Hipnotizar para curar, parar de fumar, deixar de lado a dor

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Há quem use a hipnoterapia para deixar de fumar, emagrecer ou perder medos… Parece conto do vigário? Se fosse porque é que seria utilizada para controlar a dor em alguns hospitais nacionais? Não acredita? Entre numa viagem ao mundo do subconsciente.

O nosso cérebro pode ser programado? “Pode”, diz Maria João Dias da Hypnobalance, hipnoterapeuta e formadora certificada pela americana International Association of Counselors and Therapists. Que bom e… que susto! Não é fácil pensar que somos “reprogramáveis”, que podemos ser sujeitos a alterações de “código” como se fossemos uma daquelas maquinetas que dominam os nossos dias. Mas se for por uma boa causa…

Aceitemos que as causas são boas. Na verdade, são as que o paciente desejar, todas aquelas em que acredita precisar de fazer um upgrade para ter uma vida melhor. Deixar de fumar, por exemplo, porque o médico diz e a vida vai provando, depois de anos a ignorar as mensagens impressas dos maços de tabaco, que “Fumar mata”.

Um dia a mensagem surte finalmente efeito, acionando uma campainha de alerta e sugerindo que se faça contas (“com o dinheiro dos cigarros já podia ter ido de férias às Caraíbas”), que se olhe para a pele (“estou a ficar velha, será dos cigarros?”) ou que se repare na parede da sala (“foi pintada no verão e já está toda amarela!”). Isto para não falar em ultimatos do pneumologista, fartinho de ouvir aquela conversa fiada de “na próxima consulta já terei deixado de fumar, doutor, vai ver.” Pois, pois…

Com recurso à hipnoterapia, a tarefa pode ser facilitada e o processo é simples: o terapeuta pede ao paciente que relaxe, em três a cinco minutos fica mais sugestionável e, de seguida, é-lhe condicionado o gosto pelos cigarros, passando a rejeitá-los. E quem diz pelos cigarros diz pelos doces, para quem quer emagrecer: “Se sugerirmos que, em vez de guloseimas, o paciente deseja comer vegetais, a probabilidade de os passar a consumir é muito grande”, assegura Maria João Dias. No fundo, cria-se uma “vontade” que parece sempre ter existido – e o corpo, quer num caso quer noutro, agradece.

Este condicionamento ou sugestão, sempre praticado com concordância prévia e efetuado num estado alterado de consciência mas com o paciente desperto, a conversar e a lembrar-se de tudo no final da sessão, pode também ser utilizado para controlar a dor, nomeadamente no parto, ou os efeitos de desconforto da radioterapia e da quimioterapia no corpo.

No último caso, sem dados científicos que o provem mas comprovado pela experiência da interlocutora, garante Maria João Dias, há uma muito melhor recuperação, nomeadamente sem vómitos: “Os efeitos secundários são reduzidos ao mínimo”.

Como técnica de tratamento da dor, a hipnose começou a ser usada no Hospital de Santa Maria em 2008 em pacientes com fibromialgia (uma doença que se caracteriza por dor músculo-esquelética generalizada) e em doentes da unidade de queimados. Usa-se igualmente no parto: o primeiro com recurso à hipnose, sem epidural, foi realizado no Hospital Pero da Covilhã há dois anos.

Ultrapassar traumas
A sugestão é eficaz mas, muitas vezes, é necessário resolver a causa por detrás de um determinado comportamento. Também aqui o processo é simples. Em poucos minutos o terapeuta faz o paciente “visitar” o momento traumático ocorrido na tenra infância ou mesmo durante a gestação, “pois as experiências da mãe são vividas pelas crianças como se fossem suas”, explica Maria João Dias.

No caso do medo das alturas, o paciente recua até à infância e vê-se a cair de um banco alto, por exemplo, sem qualquer auxílio. Com a hipnoterapia é possível eliminar o medo associado a esse acontecimento, sugerindo que o paciente ajude e tranquilize aquela criança, que na verdade é ele próprio, pondo fim ao trauma. O mesmo é válido para a compulsão para a comida: há que identificar o que leva o paciente a compensar-se com alimentos, que poderá ser ansiedade e, nesse caso, trata-se a origem e só depois se procede à “programação”.

Esta abordagem é utilizada para eliminar ataques de pânico, alergias e fobias mas também baixa autoestima, depressão e até problemas como a impotência, “geralmente ligada à ansiedade das primeiras experiências sexuais”, segundo a experiência da hipnoterapeuta.

O número de sessões varia consoante a problemática e o paciente pois “há pessoas que nunca olharam para dentro” e, aí, poderá ser necessária mais uma consulta. Os ataques de pânico resolvem-se geralmente em três ou quatro sessões, a tristeza profunda da depressão também. Cada uma demora entre uma hora e meia e duas horas e custa 80 euros (ou 60 se efetuada por formandos, supervisionados pela hipnoterapeuta).

Contraindicações não existem desde que seja feita por um terapeuta competente, como acontece em qualquer área profissional. A atividade ainda não está regulada em Portugal mas os profissionais – que não têm necessariamente formação em psicologia, por exemplo, embora muitos dos atuais formandos de Maria João Dias sejam psicólogos – estão abrangidos por um código de ética.