Eutanásia aprovada na especialidade. E agora, o que vai acontecer?

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[Fotografia: Cottonbro/Pexels]

O texto final sobre a despenalização da morte medicamente assistida foi aprovado na especialidade, na quarta-feira, 7 de dezembro, com votos contra de Chega e PCP, e abstenção do PSD, depois de os sociais-democratas terem tentado um novo adiamento.

A votação do texto na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, contou com os votos a favor de PS, IL e BE. O texto final, que tem por base os projetos de lei apresentados por PS, IL, BE e PAN, segue agora para a votação final global, que deverá ocorrer na sexta-feira, 9 de dezembro, em plenário.

O diploma seguirá depois para Belém. Se o presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa voltar a vetar o diploma, o clausulado volta ao hemiciclo, mas estima-se que a questão seja facilmente ultrapassável uma vez que a atual maioria deverá votar novamente o diploma, não tendo o Chefe de Estado, neste caso, qualquer poder de intervenção.

Só um reencaminhamento do diploma para o Tribunal Constitucional poderá travar o clausulado sobre a morte medicamente assistida, criando um compasso e abrindo a nova discussão.

Texto final vai além do que Marcelo já tinha posto em causa

O novo clausulado estabelece que a “morte medicamente assistida não punível” ocorre “por decisão da própria pessoa, maior, cuja vontade seja atual e reiterada, séria, livre e esclarecida, em situação de sofrimento de grande intensidade, com lesão definitiva de gravidade extrema ou doença grave e incurável, quando praticada ou ajudada por profissionais de saúde”.

Desta vez, em comparação ao último decreto, o texto de substituição deixa cair a exigência de “doença fatal”.

Fica agora também estabelecido um prazo mínimo de dois meses desde o início do procedimento para a sua concretização, sendo também obrigatória a disponibilização de acompanhamento psicológico.

Pelo PS, a deputada Isabel Moreira agradeceu à coordenadora do grupo de trabalho sobre a morte medicamente assistida, a socialista Maria Antónia de Almeida Santos, e aos serviços do parlamento, bem como a todos os deputados representantes dos vários grupos parlamentares, nomeadamente aos do PSD pelo seu “trabalho imaculado”.

A deputada Patrícia Gilvaz, da Iniciativa Liberal, enalteceu o facto de o processo ter decorrido de “uma forma ponderada, participada“, no qual foram ouvidas várias entidades. “No nosso entender este texto final responde às dúvidas que o senhor Presidente da República tinha manifestado no anterior processo e também acolhe as recomendações feitas pelo Tribunal Constitucional”, defendeu.

Os agradecimentos aos serviços e aos elementos do grupo de trabalho foram partilhados pelo líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, que defendeu que “o debate foi elevado” e que “o grupo de trabalho esteve à altura do momento histórico que lhe era exigido”.

Considerando que o novo texto responde ao TC e às dúvidas apontadas por Marcelo Rebelo de Sousa, o bloquista mostrou-se satisfeito com o processo e o seu resultado: “Estamos satisfeitos com o processo, com o texto e conscientes que ele fará uma boa lei, uma lei humana, uma lei constitucional e engrossará os direitos que os nossos cidadãos têm aos seu dispor e fá-lo de uma forma sensata e ponderada”, disse.

Pelo Chega, o líder parlamentar Pedro Pinto manifestou-se contra a aprovação do texto e disse esperar para ver o que fará o Presidente da República ou o TC.

Alma Rivera, do PCP, também reiterou a posição contra do PCP na matéria, sustentando que esta não é uma “posição maniqueísta” e “prende-se essencialmente com as consequências sociais da aprovação deste texto, sobretudo para aquelas que são as camadas mais fragilizadas, mais excluídas e que têm mais dificuldades, nomeadamente, no acesso à saúde e apoios sociais”.

Presidente da AR manda referendo à eutanásia para trás

Na comissão parlamentar, a deputada social-democrata Paula Cardoso ainda apelou aos deputados presentes para que a votação fosse adiada por uma semana devido ao facto de estar agendada para a tarde desta quarta-feira, 7, uma conferência de líderes extraordinária para discutir o projeto de resolução do PSD que propunha um referendo sobre a despenalização da eutanásia, mas este apelo mereceu a oposição do PS, BE e Iniciativa Liberal.

Horas depois, o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, decidiu não admitir a iniciativa do PSD de um referendo sobre a despenalização da eutanásia por “não existirem alterações de circunstâncias” em relação a uma iniciativa anterior já apresentada sobre a mesma matéria, pelo Chega, em junho e que foi rejeitada.

Após a conferência de líderes, BE e PAN defenderam que a iniciativa do PSD que pretendia um referendo sobre a despenalização da eutanásia deveria ter sido admitida, mesmo sendo contra o seu conteúdo, mas PS, Chega, IL e Livre concordaram com a rejeição.

Os vetos do Presidente da República

Na anterior legislatura, a despenalização, em certas condições, da morte medicamente assistida, alterando o Código Penal, reuniu maioria alargada no parlamento, mas foi alvo de dois vetos do Presidente da República: uma primeira vez após o chumbo do Tribunal Constitucional, na sequência de um pedido de fiscalização de Marcelo Rebelo de Sousa.

Numa segunda vez, em 26 de novembro, o Presidente rejeitou o diploma através de um veto político realçando que ao longo do novo texto eram utilizadas expressões diferentes na definição do tipo de doenças exigidas e defendendo que o legislador tinha de optar entre a “doença só grave”, a “doença grave e incurável” e a “doença incurável e fatal”.

com Lusa