Intolerâncias e alergias alimentares: temos mesmo de viver com elas?

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São muito comuns e surgem em qualquer idade. Podem ser uma surpresa desagradável e condicionar verdadeiramente a nossa vida, mas também é possível manter a qualidade de vida aprendendo a contorná-las. As intolerâncias e as alergias alimentares são uma realidade cada vez mais frequente nos nossos dias e é importante que esteja bem informada para poder detetar os seus sintomas e prevenir-se desde cedo. Falámos com Jennifer Tretter Ferreira, nutricionista, que nos explica o básico sobre estes fenómenos do corpo

Intolerâncias e alergias alimentares: são a mesma coisa?
Não. Uma alergia alimentar implica uma resposta imunológica do organismo; uma intolerância é muito mais comum, com alguns sintomas semelhantes à alergia, mas consiste apenas numa reação adversa causada por mecanismos não imunológicos. Quando existe intolerância é possível consumir-se uma determinada quantidade do alimento sem que se detetem quaisquer sintomas, enquanto que em caso de alergia, mesmo a mais pequena das doses pode provocar uma reação.

Por que é que surgem?
Basicamente, uma alergia alimentar acontece quando o organismo vê, erradamente, uma determinada substância presente num alimento como uma ameaça, ordenando ao sistema imunitário que produza anticorpos que a combatam. Sempre que essa mesma substância é detetada, os anticorpos libertam histamina como resposta, desencadeando os sintomas típicos de uma alergia. As intolerâncias podem surgir quando o organismo não possui a enzima necessária para digerir o alimento, ou como resposta a determinados componentes que podem ser naturalmente irritantes para o corpo.

Quais as principais intolerâncias e alergias?
As intolerâncias mais comuns são à lactose e ao glúten. Quanto às alergias, em bebés e crianças é frequente a alergia à proteína do leite, à proteína do ovo, peixe, amendoins, nozes e outros frutos secos, marisco, soja, trigo. Nos adultos é muito comum a alergia ao marisco, amendoins, nozes e outros frutos secos, e ao peixe.

Como se deteta uma intolerância alimentar?
Não é fácil, já que os sintomas podem manifestar-se horas ou mesmo dias depois do consumo do alimento, tornando difícil encontrar o “culpado”. Os sintomas podem variar entre cólicas e distensão abdominal, flatulência, prisão de ventre, diarreia, dores de cabeça, asma, rinite, artrite, distúrbios cutâneos e letargia e perda de peso.

E uma alergia?
Uma reação alérgica ocorre geralmente nos minutos seguintes até duas horas depois do consumo do alimento. Os sintomas de uma alergia podem surgir na forma de distúrbios gastrointestinais como cólicas, diarreia, náuseas, vómitos e/ou flatulência. Podem ainda manifestar-se com o aparecimento de urticária, dermatite atópica, eczema, inchaço, asma ou rinite, edema nos lábios, língua ou glote, ou, nos casos mais graves, num choque anafilático que pode implicar risco de morte.

É essencial fazer testes para identificar possíveis intolerâncias ou alergias?
Não. Ambas as técnicas, através de análises ao sangue ou pequenas incisões na pele, podem originar falsos positivos. Para um diagnóstico seguro há que registar eventuais reações aquando o consumo de certos alimentos, e posteriormente confirmar as suspeitas através de testes médicos.

O que posso fazer para as prevenir?
A única coisa a fazer quando são detetadas intolerâncias ou alergias alimentares é evitar a substância ou alimento em questão, lendo atentamente os rótulos dos produtos para identificar potenciais “ameaças”. No caso de grávidas com historial significativo de alergias alimentares na família, é aconselhado que se evite o consumo de leite, ovos e amendoins nos últimos três meses de gestação e durante a amamentação. Está também provado que nestes casos a melhor forma de prevenção de alergias alimentares no bebé é a amamentação exclusiva nos primeiros quatro a seis meses de vida.

Que alimentos podem ajudar?
Os probióticos têm dado provas do seu potencial em melhorar os sintomas de alergias ou intolerâncias. Estes podem ser encontrados em alimentos como o iogurte, o kefir ou a sopa miso.

É aconselhada a toma de suplementos?
Não necessariamente, mas alguns suplementos podem ajudar a reduzir os sintomas, o que em certos casos pode diminuir o desconforto. A vitamina C é um comum suplemento antialérgico que ajuda a estabilizar os mastócitos (células que participam da reação inflamatória), para que tenham menos tendência à libertação de histamina. Na intolerância à lactose, um suplemento de lactase fornece a enzima adequada para a digestão deste açúcar, e consequentemente evita a distensão abdominal e a flatulência.

As intolerâncias ou alergias alimentares podem desaparecer? Porquê?
Uma intolerância à lactose não irá desaparecer com a idade. No entanto, no que diz respeito a esta e outras intolerâncias, a total eliminação do alergénio pode ajudar o organismo a criar resistência. Assim, uma pequena porção do alimento pode ser tolerada, porém a sua reintrodução regular na alimentação pode levar a que os sintomas retornem (isto pode variar de pessoa para pessoa).
Quanto às alergias, as crianças mais pequenas poderão ter a capacidade de as contornar, ou mesmo eliminar. Com o auxílio de um alergologista, a criança pode realizar novos testes a cada um/dois anos para perceber se as alergias à proteína do leite, soja e trigo desapareceram ao longo do crescimento, e a cada dois/três anos para detetar a permanência da alergia à proteína do ovo. Crianças mais velhas e adultos podem perder a sensibilidade ao alimento alergénio caso este seja identificado e completamente eliminado da dieta; contudo, a alergia às nozes, amendoins, peixe ou marisco raramente desaparece. São ainda desconhecidos os motivos que justificam este tipo de alterações: alguns especialistas afirmam que o indivíduo pode muito simplesmente habituar-se ao alimento alergénio, e assim diminuir a sensibilidade e o nível de resposta do sistema imunitário. As reações alérgicas podem ainda assim reaparecer depois de anos sem se manifestarem – as razões para isto são também desconhecidas.