“F*ck it”: A arte da despreocupação

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Fotografia: Shutterstock

Mark Manson, um blogger nova iorquino com mais de dois milhões de seguidores, lançou em 2016 um livro onde afirma que a melhor forma de viver a vida é despreocupadamente e sem dramas. Em pouco mais de um ano,“The Subtle Art of Not Giving a F*ck”, da HarperOne, já vendeu mais de um milhão de cópias, e a cada dia mais seguidores se rendem a este mantra. Vale a pena investir tempo e neurónios na resolução de problemas? As insónias e dores de cabeça compensam? Mark Manson jura que não. O Delas.pt inspirou-se na obra e deixa-lhe algumas dicas que deve adotar já hoje como lema de vida. Converta-se e entre em 2018 livre de preocupações. F*ck it.

O engano: querer sempre mais e melhor

Das redes sociais à publicidade, todos os estímulos parecem ter um único propósito: criar na sua mente necessidades que na realidade não existem. Todos aparentam ter melhores carros, casas mais luxuosas, férias mais exóticas, carreiras mais interessantes e promissoras. Fazem-no pensar que a TV da sala não é suficientemente grande, nem o jardim da varanda suficientemente florido. Porquê? Porque querer mais incentiva o consumismo e é bom para o negócio, certo? É por isso que deve filtrar toda a informação desta natureza – sobretudo nesta época natalícia. Sentir-se frustrada por não ter uma vida tão glamorosa como as que enchem o seu feed no Facebook acaba por se transformar numa bola de neve – sente-se frustrada por se sentir frustrada, culpada por se sentir culpada, zangada por se sentir zangada. Há por aí uma pontinha de inveja branca? Ok. Não há nada de mal nisso. Aceite os sentimentos negativos sem os exacerbar e verá que, imediatamente, se sentirá muito melhor consigo própria. Irónico, não é?

Menos é mais

Já reparou que quanto menos se importa com um assunto, melhor é o resultado? Que quando se está “borrifando” para algo, tudo parece mais simples? Não é coincidência. “Borrifar-se” para qualquer coisa funciona porque os opostos se atraem. Espere menos, receba mais. Se mantiver as suas expetativas num nível mediano e atingir um resultado melhor que o que esperava, vai sentir-se muito mais feliz. Aceitar as suas inseguranças torna-a imediatamente mais confiante e carismática aos olhos dos outros, e ao enfrentar medos e ansiedades irá aumentar o seu nível de coragem e perseverança.

Desvalorize

Fica piursa quando recebe um tratamento menos simpático (usando um eufemismo) do seu chefe? Ou quando chega a casa e percebe que a funcionária da sapataria onde acabou de comprar aquelas maravilhosas botas colocou duas para o mesmo pé dentro da caixa? Ou quando no trânsito “só lhe saem duques”? Acorda de noite a pensar na resposta que devia ter dado à colega que, indiretamente, lhe disse que ultimamente parecia mais gordinha? Pense bem: que real importância têm estes episódios na sua vida? Vai mesmo deixar que uma insignificância ou alguém que não lhe é absolutamente nada estrague o seu dia? Não. Permita-se influenciar apenas pelo que é realmente importante. O resto? Aceite e deite fora. Esqueça. Não perca nem um segundo a remoer o “nada”. Assim vai poder investir livremente as suas forças, livre de empecilhos, no que de facto importa, ou seja, as suas reais prioridades!

A felicidade está nos problemas

Acha que ser feliz está em não ter qualquer espécie de problemas? Engana-se. A felicidade está meramente em tê-los e resolvê-los, um a um. Sem stress e com naturalidade. E a cada um que resolve, outro surge. É mais ou menos como quando trata de despachar os itens da sua interminável lista de afazeres. Por ordem (ou não), vai colocando “vistos” naquelas que já efetuou. A sensação fantástica de riscar mais uma tarefa da lista é tão satisfatória como a de resolver um problema – quer seja algo simples, como decidir inscrever-se no ginásio para resolver aquele problema de peso (e assim criar um novo problema: arranjar tempo disponível para o frequentar), ou instituir uma noite por semana dedicada ao casal para melhorar a sua relação (e assim queimar constantemente os neurónios para descobrir algo que ambos gostem de fazer, ou um filme que encha as medidas de ambos). Os problemas nunca se acabam, apenas são substituídos – ou sofrem upgrade. Aprenda a lidar com isso com naturalidade e vai ver que o seu dia a dia será mais descomplicado.

