Inês Caldeira: “L’Oréal acredita que na ciência o equilíbrio entre os géneros faz avançar.”

Inês Caldeira, CEO L oreal Portugal
Inês Caldeira, presidente da L'Oréal Portugal, afirma que foi o pai que a tornou uma mulher emancipada: "Eu provavelmente fui educada de uma forma diferente. É uma circunstância que começo a verificar em homens que têm duas filhas: fui educada na crença que era sempre possível. Não fui sujeita a estereotipos. Não foi feita de forma programada e provavelmente aconteceu porque o meu pai não tinha filhos. Lembro-em perfeitamente de ao sábado de manhã, no Inverno, irmos jogar à bola para a praia, o que não é uma coisa muito feminina. Lembro-me de o meu pai dizer 'se tu não és capaz ninguém é capaz'", disse na Conversa Delas. (Orlando Almeida / Global Imagens)

São hoje atribuídos ao final do dia os prémios Medalhas de Honra L’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência. A iniciativa tem 12 anos em Portugal já distinguiu 34 cientistas e enquadra-se numa ideia mais vasta, global, patrocinada pela marca de cosmética e pela UNESCO. Hoje passam a ser 37 as mulheres que conseguiram financiar as suas investigações, com este prémio de 20 mil euros, e a Presidente da L’Oréal Portugal, Inês Caldeira, 37 anos, conta em entrevista ao Delas.pt por que razão continua a fazer sentido reconhecer a ciência e distinguir as mulheres promissoras que se destacam nela.

A Inês estava a trabalhar na L’Oréal Portugal quando o prémio L’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência foi lançado no País. Como vê a evolução deste prémio?

É provavelmente dos programas de que mais me orgulho na L’Oréal. Pela consistência, pelo valor, pela durabilidade e sustentabilidade. De facto, em Portugal tem doze anos. Significa que premeia 3 jovens cientistas, mulheres, ao longo destes anos. E um ano premiámos 4 pelo que com as cientistas deste ano são 37 as premiadas, nas diferentes áreas da ciência. Este ano premiamos Ana Catarina Fonseca, uma investigação na área do AVC, Elisabete Oliveira pela pesquisa na área do cancro e Ana Faria pelo trabalho na contaminação dos mares. A pesquisa contra o cancro é de resto um tema recorrente nas candidaturas. Vemos que as cientistas portuguesas estão a investir muito a investigação desta doença que nos toca a todos. Normalmente, premiamos duas cientistas na área da saúde e uma na área do ambiente.

Não são as áreas mais diretas de ligação à L’Oréal. Porquê apoiar estas investigações?

O tronco comum é a ciência. A ciência está no ADN mais profundo da marca porque o fundador da L’Oréal, em 1909, era um cientista. Tem muito mais a ver com a ciência, somos das marcas de beleza que mais patenteia, temos um corpo de cientistas muito grande, é por isso que faz sentido. Depois tem a ver com uma crença profunda que é nós achamos mesmo que o mundo precisa da ciência e a ciência precisa das mulheres. É um métier muito dedicado e muito masculino e a L’Oréal acredita, como noutras áreas, que na ciência o equilíbrio entre os géneros é salutar e faz avançar.

Mas em Portugal, 45% dos cientistas já são mulheres, segundo os últimos dados da UNESCO. Este prémio continua a fazer sentido?

Faz sempre sentido. Ainda bem que Portugal tem estes números, aliás, à frente da média europeia com apenas 33% de envolvimento das mulheres nas investigações científicas. Nós não podemos ter desigualdade porque o País não sobreviveria se metade da população não trabalhasse, não tivesse oportunidades. Fará sempre sentido reconhecer a ciência, fará sempre sentido continuar a promover a ciência no feminino porque tem também a ver com a L’Oréal. Não é apenas uma questão relacionada com a desigualdade de género, mas muito mais uma questão de promover a qualidade da ciência.

As 34 cientistas que já receberam estes prémios dão-vos feedback do que conseguiram alcançar?

Todos os testemunhos que temos dão-nos conta que foi uma mudança de vida muito grande. 20 mil euros em Portugal, para uma investigação de ciência. O prémio fá-las avançar muito nas investigações, torna possível estudar mais, acaba por ter reconhecimento na comunidade científica internacional e acaba por ser importante. Uma das laureadas deste programa internacional é agora Presidente das Maurícias, outra foi prémio Nobel. Este prémio é uma antecâmara do que poderá vir a ser uma carreira muito importante.


Conheça a cientista Ana Catarina Fonseca, investigadora na área do AVC e galardoada com este prémio


A questão da igualdade de género é importante para a L’Oréal, para lá da ciência. A L’Oréal Portugal é a primeira delegação nacional a ter equilíbrio de género no conselho de administração. Como é que se consegue chegar a este patamar?

O tema da igualdade de género, até pela natureza do nosso negócio, é um tema que centralmente o grupo defende. Há países onde há quotas na empresa. Não é o caso em Portugal e não posso deixar de dizer que a L’Oréal Portugal deu passos de gigante e é entre as filiais europeias a que mais avançada está a esse nível. Fizemos vários programas para promover essa igualdade, temos grandes apoios à maternidade, acabámos de implementar um protocolo em que o quinto mês da licença de maternidade é pago na totalidade. É um avanço em relação à lei. A igualdade não é só nomear as pessoas, é dar as condições para que as pessoas possam desempenhar bem as suas funções e tenham vontade de se candidatar. E damos muito apoio à paternidade. Quando falamos de igualdade não podemos falar apenas para o lado feminino e no que diz respeito à paternidade, creio que temos ainda muito para fazer. Nós promovemos que os pais e as mães tenham condições suficientes para educar os seus filhos. Parece-nos interessante trabalhar num ambiente de igualdade de género, mas também de diversidade de nacionalidade.

Vários estudos indicam que empresas com mulheres nos cargos de direção têm melhor performance. A Inês é CEO da L’Oréal Portugal há 18 meses, entretanto o conselho de administração passou a ter 50% de mulheres. Que balanço faz?

Não há uma causa direta. Os resultados da L’Oréal foram ótimos em 2015. Crescemos acima do mercado, ganhámos quota de mercado em todas as divisões, mantivemos posições de liderança que já eram bastante elevadas… mas não quero estabelecer essa ligação para quem esteve antes e fez um trabalho extraordinário. Nota-se, mas como se notará em tudo, que gestões mais equilibradas, com maior igualdade trazem outra riqueza, mas isso é assim na vida e nos negócios.

Mas porque é que a diversidade faz bem aos negócios?

Porque traz outros pontos de vista para cima da mesa, da mesma maneira que ter portugueses e estrangeiros, ou ter pessoas com 60 anos e ter jovens. Através disso podemos comunicar melhor com o nosso consumidor. Temos uma maior representação da sociedade dentro da empresa. Depois, em querer cair em estereótipo, o ponto de vista feminino é um ponto de vista de conciliação. E claro, nesta indústria que é tão feminina, temos o ponto de vista da experiência para saber, por exemplo, o que é que é preciso desenvolver para que as mulheres se vão a maquilhar nos carros… Um exemplo muito concreto é a água micelar ou é o BB Cream – são exemplos de cosmética que foram criados por mulheres para mulheres porque há um ponto de vista que é muito interessante, que é o da mulher multifacetada. É um processo mais intuitivo para responder às necessidades do mercado.