Afinal, a operação biquini já não parece apresentar-se como o fator que mais parece empurrar as mulheres, a contrarrelógio, para o exercício. É, cada vez mais, a saúde que tem levado as portuguesas de vidas profissionais intensas ou com familiares a cargo a procurarem soluções que as coloquem na rota da atividade física. E se a ideia pré-concebida pode estar a mudar, as razões para um eventual abandono da prática desportiva por parte das mulheres ao fim de algumas tentativas não estão a fazer semelhante percurso. Aliás, o fator tempo – a falta dele – e o fator motivação estão entre os principais responsáveis por levar as praticantes a pendurarem, de novo, os ténis, os calções e as T-shirts.
Sofia Veiga, criadora do serviço desportivo ao domicílio Chama a Sofia, faz as viagens pelas suas clientes, mas não a aula e o esforço, e revela que os seus horários mais requisitados são “das sete às nove da manhã, depois desacelera e volta a subir ao fim da tarde”.
A especialista – que em breve irá lançar uma app de treino desportivo e nutrição – revelou mesmo que tem uma “cliente que treina às cinco da manhã”. “Regressa a casa, acorda a bebé, prepara-a, leva-a à escola e às oito da manhã já está a trabalhar”, referiu no debate em torno da conciliação e exercício físico promovido pelo Delas.pt, no sábado, 4 de maio, e no âmbito da Health Fest da Men’s Health.
Jaqueline Silva conhece de perto realidades com aquelas características. Tendo em conta as investigações académicas que tem feito entre Portugal e Estados Unidos da América, “os gestores e gestoras de sucesso dizem, frequentemente, acordar às cinco da manhã e que isso tem impacto positivo na sua carreira”. “E falamos de pessoas com e sem filhos, agendas de viagens apertadas”, refere a professora universitária.
Mas se as mulheres já estão cansadas e têm tanta falta de tempo, como resolver juntando-lhe mais uma “nota na agenda do dia das coisas para fazer”? ”A conciliação é um desafio tremendo”, atesta Sofia Almeida.
Mãe de três filhos, praticante de desporto desde sempre e responsável pela rede de ginásios para mulheres BeeWoman, na área metropolitana de Lisboa, Almeida fala de aulas mais curtas. “Já temos uma maioria de aulas de 30 minutos por causa da questão da falta de tempo, é a solução que mais funciona com mulheres que trabalham e têm filhos e que acabam por ter a hora de almoço disponível para o exercício”.
Há, contudo, um detalhe digno de nota para a responsável: “É preciso combater a ideia de que ir ao ginásio possa ser também, pela falta de tempo, um motivo de stresse”, vinca. Ideia corroborada por Jaqueline.
Onde mexer para ganhar tempo?
Quando 1/3 das portuguesas de 18 a 64 anos que trabalham, têm filhos e, eventualmente, uma relação, diz ter apenas nove horas para si próprias, sete das quais a dormir – dados revelados em março, no estudo As Mulheres em Portugal, Hoje, da Fundação Francisco Manuel dos Santos – onde ir buscar mais tempo? Até agora, e como indicam as três especialistas ouvidas no debate, ao sono e às horas de almoço. Mas há mais…
Mudar as mentalidades. “Em Portugal, trabalha-se muitas horas, temos o culto de ir ficando, quem sai à hora é mal-visto. Por isso há cafés, há conversas durante o dia de trabalho. Se formos mais organizadas e eficazes, nós conseguimos. Efetivamente, depois, teremos mais vida pessoal”, refere Sofia Almeida.
Sofia Veiga concorda e vai mais longe: “Se as empresas transformassem uma das horas de trabalho em exercício, isso traria muitos benefícios e poupanças para o Serviço Nacional de Saúde (SNS). Porque é que as empresas não transformam aquela primeira hora entre as nove e as dez, em que as pessoas chegam, ligam o computador, vão buscar um café e conversa”, indaga.
Porém, enquanto a forma de olhar a realidade não mudar por parte de todos e a igualdade de género não promover definitivamente o equilíbrio do trabalho não pago, as pistas afastam medidas como, por exemplo, a do diploma que, chumbado no Parlamento no final da semana passada, propunha alargamento de horário das creches como medida de conciliação. “Não acredito que seja a solução. Isso não é conciliação, é manter a mulher ainda mais escrava do trabalho”, antecipa Sofia Almeida.
Já sobre a flexibilização e o teletrabalho, o caminho é outro, já que, dificilmente, medidas desta natureza se poderão aplicar a todas por igual.
Jaqueline Silva reclama ter “a solução”. “Tirem os homens e ponham as mulheres no topo das empresas, porque o que vivemos é fruto de uma cultura masculina”, refere. E justifica: “As mulheres são mulheres, esposas, mães, têm de ser umas leoas na cama e os homens são homens. Se elas chegarem ao topo, sem terem de se tornar homens durante o percurso, a mudança cultural pode ter lugar”. Com ela, crê a professora universitária, chegará o tempo para a conciliação familiar, profissional e da vida pessoal, com tempo para fazer o que as mulheres mais gostam.
Imagem de destaque: António Medeiros/Health Fest