
Para a Lei, deixa-se de ser criança ou jovem e dependente dos pais aos 18 anos, data em que se atinge a maioridade. Contudo, para as finanças pessoais, a educação e formação dos filhos e o Fisco, as contas crescem mais sete anos, e o ciclo pode dar-se por encerrado aos 25 anos, quando o filho passa a ser visto desejavelmente como formado profissionalmente e independente.
Está-se, então, diante de uma realidade que coloca poucas dúvidas quando as famílias se mantém juntas, mas que pode mudar de figura quando os pais estão separados e há ou não residência alternada ou há ou não lugar ao pagamento de pensões de alimentos, tudo isto a acontecer numa cada vez mais comum circunstância em que os filhos saem cada vez mais tarde de casa dos pais.
A propósito do Dia Mundial da Criança, que se assinala este sábado, 1 de junho, a Delas.pt foi ouvir dois advogados especialistas em Direito da Família para tentar perceber que regras e que contas podem vir a mudar entre os dois progenitores separados e o que pode mesmo acontecer quando um dos filhos faz 18 anos, mas os restantes são menores. Mas já lá vamos.
Pagamento de pensão de alimentos não acaba aos 18 anos
“A maioridade não faz cessar automaticamente a obrigatoriedade de pagamento de uma pensão de alimentos previamente fixada, mantendo-se, em muitos casos, até que o filho complete 25 anos de idade. É ao progenitor obrigado a prestar alimentos que cabe o ónus de alegar e provar os pressupostos que tornam inexigível a manutenção da obrigação alimentar após a maioridade”, defende o advogado Nuno Cardoso-Ribeiro, especialista em Direito da Família e co-autor do livro Sou Madrasta ou Padrasto… e Agora?.
Segundo Joana Pinto Coelho, responsável na Associação de Mulheres Juristas, mas que neste caso responde em nome próprio, a lei determina que os pais deixam de ficar obrigados a “prover ao sustento dos filhos e de assumir as despesas relativas à sua segurança, saúde e educação na medida em que os filhos estejam em condições de suportar, pelo produto do seu trabalho ou outros rendimentos, aqueles encargos. Este não é, porém, a realidade da esmagadora maioria dos casos quando os jovens completam 18 anos, porque nessa altura estarão ainda a concluir a sua formação profissional (Lei n.º 122/2015, de 1 de setembro) e não estão capazes de se sustentarem sozinhos. Desta forma, o clausulado vem defender que, “na medida em que seja razoável, deve-se exigir aos pais o seu cumprimento [pagamento de pensão de alimentos] e pelo tempo normalmente requerido para que aquela formação se complete’.
Joana Pinto Coelho reitera, desta forma, que “se entende que [a pensão de alimentos] se mantém para depois da maioridade, e até que o filho complete 25 anos de idade, salvo se o respetivo processo de educação ou formação profissional estiver concluído antes daquela data, se tiver sido livremente interrompido ou ainda se, em qualquer caso, o obrigado à prestação de alimentos fizer prova da razoabilidade da sua exigência”.
Contudo, muitas vezes a criança está em residência alternada, pelo que, em muitos casos (não todos), não há lugar ao pagamento da pensão de alimentos”. Nesse caso, “na eventualidade de o maior passar a viver exclusivamente com um dos seus progenitores, e não tiver sido fixada durante a menoridade uma pensão de alimentos, a mesma poderá ser fixada já após a maioridade”, explica Cardoso-Ribeiro. Em casos em que o filho, já após a maioridade, “passar a viver com o progenitor com quem não viveu até aí, poderá haver lugar ao pagamento de uma pensão de alimentos por parte do progenitor que até aí a recebia”, ou seja, quem não pagava até aí pode passar a pagar ao outro progenitor.
E quem pode pedir?
Uma vez sendo filho maior e não havendo, por parte dos pais, responsabilidade parentais de representação e administração, fica a pergunta de quem poderá pedir pensão de alimentos: os filhos ou o progenitor que o recebe?
“Nos casos em que após a maioridade, o jovem escolhe passar a residir com a apenas um dos progenitores valem exatamente as mesmas considerações. Se não existir acordo entre os pais, e as despesas com a formação se mantiverem, pode o progenitor que assume a título principal o encargo de pagar as despesas de sustento e educação de filho maior exigir do outro a comparticipação daquelas despesas”, esclarece Joana Pinto Coelho.
