara Pinto, o movimento trouxe-lhe mais: “Ganhei à vontade num grupo, sobretudo numa fase – a partir dos dez anos e já na pré-adolescência – em que se entra na pré-adolescência e há a tendência de ficar mais refugiada num mundo próprio. Os escuteiros ajudaram-me a ter uma fase bastante agradável de convivência com os miúdos da minha idade”, recorda a jornalista e pivô da SIC Notícias.

“Não consigo”, a frase que Rita Pereira aprendeu a não dizer

A atriz de TVI foi outro dos rostos mediáticos do pequeno ecrã nacional que andou, noutros tempos, de lenço ao peito. Apesar da tentativa, não foi possível chegar à fala com a protagonista da novela da TVI, A Herdeira.

Porém, Rita Pereira já deixou claro o que lhe trouxe, como personalidade, os 12 anos de pertença ao movimento e sua passagem pelo Agrupamento 150, de São Miguel das Encostas, Cascais. “O Escutismo marcou a construção da minha personalidade, a autoconfiança”, afirmou a atriz, numa entrevista concedida em 2013.

E especificou: “Por exemplo, sou incapaz de dizer ‘não consigo’, ‘não faço’ ou ‘não sei para onde vamos’. Talvez por isso goste tanto de viajar sozinha, de partir sem hotel definido. Não tenho medo”.

“O Escutismo marcou a construção da minha personalidade, a autoconfiança”

Num outro momento, a atriz recordou que “todas as atividades, todos os acampamentos, os jogos, o erguer a cabeça depois de fracassar e ter força para seguir em frente, o nunca desistir dos objetivos, o respeito ao próximo, o respeito pela natureza, a vontade de fazer os outros sorrir, as caminhadas imensas, o conseguir sobreviver com pouco, o dar valor ao que se tem” foram princípios que lhe foram decalcados durante o tempo em que andou “sempre alerta”.

Imagem de destaque: Shuttetstock

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