Governo estuda efeitos da pandemia na violência doméstica e desigualdades de género

violência dom
[Fotografia: Istock]

Os efeitos da pandemia sobre as desigualdades de género, nomeadamente na violência doméstica, vão ser estudados numa investigação académica com um apoio de meio milhão de euros a ser lançado na quinta-feira, 14 de maio. O estudo será um projeto conjunto da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG).

“Para melhor atuarmos e tomarmos as medidas que minimizem os impactos da crise precisamos de conhecer a sua natureza e as suas implicações, neste caso, sobre as desigualdades de género, e por isso será amanhã [quinta-feira] lançado pela FCT e pela CIG um apoio de 500 mil euros dirigidos a projetos de investigação que analisem as consequências da pandemia nas desigualdades de género e na violência contra as mulheres“, disse a ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva.

A ministra e a sua equipa governativa estiveram esta quarta-feira, 13 de maio, a ser ouvidas pela comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, tendo Mariana Vieira da Silva sublinhado que “as mulheres são dos grupos mais vulneráveis em face da atual crise”, mais afetadas por baixos salários e vínculos precários e, “por isso, mais vulneráveis à crise que vivemos e que vamos viver”.

Mónica Quintela, do PSD, manifestou a sua “perplexidade” pela exceção portuguesa face a países como a França ou Espanha, os números de violência doméstica subiram no período de confinamento, ao contrário de Portugal, tendo a ministra confirmado que as polícias receberam cerca de 30% de queixas a menos no primeiro trimestre face ao período homólogo de 2019.

“O que é lá fora está a ter eficácia e aqui falha?”, questionou Mónica Quintela, tendo Mariana Vieira da Silva respondido que o Governo também se questiona sobre os números e que essa é uma das matérias que pretende ver respondida pelo estudo.

“Não lhe consigo dar as respostas, o que lhe consigo dizer é que estamos preparados para se a violência e se as queixas aumentarem poder responder e que estamos preocupados com esse não aumento e lançámos este financiamento para que se possa estudar esse processo”, respondeu Vieira da Silva, que mais uma vez voltou a dizer que a expetativa é de que os números subam à medida que avance o desconfinamento.

Pediu também cautela na análise dos números trimestrais, uma vez que o período homólogo de 2019 registou um pico que não foi acompanhado ao longo do ano e que desequilibra a comparação.

Os dados apresentados pela ministra aos deputados indicam que desde 27 de março chegaram 166 pedidos de apoio através do novo número de SMS criado especificamente no âmbito da pandemia, mas que Mariana Vieira da Silva, em resposta à deputada do PCP Alma Rivera, disse ser uma solução “para ficar”, estando o Governo a trabalhar para “institucionalizar essa resposta”, que para as gerações mais novas pode representar “um passo menos difícil de dar do que pegar no telefone e fazer uma chamada”.

No total das linhas de apoio para a violência doméstica foram recebidos desde 27 de março 417 pedidos de apoio e entre 30 de março e 26 de abril as estruturas de apoio às vítimas de violência doméstica receberam 4.869 pedidos de ajuda, 162 dos quais presenciais. As novas estruturas criadas no decurso da pandemia para acolhimento de emergência já receberam 52 vítimas.

Mariana Vieira da Silva disse ainda que as forças policiais têm procurado insistir em contactos nos casos já conhecidos de violência, para procurar controlar eventuais reincidências.

A ministra, que por várias vezes afirmou que qualquer plano de recuperação económica terá sempre que ser acompanhado de um programa de combate às desigualdades, nomeadamente as de género, referiu também que a pandemia comprometeu a capacidade de sucesso dos programas de autonomização das vítimas de violência doméstica, dos quais o trabalho e os rendimentos são parte importante, sendo expectável um aumento do desemprego nos próximos meses.

“Sabemos que precisaremos de respostas adicionais para a autonomização”, tendo depois a secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade adiantado que entre 30 de março e 26 de abril se registaram 95 mulheres autonomizadas.

Os deputados questionaram ainda sobre a proteção das crianças em contexto de violência doméstica, tendo a ministra admitido que o encerramento das escolas trouxe “dificuldades acrescidas” no controlo e reporte das situações que por elas eram identificadas e adiantou que estão a ser trabalhadas orientações específicas para as escolas neste novo contexto, para além de um aviso de apoio psicológico para crianças vítimas de violência doméstica.

Referiu ainda que o decreto do Governo para o retomar das atividades letivas presenciais nos 11.º e 12.º anos prevê o “acompanhamento específico a crianças e jovens em situações de risco”, estabelecendo que devem ser garantidos meios e condições de segurança para a frequência das aulas.

Sobre os programas para agressores, que conta atualmente com 1.386 participantes, está a ser acompanhado e avaliado, esperando-se que o estudo a ser desenvolvido pela Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais esteja concluído no final do próximo ano.

Mariana Vieira da Silva concordou com Mónica Quintela sobre o caráter temporário que as casas abrigo devem ter, e que as mulheres devem poder regressar às suas casas, mas rejeitou que possa haver soluções de acolhimento para agressores. “A ideia de criar agora alojamentos para agressores, tenho mais dúvidas”, disse.

A ministra adiantou que deve ser conhecido na próxima semana o manual de atuação nas primeiras 72 horas após a denúncia e que o guia para profissionais que intervêm junto de crianças e jovens “está concluído e em fase de edição”.

LUSA