E a advogada acrescenta: “Uma outra importante alteração, com a lei de 2015, é a possibilidade de o progenitor que assume a título principal o encargo de pagar as despesas de sustento e educação de filho maior exigir do outro a comparticipação daquelas despesas. Ou seja, ultrapassou-se igualmente a questão de saber quem tem legitimidade ativa para intentar uma ação de alimentos devidos a filho maior, admitindo o legislador que, além do filho maior, também poderá fazê-lo o progenitor a quem cabe o encargo de pagar as despesas do filho.” Cardoso-Ribeiro considera que “nestes casos, e não existindo acordo, caberá ao progenitor interessado em receber a pensão instaurar a competente ação em tribunal”.
Separação de irmãos quando um deles atinge a maioridade
É comum que os irmãos fixem o esquema de residência juntos. Seja em casas alternadas ou apenas com um dos pais, os irmãs tendencialmente não se separam. Mas o que acontece quando o maior escolhe fixar residência com um dos progenitores, os irmãos mais novos seguem o esquema anteriormente definido ou acompanham o irmão que atingiu a maioridade?
“Ainda que cada caso seja um caso, e que o regime em vigor para cada criança não tenha necessariamente de coincidir, em Portugal vigora o princípio geral de que a separação dos progenitores não deverá, em princípio, determinar a separação dos irmãos, sendo, por via de regra, do superior interesse da criança crescer junto dos seus irmãos e irmãs. Todavia, tal princípio não é nem absoluto nem o único fator determinante para decidir sobre a fixação da residência da criança, sendo necessário ponderar casuisticamente a prossecução do superior interesse do(s)s irmão(s) que ainda não alcançaram a maioridade”, estabelece Nuno Cardoso-Ribeiro.
Joana Pinto Coelho vinca também que “ninguém pode obrigar o filho maior a manter o regime de residência alternada quando decide, após a maioridade, fixar a residência com um dos progenitores”. Pode – como acrescenta a advogada – “existir a necessidade de revisão da regulação relativamente à criança menor de idade que se mantém em residência alternada por se entender que não protege o seu interesse manter tal modalidade de residência. Mas não é obrigatório. Ou seja, podemos ter irmãos separados (e está tudo bem), ou podemos ter de alterar o regime (porque assim os interesses da criança o impõem)”.
Nuno Cardoso-Ribeiro concorda e considera que “alcançando um dos irmãos a maioridade, cessa o exercício das responsabilidades parentais apenas quanto a este, mantendo-se o regime em vigor quanto a todas as demais crianças. Significa isto que o filho adulto poderá decidir passar a residir em termos que não correspondem ao regime em vigor para os seus irmãos sem que tal implique forçosamente uma alteração do regime aplicável a estes últimos”. Mas nada ganha carácter absoluto ou definitivo porque, acrescenta Cardoso-Ribeiro, “a alteração de residência do irmão já adulto poderá ser um dos fatores a tomar em consideração para uma eventual alteração do regime, em especial quando exista uma forte proximidade afetiva entre irmãos, mas a par de muitos outros elementos que deverão também ser considerados.” No entanto, “não existe uma correspondência direta entre o regime de residência praticado por um irmão adulto e o regime de exercício das responsabilidades parentais do seu irmão ainda menor. Esse facto poderá ser tomado em conta pelo tribunal no âmbito de um pedido de alteração de regime, tal como o serão outros porventura até mais relevantes”.
Há alienação parental entre os 18 e 25 anos?
Antes de mais, é importante vincar que a alienação parental não é uma matéria consensual em Portugal. Joana Pinto Coelho diz ter “muitas reservas jurídicas” sobre esta realidade – que passa por tentar afastar a criança de um dos elementos do casal, anulando-o ao olhar dos filhos – e sustenta até não ser “uma figura jurídica”. Nuno Cardoso-Ribeiro defende que “a alienação parental, enquanto conjunto de comportamentos destinados a provocar uma quebra ou dano relevante nos vínculos afetivos próprios da filiação entre o filho e o outro progenitor, poderá ocorrer igualmente após a maioridade”. Contudo, já depois dos 18 anos, “esses comportamentos não poderão já ser passíveis de censura perante o Tribunal de Família”.
Para Joana Pinto Coelho está-se diante de “maus-tratos físicos e psicológicos”, o que configura crime, devendo ser julgado noutro tipo de tribunais, independentemente da idade. “Se estivermos perante um processo de promoção e proteção em que tenha sido determinada a aplicação de medida que tenha subjacente a existência desses maus-tratos, o processo extingue-se com a maioridade. Mas os maus-tratos são crime. E os crimes devem ser julgados independentemente das idades das crianças”, assevera a advogada.