Espetáculo inclusivo de dança dá origem a documentário

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A Sublime Dance Company e o realizador alemão Alex Wiczor estreiam domingo em Lisboa o documentário “Parte de Coisa Nenhuma”, sobre a produção do espetáculo homónimo que em 2017 juntou em palco bailarinos profissionais e adultos com deficiência.

O filme reúne em 70 minutos uma série de testemunhos e momentos marcantes da produção desse espetáculo, que foi concebido pela coreógrafa Diana Seabra especificamente para explorar em palco a experiência de seis bailarinos profissionais da Sublime e a sensibilidade de movimento de sete utentes da Cercioeiras com idades entre os 25 e os 40 anos.

Foi dessa instituição de apoio a portadores de deficiência que surgiu, aliás, o desafio lançado à companhia luso-americana, que já antes desenvolvera projetos de dança inclusiva com utentes de paralisia cerebral do Centro Nuno Belmar da Costa.

“Desta vez tive que procurar bailarinos que, além de se identificarem com o meu repertório de movimento, tivessem disponibilidade emocional para lidar com os colegas especiais que iam ter em palco e capacidade de improviso suficiente para se adaptarem a imprevistos – já que a capacidade de memorização das pessoas com deficiência é muito diferente da de um dançarino profissional”, afirma Diana Seabra.

O trabalho testou os limites de uns e outros, mas “foi bem-sucedido e muito gratificante, não só pelo resultado final obtido, mas também porque os portadores de deficiência não têm filtro nenhum e obrigam os outros a lidar com uma perspetiva diferente das coisas”.

Para Diana Seabra, isso enriqueceu-a pessoal e profissionalmente: “Obrigou-me a adaptar a minha linguagem a um registo mais claro, fez-me valorizar a capacidade de viver ‘no momento’, libertou-me de certos estereótipos relativos a esta faixa da população – como aquele de que eles não conseguem perceber certas coisas ou sentir certas emoções – e mostrou-me como é importante estar atento a novas possibilidades”.

Alex Wiczor também se terá apercebido desse potencial quando decidiu substituir o estilo do trabalho videográfico que vem desenvolvendo para a Sublime por um registo mais documental, que se revelou particularmente exigente a nível técnico.

“Gravar um documentário – especialmente quando se é uma ‘one-man-band’ [banda de um homem só] – é sempre desafiante”, declarou à Lusa. “É tomar decisões a toda a hora e por isso é que ‘Parte de Coisa Nenhuma’ envolveu filmagens muito intensas, com horários apertados, locais difíceis, às vezes protagonistas improváveis”, explica.

Feito o balanço, contudo, o realizador alemão radicado em Portugal garante que o esforço compensou: “Acabou por ser um projeto muito emotivo, em que me tornei parte desta ‘família’ durante dois meses, e a história merecia definitivamente ser contada”.

Sara Espírito Santo, coordenadora do projeto na Cercioeiras, reconhece-lhe “um impacto significativo” na vida dos utentes da instituição, na medida em que lhes deu oportunidade de “experimentar diferentes estilos de dança, aumentar o seu repertório motor e expressivo, conhecer o seu corpo, vivenciar o sentimento de pertença a um grupo e melhorar as suas competências sociais”.

Recordando que a dança já vem sendo explorada na Cercioeiras desde que em 2004 aí foi criado o grupo Korpus, entretanto envolvido em diferentes projetos de desenvolvimento pessoal e cultural através das artes performativas, a mesma responsável acrescenta que iniciativas como o espetáculo da Sublime e o documento de Alex Wiczor têm ainda duas outras vantagens: “sensibilizar a sociedade em geral para a inclusão através da Arte e reconhecer o valor artístico e expressivo das pessoas com deficiência”.

“Parte de Coisa Nenhuma” tem estreia marcada para as 17:00 de domingo no Espaço Nimas, em Lisboa, após o que a sala irá acolher uma conversa com a crítica de dança Luísa Roubaud e a coreógrafa Ana Rita Barata, e ainda uma atuação com o pianista Giovanni Barbieri e os bailarinos Nuno Cabral (utente da Cercioeiras) e Olsi Gjeçi (fundador da Sublime Dance Company e da plataforma mundial de dança UMUV).

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