Falsos valores que criam problemas (irresolúveis!)

E quais são eles? Aquelas tentações de que, por mais que evitemos, não conseguimos abdicar? A eterna busca pelo prazer, por exemplo. O prazer é o verdadeiro açúcar da vida, uma substância abstrata viciante que nos aprisiona. A busca pelo prazer cria problemas impossíveis de resolver – como, por exemplo, trair o marido em nome de uma paixão passageira e, em consequência disso, destruir o casamento. O prazer é sobrevalorizado e não é a causa da felicidade, mas sim a sua consequência. Deve, portanto, ser tomado em pequenas doses e bem gerido, tudo a bem da sua saúde.

E se é daquelas pessoas que quer ter sempre razão, saiba que essa presunção lhe pode custar a evolução cognitiva e emocional enquanto ser humano. Porquê? Porque ao acreditar piamente que tem de ter a última palavra, vivendo na ilusão de que sabe mais do que os outros, irá perder a oportunidade de aprender com os que a rodeiam. É muito mais útil acreditar que não sabe nada do achar que já sabe tudo – é a única forma de se libertar de preconceitos e abrir a sua mente.

Copo meio cheio? Not.

Perdeu o emprego? Boa, agora está livre para investir na sua ideia de negócio. O seu marido traiu-a com a sua irmã? Não tem mal, ao menos fica a saber com quem pode contar. Partiu o dedo mindinho do pé contra a esquina do móvel da sala? Ótimo, fica com mais tempo livre para pôr a sua série favorita em dia. Há sempre um lado positivo para uma desgraça, certo? Errado. Às vezes a vida é mesmo uma treta, e há que ser frontal e admiti-lo. Fechar a porta às emoções negativas leva na maioria das vezes a um prolongamento, um “arrastar” desses mesmos sentimentos, e por vezes torna-os ainda mais profundos do que eram inicialmente – tudo o que não queremos. Ser constantemente positiva é uma forma de evitar os problemas – e as soluções, as tais que nos trazem a felicidade! Tudo o que tem de fazer é expressar a sua negatividade de forma saudável e de acordo com os seus valores. Por exemplo: zangue-se com quem merece, mas esqueça a ideia do estalo na cara ou do pontapé na canela – bons velhos apaziguadores, nós sabemos. Não há nada de errado em sentir raiva, ela faz parte do dia a dia e deve ser vivida com naturalidade – desde que dentro das leis em vigor, claro.

A parte positiva do insucesso

Quando Pablo Picasso era já um homem de avançada idade e passava os seus dias entre as telas e os cafés de Espanha, foi abordado por uma senhora que o observou durante alguns minutos, em absoluto fascínio, a rabiscar despreocupadamente algo numa folha de um guardanapo, num desses mesmos cafés. Quando Picasso terminou e, ao mesmo tempo que se levantava se preparava para o deitar fora, a senhora impediu-o, pedindo-lhe que lho desse, e que até lhe pagaria o trabalho. “Muito bem, são 20 mil dólares”, respondeu. A senhora, incrédula, respondeu que tendo ele demorado uns meros dois minutos a completar o desenho, não seria justo. “Não, minha senhora. Eu demorei 60 anos a completar este desenho”, disse Picasso, enquanto enfiava no bolso a sua obra de arte em versão take away e abandonava o café.

Percebeu? O sucesso é um fruto direto dos nossos falhanços e insucessos ao longo da vida – e quantos mais, melhor. Não vale a pena “matar a cabeça” a pensar que, quando comete erros, o melhor é mesmo desistir porque “não nasceu para aquilo” –não nasceu para ser mãe, não nasceu para correr a maratona, não nasceu para escrever um livro, seja lá o que for. Quando alguém é melhor do que nós numa determinada função significa que, antes de atingir esse nível de competência, já falhou milhares de vezes. Na mesma proporção, quando somos melhores do que os outros, o mais provável é que já tenhamos ultrapassado uma série de desventuras e desilusões que nos permitiram avançar e melhorar nas tentativas seguintes. Em 2018 (e daí em diante!), não tenha medo de falhar e encare o insucesso como parte da caminhada para atingir os seus objetivos, saia da sua zona de conforto e arrisque! Menospreze os insucessos momentâneos, valorizando o que lhe trazem de bom, e confie nas suas capacidades. O verdadeiro know-how virá ao seu encontro. Sem stress.

 

Carmen Saraiva