Hygge: a receita dinamarquesa para sobreviver feliz ao inverno

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Temos nós, povos do Sul, pensado que no Norte da Europa, com a falta de sol típica dos longos invernos, as pessoas viviam tristes, acabrunhadas e com inveja da nossa vida de cigarras. Nada mais longe da verdade. Estas formigas, como todas as outras, são espertíssimas e contam-nos a história de ser tão feliz com frio, dias curtos e mau tempo lá fora.

Hygge não tem tradução direta. É um estado de espírito, de calmo contentamento e alma aquecida, enquanto lá fora a neve rodopia e as temperaturas caem. Quando comparados os rankings de bem-estar generalizado dos povos nórdicos, os da Dinamarca disparam entre os dos seus pares.

Os invernos dinamarqueses oferecem, em média, apenas 4 horas de luz diurna plena. Por outro lado, lá fora, a temperatura ronda 1 (agradável) grau positivo. O que faz um dinamarquês para melhor atravessar isto que para nós parece ser uma tormenta? Fica em casa, convida outro, ou outros como ele para passar o tempo na cavaqueira, com chá e lareira. Ou pode até ficar sozinho, na companhia de um livro, com manta e perneiras de lã. Hygge, é na melhor tradução possível, gozar ao máximo estar em casa, deixando os problemas lá fora, ao frio e à neve.

Helen Russel, a escritora da obra ‘The Year of Living Danishly: Uncovering the Secrets of the World’s Happiest Country’ (‘O Ano em que Vivemos como Dinamarqueses: À Descoberta do Segredo da Nação Mais Feliz do Mundo’), define o Hygge como o “ser-se bom consigo mesmo, e permitir-se passar um tempo agradável, não se castigar nem se negar nada.”

A autora não tem uma receita definitiva e fechada para o Hygge: “Até agora a minha experiência mais hyggeligt (o adjetivo do conceito) foi provavelmente assistir ao entardecer numa banheira de água quente durante uma tempestade de neve em janeiro, com uma cerveja na mão. Mas nem sempre é necessário acrescentar tanto drama; acender uma vela no escritório enquanto se trabalha já é Hygge.”

A palavra ganhou consistência e peso durante o século XIX, altura em surgiu escrita pela primeira vez. Os dinamarqueses mais velhos acham que o hygge já não é o que era; hoje considera-se que estar em casa sozinho a ver televisão pode ser hygge, mas aos olhos dos tradicionalistas falta o convívio e a presença de outros, e qualquer aparelho eletrónico ou gadget é uma fraca muleta que não substitui a companhia de amigos e respetiva conversa.

Não ter tradução não torna o conceito menos efetivo. Saudade também não tem tradução noutras línguas, mas toda a humanidade a percebe. Alguns dinamarqueses dizem que o mais parecido poderá ser “intimidade da alma”.

Seja como for, Hygge, em última instância, não é para ser traduzido, é para ser sentido. E verdade seja dita, todos nós, numa ou outra ocasião já o sentimos, só não sabíamos que os dinamarqueses já lhe tinham dado um nome específico.